Startups brasileiras atravessam vale da morte?

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Nos últimos meses, várias startups unicórnio – startups avaliadas em ao menos US$ 1 bilhão, sem terem capital na Bolsa de Valores – tais como Olist, Ebanx, QuintoAndar, Zak, Vtex, Favo e Mercado Bitcoin, realizaram grandes dispensas no quadro de funcionários.

por Daniel Maffessoni Passinato Diniz*


As demissões em massa – chamadas pelo mercado de lay offs – são os primeiros reflexos do aumento da taxa básica de juros (SELIC) e da consequente falta de investimentos em startups.

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Já é de conhecimento geral que startups precisam de investimento para que possam sobreviver e crescer. Assim como nós, elas também possuem um ciclo de vida, com várias etapas, e cada etapa acaba por contribuir – a depender do tipo de investimento – para o seu crescimento, para a sua estabilidade ou até mesmo, para o seu crescimento exponencial. As startups unicórnios são famosas por já terem vencido todas as etapas, e sobretudo, por terem passado por inúmeros desafios – inclusive pelo temido vale da morte[1] – e por, apesar de tudo isso, conseguirem chegar até o décimo dígito.

Assim, entende-se que o combustível para as startups é a injeção de capital por parte de investidores e fundos de investimento. Entretanto, estes investidores, no intuito de auferir lucro, somente investem em startups que entendem ser promissoras.

Há até um ano, quando a taxa SELIC era mais baixa –  aproximadamente 3% – os investidores optaram por investir em ações e, principalmente, em negócios mais arriscados, como startups. Com a taxa de juros mais baixa, certamente o negócio seria promissor. Esse era o momento do boom das startups.

Durante a pandemia, o setor de tecnologia –  e consequentemente, das startups – explodiu, gerando um crescimento acelerado, mas também muita instabilidade. Trata-se de um crescimento que não conseguiu se sustentar, e que fez muitas empresas reverem seus resultados por estarem com dificuldade de crescer. Além disso, o boom de investimentos que acompanhou várias startups tornou o setor muito mais concorrido, fator que dificulta ainda mais o crescimento.

Em 2022, com a taxa SELIC a 13%, o cenário é outro. Frente à maior crise de inflação já vivida nas últimas quatro décadas, e ainda contando com incertezas globais, os investidores não têm mais incentivo para arriscar. O plano mudou. A palavra da vez é poupar. Tira-se dinheiro da economia e coloca-se na poupança popular – estratégia que gera competição com os fundos de venture capital. Além disso, os investidores encontraram alternativa, alocar seu capital em investimentos de renda fixa – isto é, no tesouro –  com altíssima segurança e um ganho, nas devidas proporções, elevado.

Em razão do contexto macroeconômico, as startups unicórnio estão tendo de mudar a estratégia voltada ao âmbito microeconômico. Nesse sentido, estão abdicando do crescimento a todo custo, e aderindo à preservação de caixa. Ou melhor, à sobrevivência. Assim, sem investimento e sem burn rate, o plano é fazer o capital durar mais.

Essa mudança de estratégia envolve, em primeiro lugar, cortes das unidades de negócio, que são ramificações do negócio/ ideia principal da startup, o que, num plano maior, acaba por acarretar as demissões em massa – para tentar equilibrar as contas – e no efeito dominó, no que se refere às empresas num plano geral.

Muitas startups têm optado pela demissão, pois durante o período de grandes aportes – o famoso boom – muitas startups investem na ampliação do quadro de funcionários, e, num momento de crise – acarretada principalmente por fatos externos, como o ambiente macroeconômico atual – acabam não suportando a manutenção de todos os funcionários.

Outra figura que pode ser afetada, além dos funcionários, são os investidores de fundos de Venture Capital. Com a promulgação do Marco Legal das Startups, alguns meios de celebração dos contratos de Venture Capital foram reconhecidos pelo legislador, como o contrato de mútuo conversível, que, com o advento dos fatos expostos até aqui, corre o risco de potencial frustração.

O mútuo consiste em um contrato típico que parte da possibilidade de o investidor receber o seu capital investido em participação societária, e só o faz pois reconhece o potencial do negócio e a viabilidade de rendimento. No entanto, o que acontece com esses investidores, agora que a estratégia das referidas startups não volta-se mais ao crescimento, e sim à preservação de caixa? É visto que há uma potencial frustração para esses investidores, que investem pensando no lucro e viabilidade de rendimento do capital investido – fatores que não serão mais tão atrativos, pelo menos por enquanto.

Momentos de crise existem para todos, até mesmo para as startups unicórnios, que eram tidas como imunes. O questionamento que fica é: Será que existe mais um vale da morte depois do jardim do Éden? Isto é, a startup pode vir a morrer mesmo depois de ter se tornado unicórnio?


* Daniel Maffessoni Passinato Diniz é Advogado. Sócio do escritório Passinato & Graebin – Sociedade de Advogados. Professor de M&A, Arbitragem e Direito para Startups na FAE Business School.

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