A Justiça francesa vai se pronunciar nesta segunda-feira (17) sobre as responsabilidades da queda do voo Rio-Paris, em 2009. As informações são da AFP.
Debates altamente técnicos, relatos sobre as vidas afetadas pela tragédia e a revolta de algumas partes civis. A Justiça francesa se pronuncia nesta segunda-feira (17) sobre as responsabilidades na queda do voo Rio-Paris, em 2009.
Relembre alguns destaques do processo:
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Compaixão e revolta
Em 10 de outubro de 2022, a ampla sala de audiências do Tribunal de Paris está lotada. Estabelece-se uma divisão espacial que será mantida por dois meses: à esquerda, posicionam-se os familiares e amigos das vítimas; e, à direita, os funcionários e especialistas da Airbus e da Air France.
A presidente do tribunal, Sylvie Daunis, e os dois juízes que a assessoram, detalham a infração contestada de homicídios culposos, antes de ler cada um dos nomes dos 216 passageiros e 12 tripulantes mortos, cercados por um silêncio denso.
Um depois do outro, a diretora-geral da Air France, Anne Rigail, e o presidente-executivo da Airbus, Guillaume Faury, expressam “compaixão”, “respeito” e “consideração” pelos familiares das vítimas. Ambos sustentam que as empresas não cometeram falhas.
A intervenção da primeira suscita algumas exclamações, mas é sobretudo a do segundo que desperta a ira das partes civis. “Vergonha de vocês!”, diz uma delas.
– A voz dos pilotos –
No dia seguinte, o diretor do inquérito, Xavier Mulot, detalha as investigações feitas sobre um avião a princípio desaparecido – seus destroços foram localizados somente dois anos após a queda, em 2011.
O ex-coronel da gendarmeria se emociona ao evocar as operações de resgate de uma centena de corpos presos à fuselagem, a cerca de 4.000 metros no fundo do Atlântico.
Dia após dia, especialistas reconstituem, segundo a segundo, os últimos 4 minutos e 23 segundos do voo em território brasileiro a partir do congelamento das sondas Pitot, que permitem calcular a velocidade da aeronave.
As últimas palavras dos pilotos e os ruídos da cabine, retirados das caixas-pretas, são reproduzidos em 17 de outubro a portas fechadas.
“Eles estavam na incompreensão total”, relata, na saída, Corinne Soulas, que perdeu a filha, abalada e emocionada como todos os presentes.
– “Penso que teria feito melhor” –
A cada audiência, os testemunhos tentam desvendar as ações dos pilotos naquela noite.
As panes das sondas Pitot haviam se multiplicado nos meses anteriores à tragédia: a reação da Airbus e da Air France à época é examinada, assim como a das autoridades de controle.
Em 9 de novembro, chega o momento dos interrogatórios.
O ex-chefe dos pilotos Pascal Weil representa a Air France: o homem alto de cabelos brancos defende a inocência da empresa e se recusa a culpar os pilotos, ou a Airbus.
Sucede-se ao dele o testemunho de Christophe Cail, ex-piloto de testes de perfil severo, que afirma que a Airbus, na época, avaliou corretamente o risco e que o acidente estaria ligado a “erros” da tripulação.
“O senhor teria feito melhor?”, pergunta o advogado das partes civis, Alain Jakubowicz, durante esta audiência agitada. “Eu penso que teria feito melhor”, diz Cail.
– “Não apenas 228 vidas” –
A partir de 23 de novembro, dezenas de familiares das vítimas testemunham, prestando homenagens a seus entes queridos falecidos, relatando os danos irreparáveis de suas perdas violentas.
Muitos relembram um longo caminho de luto, agravado pela midiatização mundial da catástrofe, às vezes a ausência de corpos a enterrar, as etapas do processo judicial.
Duas irmãs e um irmão de um dos três pilotos do voo AF447, David Robert, prestam homenagem a um homem “exemplar”, que “fez de tudo para salvar o avião”.
“Não são apenas 228 vidas, mas pelo menos o dobro, talvez o triplo, que tivemos a vida devastada”, afirma Gwénola Roger, que perdeu o noivo, Nicolas Toulliou.
– “Para que serve a Justiça?” –
Na manhã de 7 de dezembro, os dois representantes do Ministério Público se levantam. Evocando na introdução um “drama incomparável”, eles desenvolvem, em seguida, um arrazoado jurídico por etapas durante cinco horas.
No meio da tarde, eles concluem: “nós não estamos em condições de requerer a condenação da Air France e da Airbus”.
Estas requisições escandalizam as partes civis, que reagem com aplausos irônicos. “Para que serve a Justiça?”, ouve-se claramente.
A defesa solicita o arquivamento do caso, alegando pedir “o direito, nada mais que o direito”. O processo termina em 8 de dezembro.
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