A conversa do jardim e outras Porandubas Políticas – por Gaudêncio Torquato*

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Manuel Ribas, interventor no Paraná (1932/1935), depois governador (1935/1937), despachava no palácio, mas gostava de morar em sua casa. Bem cedinho, chega um rapaz e encontra o jardineiro regando o jardim:

– Seu Ribas está? Sou filho de um grande amigo dele. Meu pai me mandou pedir um emprego a ele. Eu podia falar com ele?

– Poder, pode. Mas, e se ele não lhe arrumar o emprego?

– Bem, meu pai me disse que, se ele não arranjasse o emprego, eu mandasse ele à merda.

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– Olhe, rapaz, passe às 4 da tarde lá no palácio, que é a hora das audiências, e você fala com ele.

Às 4 horas, o rapaz estava lá. Deu o nome, esperou, esperou. No salão comprido, sentado atrás da mesa, o jardineiro. Ou seja, o governador. O rapaz ficou branco de surpresa.

– O que é que você quer mesmo?

Repetiu a história. “Meu pai me mandou pedir um emprego ao senhor”.
– E se eu não arranjar o emprego?
– Então, seu Ribas, fica valendo aquela nossa conversa de hoje de manhã, lá no jardim.

Luz no fim do túnel

Primeiro, notícias auspiciosas. O Brasil começa a testar vacinas contra a Covid-19: uma, produzida pela Universidade de Oxford, em parceria com a Astrazeneca, considerada segura, com poucos efeitos colaterais, e que estimula a produção de anticorpos e células do sistema de defesa; outra, desenvolvida pela CanSino Biologics e pela área militar da China, com resultados animadores. Vamos esperar os testes dessa fase, considerada a de número três. Há, ainda, uma terceira vacina, com bom perfil de resposta imune, fabricada pela alemã BioNTech com a multinacional Pfizer. Os testes com a fórmula chinesa começam a ser aplicados em São Paulo. Um dos cinco Estados, além do DF, a receber as vacinas para testes. Portanto, começa a aparecer uma luz no fim do túnel.

Sem processo

O eleitor de Donald Trump se compromete a não processar o candidato caso pegue a Covid-19. Trump passou a fazer comícios em ambientes fechados. Diz o documento apresentado ao eleitor: “Ao clicar na confirmação abaixo, você reconhece que existe um risco inerente de exposição à Covid-19. Ao participar do comício, você e todos os seus convidados declaram voluntariamente não acionar judicialmente Donald J. Trump pelos riscos relacionados à Covid-19”.

Coisas do Brasil I

A reabertura de atividade no comércio e em áreas de serviços está ocorrendo sem muita preocupação com os picos de mortos e contaminados pela Covid-19. Pressão de setores. Olho nas urnas de novembro. Demagogia e populismo. Muitos setores deveriam continuar fechados. Brasil da improvisação.

Coisas do Brasil II

O surto de contaminados e mortos subiu em Minas Gerais. O poder executivo municipal, comandado pelo prefeito Alexandre Kalil, determinou, nos termos da decisão do STF que autoriza governos e municipalidades a tomar medidas para conter a pandemia, o fechamento de bares e restaurantes. E eis que um juiz, alegando “tirania” de Kalil e “desespero” imposto pela mídia, autoriza a reabertura de bares e restaurantes. Medidas semelhantes estão sendo tomadas Brasil a fora. O nosso Judiciário parece desconhecer a tragédia que contabiliza mais de 80 mil mortos.

Coisas do Brasil III

Um desembargador, Eduardo Siqueira, considerado “um sujeito desprezível” por sua colega de Corte, desembargadora Maria Lúcia Pizotti, flagrado sem máscara na orla da praia de Santos, hostilizou um guarda metropolitano, chamando-o de “analfabeto”, rasgou o papel que lhe foi apresentado, telefonou para o secretário de Segurança da cidade, enfim, desprezando a ação do fiscal. O país clama por uma lei de abuso da autoridade. Onde está este instrumento normativo? Ou vamos continuar cultivando: “você sabe com quem está falando”?

Coisas do Brasil IV

Entidades ligadas à saúde, aqui e alhures, desaconselham o uso da cloroquina pelos graves efeitos colaterais que pode provocar. O nosso presidente Bolsonaro não só defende o remédio publicamente como anda dizendo que está se curando da Covid-9 graças a ele. Entre abril e junho, o governo recebera 2,5 milhões de comprimidos do Exército. E já havia encomendado, segundo o jornalista José Casado, de O Globo, 3 milhões de unidades à Farmanguinhos para combate à malária. E eis que os EUA doam mais 2 milhões de comprimidos. A soma daria para abastecer por 38 anos o mercado nacional. E há mais desatino: como os frascos vem com 100 comprimidos, é necessário o fracionamento em doses individuais. O general Pazuello, da Saúde, quer que Estados e municípios façam e paguem por isso. Esse remédio, leio, precisa ser manipulado de modo especial. Quem vai fazer isso? Coisas do velho Brasil.

