A praia de Cua Dai, em Hoi An, no Vietnã, em muitos aspectos lembra as praias do nordeste brasileiro; água morna, coqueiros e ambulantes que oferecem comidas variadas e todo o tipo de quinquilharia.
Sentados num restaurante à beira da praia, bebíamos cerveja e observávamos o movimento; se tivéssemos sorte, o tempo poderia abrir e nós aproveitaríamos o dia de sol.
Não é por estar fora da areia que as vendedoras não te vêem. Lá do nosso camarote tivemos que dizer não obrigado incontáveis vezes.
Foi ali sentados que a Hoa nos alcançou. Chegou com sua grande cesta de souvenires, mas não ofereceu nada. Pousou-a sobre a nossa mesa e puxou conversa.
Num inglês bastante bom, nos perguntou de onde éramos – pergunta frequente por aqui – e depois de ouvir a resposta emendou com um por que escolheram o Vietnã como destino.
Essa era nova. Normalmente após saberem que somos brasileiros citam o futebol, Neymar, e tentam vender qualquer coisa.
Respondemos e ela quis saber se estávamos gostando. Uma conversa cordial nasceu ali. Também perguntamos e ouvimos muito sobre o Vietnã.
Ela tem 23 anos, casada há pouco, casou velha para os padrões locais. Disse que normalmente as meninas casam entre os 16 e os 18 anos. Contou que é órfã, ainda criança perdeu a mãe para o câncer e o pai num acidente de moto. Que estudou pouco porque as escolas são caras. Que os tratamentos de saúde também são caros e que, mesmo no parto, os médicos negam atendimento e que se a mulher não tiver recursos pode morrer.
Perguntamos mais, estávamos curiosos para saber como é a vida de um vietnamita, e ela nos contou que os homens são os chefes de família, mas que têm pouca ambição, que 90% deles bebem e jogam todo o dinheiro que ganham; fiquei pensando se essa conduta teria a ver com a guerra, ferida ainda recente no país. Não perguntei, tive receio de ser inconveniente.
–Se não estudou, onde você aprendeu a falar inglês?– quisemos saber.
–Na rua, trabalhando. Eu trabalho desde criança, mas antes vendia pouco. Andava quilômetros, de um lado ao outro da praia; várias vezes. Oferecia meus souvenires para muitos turistas e poucos compravam. Então chorava porque não vendia. Observei que as mulheres que falavam inglês andavam muito menos e vendiam muito mais. Comecei a aprender; com os turistas mesmo. Uma palavra um dia, uma frase noutro e fui aprendendo.
Contou que é órfã, ainda criança perdeu a mãe para o câncer e o pai num acidente de moto. Que estudou pouco porque as escolas são caras.
Quando a conversa estava no ápice, criada a empatia, os clientes envolvidos, ela nos abordou:
–antes que vocês digam não, deixa eu mostrar o que tenho aqui. São souvenires, para vocês darem de presente para alguém.
E com a nossa atenção passou a mostrar seus produtos. Explicava a origem e o sentido de cada uma daquelas imagens, chaveiros, todas as quinquilharias que trazia na cesta.
Estava difícil achar qualquer coisa que tivesse utilidade ou pudesse agradar a alguém, mas nós queríamos comprar e insistimos na pesquisa até acharmos uns marcadores de livros. Compramos.
Ela mais uma vez confirmou o que já sabia, nos envolveu e provocou nossa empatia. Excelente vendedora a Hoa. Ela sabe tudo.
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Sobre o Osvaldo:
Osvaldo Alvarenga reside em Lisboa e escreve para os blogs: Flerte, sobre lugares e pessoas e Se conselho fosse bom…, sobre vida corporativa e carreira. Atuou por 25 anos no mercado de informações para marketing e risco de crédito, tendo sido presidente, diretor comercial e diretor de operações da Equifax do Brasil. Foi empresário, sócio das empresas mapaBRASIL, Braspop Corretora e Motirô e co-realizador do DMC Latam – Data Management Conference. Foi diretor da DAMA do Brasil e do Instituto Brasileiro de Database Marketing – IDBM e conselheiro da Associação Brasileira de Marketing Direto – ABEMD, dos Doutores da Alegria e, na Fecomercio SP, membro do Conselho de Criatividade e Inovação.