Cristiane Santos, consultora de viagem da Brafrika Viagens; Guilherme Soares Dias, jornalista e fundador do Guia Negro; Nilzete dos Santos, fundadora da Afrotours Bahia; e Heitor Salatiel, Produtor cultural, fotógrafo e cofundador do Guia Negro explicaram o que os agentes de viagens precisam saber sobre Afroturismo
POR ZAQUEU RODRIGUES
O trade turístico teve uma aula sobre afroturismo no segundo dia de WTM Latin America. O Explore Transformation Theatre, um dos três espaços de conteúdos desta edição da principal feira de turismo da América Latina, recebeu em seu palco Cristiane Santos, Guilherme Soares Dias, Nilzete dos Santos e Heitor Salatiel para comandarem o painel O Afroturismo e o agente de viagens: o que eu preciso saber e aprender?
Veja também as mais lidas do DT
Os palestrantes, referências do afroturismo brasileiro, apontaram que o setor tem muito a avançar na devida compreensão do que é afroturismo e como ser mais inclusivo e respeitoso com o tema urgente para o setor. Guilherme Soares Dias explicou que, numa definição mais técnica, o afroturismo é uma vertente do turismo cultural e pode ser realizada em todas as regiões do país.
“É um turismo de experiência feito por guias negros em lugares de história e cultura negra”, fundamentou o fundador do Guia Negro, lembrando que qualquer pessoa pode fazer Afroturismo. “Qualquer um de nós pode ir a Palmares, ir a um terreiro, fazer um passeio ligado a cultura e história negra. Quem pode ser o condutor desse passeio? As pessoas negras. Quem precisa ganhar dinheiro com afroturismo? As pessoas negras”.
Guilherme ressaltou que o termo afroturismo começou a ser adotado em 2018. “Até então, no Brasil, a gente falava de turismo étnico, turismo étnico afro. A gente fala que essas definições não nos definem. O termo Afroturismo é novo para todo mundo. De 2018 para cá as empresas passaram a adotar o termo”, ressaltou ele, ressaltando que a maioria das empresas que trabalham com afroturismo são pequenas ou médias. Portanto, é fundamental receber investimentos tanto público quanto privado.
Nilzete Santos, fundadora da Afrotours Bahia, primeira agência de afroturismo do país, explicou que o afroturismo é também um movimento. “É um movimento que não começou agora. O primeiro viajante que chegou até a Bahia, escreveu: ‘Tudo o que sobe é negro, tudo o que desce é negro, tudo o que corre é negro, toda a cultura é negra’. Ele era um alemão que chegou para visitar Salvador e, quando fotografou, era tudo negro”.
A especialista apontou que, desde esse aquele momento se institui um movimento de pessoas que vão em busca disso. E avisou: “O cliente de vocês estão em busca disso. O agente de viagem, sem perceber, envia os clientes para roteiros que eles não têm interesse. Quando eles chegam a Salvador, e agora também pelas redes sociais, eles nos encontram. O cliente das grandes operadoras chegam em Salvador, conhecem a Afrotours e se tornam meus clientes”.
Em uma fala inspiradora e didática, a fundadora da Afrotours Bahia explicou que que o afroturismo é um segmento conecta pessoas e a verdadeira história da cidade. “Salvador, por exemplo, conta com 85% da população negra. Vocês acham que as pessoas vão a Salvador só para ver praias? Não”, alertou ela. Nilzete disse que o afroturismo é para todas as pessoas que têm interesse por uma experiência real e que querem entender a história das pessoas daquele lugar.
A especialista também ensinou que o afroturismo é um movimento pedagógico. “O que a gente faz é ensinar aos turistas o que eles não aprenderam na sala de aula – a história do povo negro neste país, a história dos indígenas que foram tão excluídos de tudo. É de extrema importância a gente abrir a nossa mente. Hoje já temos uma rede bonita e conectada com muitos empreendedores negros e setor público. O presidente da Embratur disse que vai nos apoiar promovendo o afroturismo internacionalmente”.
Nilzete considera que o grande desafio é passar as informações para todos. “A gente sempre conhece as igrejas, mas a gente sabe se comportar ao chegar em um terreiro de Candomblé? Todo mundo quer ir. As pessoas chegam no terreiro e não sabem como se comportar. Quando entramos numa igre-ja sabemos como se benzer. Por educação, a gente sabe chegar num terreiro? A gente sabe a acessibilidade de chegar aos Quilombos? A gente entende o que são e os motivos de existirem os Quilombos no país? Essa é a importância do Afroturismo. Axé?”.
Heitor Salatiel sublinhou que o afroturismo é uma urgência do mercado de turismo. “Hoje é muito bonito as empresas falarem sobre diversidade e inclusão, mas não praticam isso no cotidiano. Para além do recorte racializado, é uma urgência do mercado se revolucionar e pensar nesse segmento. A gente tem várias operadoras e agentes de viagens aqui hoje, e a gente trabalha com vários destinos. O afroturismo pode ser incluído em todo destino. Em nossas experiências trazemos personagens essenciais para compreendermos a nossa história. Todo mundo passa por exemplo, nas avenidas An-dré Rebouças e Theodoro Sampaio, e não sabe que eram engenheiros negros”.
Heitor também chamou a atenção para a importância de consumir de empreendedores negros e fazer o dinheiro girar e trazer emancipação financeira. “Não tem nada melhor do que você fazer uma experiência turística num lugar de lazer, onde você aprende, consome informação e cultura e contribui com o social”.
Cristiane Santos complementou: “O fomento do empreendedorismo negro local é um aspecto estruturante do afroturismo. Na Brafrika Viagens, fazemos uma curadoria em todos os nossos destinos justamente para conciliar a viagem e festividades locais para fomentar o empreendedorismo negro”.
No Afroturismo, esclareceu Nilzete, “somos nós quem praticamos – o agente de viagem, o guia, os empreendedores que vendem durante a experiência… Isso precisa ser visto como reparação, como solução para o segmento. Na experiência do afroturismo, todos ganham. Todos devem experimentar o afroturismo. Quando vocês compram os nossos produtos, são produtos de excelência. Participar da experiência do afroturismo é fortalecer uma cadeia poderosa de produtos qualificados, onde todos realmente ganham. As primeiras empreendedoras do Brasil foram as baianas vendedoras de Acarajé. isso não se fala na sala de aula. Afroturismo é sobre isso. Não deixem de comprar nas mãos dos afro empreendedores, pois é bom para vocês e para o país. Axé?’.