
O Valor Econômico em matéria de Cristian Favaro desta terça-feira (18), revelou que as companhias aéreas Gol, Latam e Azul estão investigando a Decolar, marca da holding Despegar, após tomarem conhecimento de uma fraude na comercialização de passagens aéreas.
Segundo fontes ouvidas pelo jornal, a irregularidade envolve o uso indevido da chamada “tarifa operador”, um desconto aplicado em bilhetes vendidos dentro de pacotes turísticos. No entanto, a Decolar teria utilizado essa tarifa em passagens individuais, cobrando dos consumidores o preço cheio e absorvendo a diferença, o que teria inflado artificialmente seus lucros.
A investigação busca entender a dimensão do esquema e avaliar se houve impacto nas parcerias entre as companhias aéreas e a agência de viagens online. Procurada pelo Valor, a Despegar afirmou que mantém um bom relacionamento com suas parceiras e que a auditoria interna já identificou as irregularidades.
Como funcionava o esquema da tarifa operador
De acordo com a apuração do Valor Econômico, a Decolar incorporava indevidamente a tarifa operador — um desconto especial oferecido por companhias aéreas para pacotes turísticos — em passagens avulsas. Na prática, isso significava que os consumidores pagavam o valor cheio do bilhete, enquanto a agência absorvia o abatimento. Essa estratégia teria elevado o lucro operacional (Ebitda) da Despegar, gerando distorções nos resultados financeiros da empresa.
A Despegar reconheceu a falha e afirmou que sua auditoria interna encontrou 51 reservas irregulares em um universo de 9,7 milhões de passagens comercializadas anualmente. No entanto, fontes do setor consideram que esse número pode ser subestimado e pressionam por mais transparência na investigação.
Companhias aéreas exigem mais detalhes da auditoria
Embora a Despegar tenha admitido a irregularidade, as companhias aéreas envolvidas querem acesso detalhado à auditoria interna da empresa. Segundo fontes do setor, a exigência não se limita ao resultado final da apuração, mas inclui também os indicadores e metodologias utilizadas para identificar a fraude.
A análise preliminar realizada pelas aéreas apontou uma discrepância significativa nos preços praticados pela Decolar. Em média, os bilhetes comercializados pela empresa eram 15% mais baratos do que os valores oferecidos por concorrentes para os mesmos destinos, considerando fatores como prazo de compra, período de permanência e horário do voo. Esse descompasso reforçou as suspeitas de que a fraude pode ter sido mais abrangente do que a empresa admite.
Caso a Despegar não forneça informações mais detalhadas, as companhias aéreas podem exigir uma auditoria externa independente para avaliar o impacto total do esquema. Dependendo do resultado, a parceria entre as empresas pode ser revista, e a concessão da tarifa operador pode ser suspensa.
Concorrentes de olho na margem de lucro da Despegar
A reportagem do Valor Econômico apurou que além da investigação conduzida por Gol, Latam e Azul, o mercado de viagens já vinha monitorando as margens de lucro da Despegar há algum tempo. Segundo fontes do setor, o “take rate” — métrica que representa a margem de lucro na venda de pacotes — da empresa gira em torno de 14,7%, um número considerado elevado em comparação com concorrentes como a CVC, que trabalha com margens de até 13%.
As suspeitas cresceram ainda mais após a demissão de funcionários da área de aviação da Decolar no Brasil e de um executivo na Argentina. O mercado questiona se esses profissionais teriam, de fato, autonomia para operar um esquema dessa magnitude ou se a fraude teria envolvimento de níveis superiores dentro da companhia.
Próximos passos e impactos no setor
Diante das pressões do setor e da possibilidade de uma auditoria externa, a Despegar se manifestou em nota, afirmando que mantém um excelente relacionamento com as companhias aéreas e que seus clientes não foram prejudicados pelo esquema. No entanto, Gol e Azul não comentaram o caso até o momento.
O desfecho dessa investigação pode ter impactos significativos para o setor de viagens, especialmente na relação entre companhias aéreas e agências online. Caso a fraude se confirme em maior escala, é possível que empresas como Gol, Latam e Azul endureçam suas políticas de concessão da tarifa operador, alterando as condições comerciais para players do mercado digital.