O DIÁRIO de um cruzeirista confinado começa em Salvador, capital da Bahia, tem escalas em Ilhéus, Búzios e retorna para Santos, dia 6.
por Paulo Atzingen, de Salvador*
Publicado dia 02 de fevereiro (RETRÔ 2023)
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Depois que meu teste antígeno deu positivo restava a esperança do PCR. Fui cedo ao Medical Center do MSC Preziosa e não saí de lá com boas notícias. Deveria esperar na minha cabine para o segundo teste. Não deu outra: Covid-19 na cabeça e no corpo, com perdão do trocadilho. As escalas em terra em Salvador, Ilhéus e Búzios foram para o espaço. Neste dia 2 de fevereiro, a Rainha do Mar era idolatrada na capital baiana, mas não pude ir lá nem para fazer uma self. Não que faria.
A minha ida espontânea ao centro médico é uma recomendação da segurança sanitária da MSC, mas não por isso. Segui o exemplo do fotógrafo Daniel Lledó, que um dia antes fez o teste e tinha positivado. “Tem muitas pessoas idosas no cruzeiro, não é justo com elas”, disse-me Lledó mostrando sua boa estirpe.
O diretor da hotelaria no cruzeiro, Nenad Simovic, enviou uma cartinha oficializando – e lamentando – que meu teste a bordo do Covid-19 retornara com resultado “Positivo”.
Não tinha pra onde correr. A empresa tem como prioridade máxima a saúde dos seus hóspedes, dizia o início da carta: “Assim, e de acordo com as autoridades sanitárias locais, o nosso protocolo de saúde e segurança, exigimos que você se isole imediatamente a bordo durante o restante de seu tempo conosco”. Era o miolo do comunicado.
Imediatamente fui convidado a usar máscara cirúrgica N95 e a mudar de cabine. De uma hora para outra comecei a ser tratado como um hóspede do Yacht Club, a área destinada aos cruzeiristas VIP.
As condições clínicas na minha estreia com Covid-19 não eram das melhores: tosse seca, calafrios à noite e uma febre que ia e voltava como uma onda no mar. A febre controlava com um antitérmico que Daniel Lledo me enviou pelo mensageiro.
Cabine
A cabine de confinamento é uma cabine normal em tempos de paz e em tempos de guerra. Cama estilo twin, TV com os principais canais abertos, banheiro com ducha, uma decoração moderna, uma gravura interessante de Raimundo Briata na parede e uma varanda que me servirá de quintal nos próximos dias.
Nessas primeiras 12 horas de isolamento fiz todas as refeições e garanto que o paladar e o apetite continuam os mesmos. Destaco o almoço trazido pela guest relations Lizia: peixe grelhado, batata sauté e salada com folhas e legumes. E água, muita água.
À tarde precisava tomar um banho mas também driblar os calafrios. Tomo um ibuprofeno e me animo. Evitei molhar a cabeça e não senti frio. Coloquei uma camisa de manga comprida e a bermuda colorida apenas para não me enfiar no pijama às 17h30. Tirei uma foto para ilustrar esse texto. Deu um calorão e tive que tirar a camisa. Fui a varanda e vi, atrás do porto, um ponto de ônibus onde a vida realmente acontece para os soteropolitanos. Converso com Daniel bastante. Ele me passou um WhatsApp com sua programação para amanhã. De meditação a ioga, de pranayama e contemplação do sol, a canto de mantras. É preciso manter certos hábitos que nos ajudam a enfrentar as horas.
Jantar tem opções
À noite, uma espécie de governanta dos serviços de hospedagem, chamada Juliana me liga e pergunta se já havia escolhido os pratos do jantar. Disse que sim. Vou de pescada branca frita crocante com legumes e polenta como entrada, filé de salmão na chapa como prato principal e, de sobremesa, um prato de frutas frescas.
O navio desatraca do porto de Salvador às 23h30 e ruma para Ilhéus. É o primeiro dia do cruzeirista confinado.
Por fim, o antes de dormir, baixei mais um livro no Kindle, de Leon Tostói, pois o que trouxe, O Jardim do Éden, do Ernest Hemingway, é muito chato, um marasmo só.
*O jornalista viajou com seguro Europ Assistance