Por Paulo Atzingen – de Punta Arenas
O capitão Adolfo Navarro do navio Via Australis nos saudou logo no primeiro dia como Exploradores da Patagônia neste cruzeiro que partiu de Ushuaia dia 6 de abril e chegou nesta sexta-feira (10) a Punta Arenas. Este tratamento é justo. Foi exatamente o que representamos, exploradores dos confins da Terra do Fogo, no entanto, fizemos uma exploração sem deixar rastros, pegadas ou vestígios daquele homem antropófago e predador que vive nos grandes centros urbanos. Tudo aqui é milimetricamente pensado para não agredir o ambiente, não infringir o equilíbrio e, na medida do quase impossível, manter a natureza intacta.
Exploramos as florestas patagônicas entrando em seus mais íntimos habitats como no Seno Garibaldi, subimos a montanha para avistarmos a baia de Wulaia. Lá do alto fizemos um minuto de silêncio para honrarmos a natureza exuberante. Como a língua nos pesou enquanto observávamos a baia pintada assim há cinco mil anos. Nos aproximamos das geleiras Piloto e Nena e conhecemos o azul incandescente da barreira de gelo e, no ponto mais alto da expedição, desembarcamos no cabo Horn, lugar mais austral do planeta. Conversamos com Manoel Calbas, o homem do Fim do Mundo, funcionário do governo chileno que cuida do Farol nestes confins da Terra.
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Foram cinco dias e quatro noites, como diz a canção popular “Sem rádio e sem notícias das terras civilizadas”, mas é exatamente a proposta do cruzeiro de expedição da Cruzeiros Australis. Um mergulho quase kamikaze, rasante, para o interior de um dos ecossistemas mais complexos, sensíveis e instáveis do mundo. Sem os meios de comunicação usuais nos arrancando a concentração do que é importante, vimos a vida destituída de amarras culturais limitadoras, encarceradas em um quotidiano alienador e alienante.
Neste mundo dos mares do sul, entre seus fiordes, baias, florestas e geleiras, retornamos ao começo de tudo, passamos ao lado de elos perdidos na história natural e das teorias de evolução do homem e da natureza formulados por cientistas e pesquisadores que deixaram um legado de conhecimento. Navegamos nos mesmos canais de marinheiros que trocaram sua vida confortável da velha Europa por nevascas e tormentas em um oceano de incógnitas. Passamos ao lado de verdades absolutas impostas pela química e pela física, imutáveis ao longo do tempo e do espaço.
E quem sabe, parados diante de um iceberg, uma floresta subantártica, um fiorde ou diante do Cabo Horn, possamos ter ganhado de presente mais força, mais sonhos e mais fé, para seguirmos adiante nesta travessia.