Coisas do Brasil V

Em São Paulo, a pessoa que circula em áreas públicas sem máscara recebe uma multa de R$ 500,00. Basta uma ligeira olhada nos transeuntes em parques e nas ruas para ver o descumprimento das normas. E não se veem fiscais multando. Eita, Brasil velho.

A quarta sociedade

Esse velho Brasil nos coloca na moldura da quarta sociedade mundial. Quem acompanha esta coluna deve lembrar desse retrato do nosso país. Há quatro tipos de sociedade no mundo: o primeiro é a sociedade inglesa, onde tudo é permitido, salvo o que for proibido; o segundo é a sociedade alemã, onde tudo é proibido, salvo o que for permitido; o terceiro é a totalitária, ditatorial, onde tudo é proibido, mesmo o que for permitido; e o quarto tipo é a brasileira, onde tudo é permitido, mesmo o que for proibido.

Mais ou menos

Por nossas plagas grassa a desconfiança, estiola-se a crença nas autoridades, quebram-se a todo o momento os elos da cadeia normativa. “É para fazer isso conforme prescreve a lei?”. Mesmo tendo um olho no malfeito, o transgressor não quer saber. Pratica o que acha mais conveniente. E o bom senso não é respeitado? Apenas quando não fere o que a pessoa acha seu direito. Por isso mesmo, o advérbio talvez seja mais apreciado do que a certeza impressa na cultura anglo saxã: sim, sim, não, não. Experimente perguntar a um brasileiro quantas horas trabalha por semana. Ele vai responder: “trabalho mais ou menos 40 horas”. O senhor é religioso? “Sou católico, mas não tenho ido à missa“.

Ranking de governadores

Semana passada, fiz um roteiro com os nomes de governadores dos Estados e solicitei aos leitores que dessem uma nota ao desempenho do governador de seu Estado e a outros, caso tivessem conhecimento de sua performance. Hoje, apresento o resultado desta enquete. Vejam bem: enquete. Não se trata de pesquisa com rigor metodológico. Deixei de fora os governantes que receberam até 5 respostas. A coluna obteve 181 votantes.

 

GovernadorUFPartidoMédia
Eduardo LeiteRSPSDB6,96
Renato CasagrandeESPSB6,47
Ronaldo CaiadoGODEM6,27
Romeu ZemaMGNOVO6,17
Ratinho JuniorPRPSD5,68
João DoriaSPPSDB4,48
Flávio DinoMAPCdoB4,46
Ibaneis RochaDFMDB4,31
Camilo SantanaCEPT4,19
Fátima BezerraRNPT4,19
Carlos MoisésSCPSL3,86
Paulo CâmaraPEPSB3,46
Wellington DiasPIPT3,20
Rui CostaBAPT3,03
Renan FilhoALMDB3,02
Helder BarbalhoPAMDB2,83
Wilson LimaAMPSC2,40
Wilson WitzelRJPSC1,09

 

Leite e Witzel

A performance de Eduardo Leite ganha certo destaque no conjunto votado. É um nome que cresce na floresta dos tucanos. Mas o que chamou a atenção deste analista político foi o número de notas baixas atribuídas aos governantes. Merece atenção, ainda, o péssimo conceito atribuído ao governador do Rio de Janeiro. Mais adiante, perto das eleições, faremos nova enquete.

Boulos e Erundina

O PSOL fechou com a chapa Guilherme Boulos, cabeça de chapa, e Luiza Erundina, que tem uma boa votação nas margens. Boulos está mais moderado.

Marta vereadora?

Se Marta Suplicy não conseguir ser vice de Bruno Covas na chapa, pode se candidatar a vereadora.

Tatto

Gilmar Tatto não tem perfil para disputar a prefeitura de São Paulo pelo PT. O problema é que Fernando Haddad, o sonho de Lula como candidato, rejeita a hipótese. O partido tem em São Paulo seu maior bastião oposicionista do Brasil.

Covas

Bruno Covas tomou novo fôlego após mostrar coragem e disposição no combate ao câncer. Lembra a índole do avô Mário Covas. Tem grande chance de se reeleger.

Suplicy e Bolsonaro

Leio que o vereador Eduardo Suplicy mandou o livro Utopia, de Thomas Morus, ao presidente Jair Bolsonaro. Com sua histórica recomendação em defesa da renda mínima. Este analista político desconhecia a faceta humorística do ex-senador.


Gaudêncio Torquato, jornalista, é professor titular da USP, consultor político e de  comunicação – Twitter@gaudtorquato

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