Paris é a anfitriã dos Jogos Olímpicos 2024 e, como todo destino que recebe um evento desse porte, enfrenta inúmeros desafios. Em entrevista ao DIÁRIO, Isabella Perrotta, professora de Turismo Cultural e Criativo da ESPM-Rio, e João Figueiredo, coordenador do Mestrado Profissional em Economia Criativa, Estratégia e Inovação também da ESPM-Rio, analisam o cenário atual da capital francesa no que se refere ao turismo e como ela pode ser afetada negativa e positivamente.
*Por Clara Ribeiro
Essa é a primeira Olimpíada em um pós-pandemia sem restrições e, de fato, é algo que favorece a França de modo geral, afinal, os olhos do mundo se voltam para aquele país. O setor do turismo, sobretudo de Paris, pode colher frutos excelentes – segundo análise da Allianz Research, cerca de US$ 224 bilhões serão gastos na França este ano, sobretudo por turistas durante os Jogos de Paris. Outras consequências podem não ser tão boas assim.
O foco da mídia em um evento grandioso faz do local sede um protagonista em diversos aspectos. “No caso das Olimpíadas isso se intensifica, pois a coisa não é restrita a um estádio, arena ou anfiteatro, há uma série de jogos outdoors, circundados por diferentes paisagens. Na França alguns jogos acontecem em monumentos e lugares cartões-postais, integrados a paisagens que sempre foram objeto de desejo”, pontua a professora Isabella Perrota, especialista em Turismo Cultural e Criativo.

Overturismo
A profissional relembra que, por outro lado, a França, especialmente Paris, não precisa de propaganda turística. Os números falam por si só: segundo o último levantamento da OMT, em 2023 o país recebeu 89 milhões de turistas internacionais (primeiro lugar no ranking da organização), sendo Paris a cidade que mais retém visitantes. Por conta disso, seus habitantes já reclamam do excesso de visitantes – ocorre o que é chamado de “overturismo” – que se mostra uma ameaça à população local, em vários sentidos.
É aí que está o perigo, de acordo com Isabella. Os Jogos Olímpicos podem ser cruciais para que o turismo parisiense sofra com uma estafa geral. Se antes os moradores já estavam indo às ruas protestar contra a avalanche de turistas e uso da cidade para “instagramar”, após as Olimpíadas a situação pode entrar em colapso.

Excesso de turistas e desequilíbrio geral
“No verão do ano passado, o serviço de ônibus para o Mont-Saint-Michel precisou ser interrompido por horas, pelo excesso de turistas – mais do que o lugar poderia suportar. Vários destinos estão deixando de incentivar o turismo”, ressalta a docente.
Outros lugares da Europa, como Barcelona, também têm mostrado contrariedade ao denominado turismo de massa. A partir deste mês de agosto, aliás, a cidade espanhola proibirá aluguéis de curto prazo em acomodações particulares, como é o caso das locações por Airbnb.

Após as Olimpíadas, caso haja uma mobilização nesse sentido, é possível que Paris venha a considerar medidas mais incisivas para barrar esse boom de visitas ou, pelo menos, o mau aproveitamento dos destinos.
“O uso turístico de um território transforma aquele espaço de convivência local em mercadoria e atividade econômica. A defesa do Turismo sempre foi o fato de ser vetor de desenvolvimento local, gerar trabalho e renda. A crítica está, historicamente, ligada à poluição, desequilíbrio ecológico e descaracterização cultural do território – principalmente em lugares menores –, e congestionamentos de veículos e de pedestres, além de sujeira, nas grandes cidades”, reforça Isabella Perrota.

O efeito positivo das Olimpíadas em Paris
Em contrapartida às consequências que devem fatalmente ser sentidas no turismo de Paris e pela população loca, há efeitos positivos proporcionados pelos Jogos Olímpicos que merecem ser exaltados.
De acordo com João Figueiredo, coordenador do Mestrado Profissional em Economia Criativa, Estratégia e Inovação da ESPM-Rio, além de serem uma plataforma de comunicação tanto para marcas que patrocinam o evento e se associam à dinâmica esportiva, “as Olimpíadas são, na verdade, uma plataforma de comunicação da própria cidade. Toda cidade que empenha muitos recursos financeiros – é muito caro fazer o evento -, faz isso porque deseja comunicar alguma coisa para o mundo. Desse modo, a cidade sede utiliza a realização dos Jogos Olímpicos como plataforma de comunicação para se reposicionar no sistema global de alguma maneira”, frisa o docente.

Paris mais jovem e vibrante
Com a recepção das Olimpíadas, Paris quer, segundo João Figueiredo, rejuvenescer a marca da cidade. “Ela [a capital francesa] ficou muito associada a uma cultura erudita, aos grandes museus, e na verdade Paris deseja se apresentar para o mundo como uma cidade dinâmica, vibrante, na qual existe uma juventude fazendo coisas interessantes”, aponta o orientador da ESPM-Rio.
“O principal ponto, pensando do ponto de vista do Turismo, é que Paris deseja se apresentar para o mundo como uma cidade que possui uma cultura muito rica – e isso é inegável. Paris também é uma cidade de andar pelas ruas, de bares, cafés, eventos, de um entretenimento noturno muito pulsante”, frisa.

Após as Olimpíadas, a ‘Cidade Luz’ deve permanecer sendo a capital do turismo mundial. Contudo, além de enfrentar o overturismo, como citado pela professora Isabella Perrota, pode conquistar um feito desejado há anos: ser a preferida de um novo perfil de visitantes, os jovens.
“O principal efeito que se espera do Turismo para os próximos anos é uma Paris mais visitada ainda, mas não apenas visitada por famílias de pessoas na faixa dos 30 ou 40 anos, ou dos 40 ou 50. É possível mostrar que Paris é uma cidade para os jovens”, finaliza Figueiredo.
Caso a mudança no perfil dos viajantes se concretize, ainda que haja desafios e questões políticas, a capital da França pode se abrir também à inovação dos negócios turísticos.

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