Na sombra do Marizeiro

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Thomas Bruno Oliveira

Sol brilhante, poucas nuvens pinceladas no céu, o falar sonoro das águas em corredeira, encachoeirando-se sobre as pedras, uma densa e bela mata ciliar e um clima campestre agradabilíssimo. Este é o cenário paradisíaco que tive o prazer de estar acampado, nos limites dos municípios paraibanos de Barra de Santana e Alcantil, nos ‘Cariris Velhos’, precisamente no leito do Rio Paraíba, o maior curso d’água e uma das maiores bacias hidrográficas de toda a região, um gigante que nasce na Serra do Jabitacá, em Monteiro, e encontra as águas do Atlântico em Cabedelo, embelezando e semeando vida por onde passa.


Na sombra de um Marizeiro, acampei com os amigos Prof. Vanderley de Brito, Dennis Mota e Erick de Brito, pessoas com quem tenho a imensa satisfação de compartilhar muitas pesquisas pré-históricas que são verdadeiras aventuras. Fomos de carro e o abandonamos no terreiro da residência da simpática Sra. Maria de Lourdes que, muito prestativa, fez questão de nos conduzir pelo caminho à Pedra do Altar, sabendo exatamente o que ali queríamos observar e contemplar. Tendo ciência do que nos teria atraído àquele vale, a todo tempo, a gentil camponesa contava histórias de outros visitantes, inclusive de um “moço” que chegou a “se perder no leito do Rio”, no caminho de volta, anos atrás: “eu achei foi graça, ele não volta mais não é? Já estava anoitecendo e eu pensando em sair pra procurar…”, falou sorrindo.

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Por volta das 10h00, a nossa guia nos deixou, indicou com o dedo (e com os lábios) onde estava o nosso destino e retornou para seu lar, pois naquele horário ainda tinha muito por fazer e não era conveniente que a atrapalhássemos. Vendo ao longe a Pedra do Altar, seguimos. Da equipe, só o Vanderley de Brito tinha ido àquelas paragens nos idos de 2003, oportunidade em que conheceu os sítios arqueológicos que estávamos desejosos em visitar e fielmente os desenhou.
Na vertente para o Rio Paraíba, fotografamos a belíssima paisagística formada por uma depressão inter-montana, um vale que se afunila em um majestoso boqueirão de onde as pedras sobressaltavam aos nossos olhos. Muitas destas, gigantes, imponentes, contornando a mata e formando um tapete por onde as águas mornas do Rio Paraíba desfilavam. Ali, uma pedra em especial, a Pedra do Altar, formara um destaque em toda esta paisagem. Encravada na estreita calha do Paraíba, em sua margem direita, assentada sobre um extenso piso gnáissico, encontrava-se o gigantesco monumento lítico. O seu nome deriva de histórias de que uma outra pedra, não ela, simetricamente na outra margem, com uma saliência em forma de prancha, teria servido de altar para missionários evangelizarem almas, neste caso os diversos grupos indígenas que habitaram a região nos idos dos séculos XVII a XVIII. Assim, aquelas imediações ficaram conhecidas por esse topônimo.

Crédito: Santana

A Pedra do Altar retém em sua face norte um suntuoso painel rupestre contendo indecifráveis símbolos pintados em várias tonalidades de vermelho. Não se observa outra cor, os vários tons são sobrepostos em um imbricado de símbolos que chamam a atenção pela sua condição enigmática. Da esquerda para direita enxergamos um zoomorfo, uma possível ema, em seguida uma rede de linhas trançadas feitas sinuosamente ocupando uma boa porção daquele registro indígena, encimada por mãos caprichosamente desenhadas provavelmente pelas mãos untadas em tinta. Passei um bom tempo atônito, imóvel, e cada brisa que me cobria aumentava ainda mais a sensação de arrepio diante a contemplação daquele testemunho de milhares de anos.

Crédito: Santana

Conheço cerca de 400 sítios arqueológicos em todo o nordeste brasileiro e poucos me deixaram tão extasiados como este. Para quem se debruça a estudar estas inscrições rupestres, vestígios deixados pintados ou gravados nos rochedos, não há como não ser arrebatado por essa emoção. Na arqueologia a descoberta é o que fascina!
É impensável não refletir e imaginar aquele ambiente na época em que aquelas intrigantes inscrições foram realizadas. Qual mensagem estes ancestrais nativos queriam deixar por tanto tempo naquelas pedras? Quais eram as motivações, o que queriam dizer? Na ausência de dados mais conclusivos, nos restou registrar para a posteridade.

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