Por Bruna Barboza Ferreira*
No contexto crescente das locações de curta duração, onde a comodidade e a privacidade são expectativas primordiais dos hóspedes, o uso de câmeras de vigilância levanta questões profundas sobre os limites da segurança e da invasão de privacidade. O fato é que, cada vez mais, a prática de captar imagens de vídeo ou fotográficas, sem o consentimento explícito dos ocupantes, tem ganhado as manchetes e suscitado debates acalorados sobre ética e legalidade.
Diante deste cenário, emerge o questionamento crucial: é ou não legal que o proprietário de uma acomodação por temporada capte secretamente tais imagens?
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Essa indagação não apenas lança luz sobre os direitos individuais dos hóspedes, mas também coloca em destaque os desafios enfrentados na busca por um equilíbrio entre segurança e privacidade nos espaços hoteleiros modernos.
Enquanto os proprietários das acomodações querem ter a certeza de que a sua propriedade está sendo cuidada pelo hóspede com o zelo necessário e esperado, os hóspedes, por sua vez, pretendem poder dispor livremente do alojamento, em segurança e com a sua privacidade respeitada.
Neste contexto, embora as câmeras de segurança nas áreas públicas de uma acomodação possam ajudar a garantir a segurança dos hóspedes e das demais pessoas no entorno, as câmeras em ambientes privados são, geralmente, consideradas uma violação da privacidade. Isso ocorre porque se espera que as acomodações sejam espaços privados onde os hóspedes possam relaxar e se sentir seguros.
O uso não autorizado de câmeras nesses espaços pode levar à invasão da privacidade pessoal, ao potencial uso indevido de informações pessoais e até mesmo a atividades ilegais.
Vale a pena notar que, no Brasil, o uso de câmeras escondidas em locais onde os indivíduos têm uma expectativa razoável de privacidade é ilegal. Isto porque, o inciso X do artigo 5º da Constituição Federal (CF) estabelece que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
Sob a perspectiva da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), a coleta indevida de dados por meio de câmeras de vigilância configura uma violação séria dos direitos de privacidade e de proteção de dados dos indivíduos. É que, de acordo com a LGPD, os dados pessoais são considerados informações relacionadas a uma pessoa natural identificada ou identificável e isso inclui, consequentemente, imagens captadas por câmeras de vigilância que possam identificar indivíduos. Assim, qualquer coleta, armazenamento ou uso dessas imagens sem o consentimento explícito ou sem uma base legal adequada pode configurar uma infração à LGPD.
Além disso, é importante destacar que a maioria das empresas de aluguel por temporada também tem suas próprias políticas de privacidade. O Airbnb, por exemplo, exige que todas as câmeras da propriedade sejam divulgadas no anúncio e proíbe seu uso em áreas privadas, como banheiros e quartos.
Os proprietários e gestores que infringem a lei, especialmente em relação a violações de privacidade, como a utilização não autorizada de câmeras em acomodações por temporada, podem enfrentar consequências graves, tais como descredenciamento justificado da plataforma de aluguel e o dever de indenizar os inquilinos que tiveram os seus direitos desrespeitados.
É imperativo, portanto, que os proprietários e gestores desses estabelecimentos adotem práticas transparentes e éticas, garantindo o respeito aos direitos de privacidade dos hóspedes e cumprindo as legislações pertinentes. A busca por um equilíbrio entre segurança e privacidade em ambientes de locação de curta duração requer um diálogo contínuo e uma abordagem responsável por parte dos stakeholders envolvidos.
No Brasil, onde o direito à privacidade ainda está se consolidando, é necessário, cada vez mais, promover a conscientização sobre os riscos do uso indevido de câmeras de vigilância e incentivar a implementação de políticas claras sobre privacidade e segurança. Somente assim, poderemos garantir que os espaços de locação sejam ambientes acolhedores e confiáveis, onde os direitos e a dignidade dos hóspedes sejam protegidos e respeitados em todos os momentos.
*Bruna Barboza Ferreira é advogada da área de Direito Empresarial de Martorelli Advogados