A imagem dos EUA como um destino turístico desejável está se desintegrando diante dos olhos do mundo. O que antes era sinônimo de liberdade, diversidade e hospitalidade transformou-se, para muitos viajantes internacionais, em um território hostil, carregado de tensão política e incertezas.
CONSELHO EDITORIAL DO DIÁRIO*
As políticas recentes do presidente Donald Trump e sua retórica cada vez mais polarizadora têm repercutido de forma alarmante nas estatísticas do setor de turismo — e o prejuízo já começa a ser sentido.
A indústria aérea observa com preocupação o aumento expressivo de cancelamentos de voos com destino aos EUA. Segundo a Tourism Economics, a mudança no comportamento dos viajantes não é pontual, mas sim estrutural: projeta-se uma perda superior a US$ 60 bilhões em 2025, impulsionada pela percepção de que o país se tornou um destino menos seguro e menos acolhedor. A expectativa de crescimento de 9% nas visitas internacionais caiu drasticamente. O setor, que já havia enfrentado retrações significativas no primeiro mandato de Trump, agora encara um cenário ainda mais dramático, que vão além das tarifas alfandegárias e atingem o discurso público.
A retórica de confronto — direcionada especialmente a países como China, México e nações do Oriente Médio — reverbera nas escolhas dos viajantes. Houve queda de 11% no número de visitantes chineses, e regiões como África, Ásia e América Central registraram diminuições que variam entre 6% e 9%. A resposta canadense é emblemática: alertas oficiais do governo recomendando que cidadãos evitem viagens aos EUA coincidem com uma queda de 23% nas viagens terrestres e 13% nas aéreas, apenas em fevereiro de 2025. A estimativa é de que o turismo internacional vindo do Canadá cause, sozinho, um prejuízo de mais de US$ 3 bilhões ao país neste ano.
Crise dos EUA atinge Europa
A deterioração da imagem dos EUA também atinge a Europa. Em março de 2025, três cidadãos alemães foram barrados arbitrariamente na imigração americana — um deles, inclusive, com residência legal no país. O incidente provocou uma reação oficial do governo alemão, que emitiu novos alertas de viagem. Mesmo com o programa de isenção de visto (ESTA), que permite a entrada de cidadãos europeus sem necessidade de visto formal, a entrada em solo americano permanece sujeita à avaliação subjetiva. O episódio acende um alerta vermelho sobre a segurança jurídica dos visitantes e residentes estrangeiros.
Dentro do próprio território americano, a indústria hoteleira começa a sentir os efeitos da crise. As perdas de empregos no setor já são visíveis, especialmente nos primeiros meses de 2025, e a confiança dos investidores está abalada. Pequenas empresas que dependem do turismo — de restaurantes a serviços de transporte — enfrentam incertezas e se preparam para um impacto prolongado.
O que está em jogo não é apenas uma retração econômica, mas um reposicionamento simbólico dos EUA no cenário global. Ao trocar o soft power da diplomacia pela linguagem da exclusão, o país se afasta de uma de suas maiores virtudes: a capacidade de acolher. Enquanto isso, destinos como o Canadá, vistos como mais seguros e estáveis, emergem como alternativa natural para viajantes que antes optavam por Nova York, Los Angeles ou Miami.
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