Heloísa Cestari: ‘Mulheres que escrevem o turismo no Brasil’

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Viajei com Heloísa algumas vezes e recordo que em uma viagem aos Lençóis Maranhenses ela me perguntou: “Quais os personagens você vai colocar em sua matéria?” Eu não havia pensado naquilo ainda – talvez extasiado com o lugar ou vivendo meu momento turista – mas ela já se adiantava e me revelava os integrantes de sua reportagem futura. Foi dessa atitude sincera, profissional e confiança mútua que nasceu o respeito por essa jornalista.

por Paulo Atzingen*


Heloísa Cestari tem 42 anos, é paulistana, mas sempre morou em Santo André, no ABC. Heloísa é formada em jornalismo pela Umesp (Universidade Metodista de São Paulo) onde concluiu o curso no ano 2000. Sua especialização em turismo veio na prática profissional mesmo, diz em entrevista.

E coloque prática nisso. Helô  atua na área desde o ano em que se formou, quando foi contratada para trabalhar como repórter do caderno de Turismo do jornal Diário do Grande ABC. Cresceu junto com o caderno: “Fui repórter, redatora e editora por muito tempo. Depois, passei a escrever para sites, revistas, livros e guias de viagem”, enumera. Atualmente ela é editora assistente da revista Viaje Mais (Editora Europa) e também colabora com coleções de livros sobre o tema turismo e viagens.

Nesta entrevista não deixei de perguntar a ela qual é sua próxima reportagem e qual será seu personagem principal. Desconcertante, ela me respondeu: “É o Pedrinho, meu filhinho de um ano e meio”.

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Heloísa integra o time das Mulheres que escrevem o turismo do Brasil“.  Confira abaixo, a entrevista:

DIÁRIO – Helo, você teve influência de algum jornal, revista, ou jornalista na sua vida profissional?
Sempre gostei de ler as extintas revistas Próxima Viagem (que tinha uma diagramação supercriativa) e Viagem e Turismo, além do Guia 4 Rodas, do caderno Boa Viagem e da própria Viaje Mais, onde trabalho atualmente. Acho que todas essas publicações influenciaram a minha forma de escrever a ponto de eu migrar de um jornal para o segmento de revistas de uma maneira bem natural.

DIÁRIO – Destaque algum fato marcante na sua carreira de jornalista do turismo e/ou alguma (s) matéria (s) que lhe dá boas lembranças…

Por dois anos consecutivos, fui agraciada com o Prêmio Europa de Comunicação, concedido pela Comissão Europeia de Turismo (ETC). Na primeira vez, venci com uma matéria sobre roteiros de carro pelo Velho Continente, na categoria Melhor Reportagem sobre Europa, que abrangia todos os tipos de mídia. No ano seguinte, ganhei na categoria Melhor Reportagem de Jornal Impresso, com uma matéria sobre a Hungria.

Helo e Cesky Krumlov, na República Tcheca (arquivo pessoal)

DIÁRIO – Como você vê o jornalismo do turismo e viagens hoje?
Sem dúvida, o setor de viagens foi um dos mais afetados pela pandemia de Covid-19, e isso impactou diretamente o nosso trabalho como jornalistas. Seguindo as tendências do segmento, não temos mais feito viagens internacionais. O foco agora são matérias de serviço e de destinos nacionais, que possam ser visitados em viagens de carro a partir das capitais. Roteiros próximos e ao ar livre, com mais natureza e menos aglomerações, estão em alta, assim como a procura por aluguel de motorhomes, iates e casas para temporada. Nós, enquanto jornalistas, devemos dar as informações necessárias para que o leitor faça uma viagem segura ou planeje sua viagem para o pós-pandemia, sem contrair ou disseminar o coronavírus por aí.

DIÁRIO – Quais são as suas perspectivas para o jornalismo do turismo e viagens nos próximos anos?
Quando toda essa loucura passar, acho que teremos um boom do turismo. E espero que esse turismo revele-se mais consciente e sustentável, valorizando as culturas locais, a preservação do meio ambiente e as experiências autênticas. O jornalista de viagens deve abraçar essa responsabilidade, cobrando as autoridades e divulgando as boas práticas para que o crescimento do turismo não aumente a degradação da natureza e favoreça o desenvolvimento social dos destinos turísticos. Já tenho notado essa mudança de paradigmas no segmento de luxo, que nos últimos anos tem apresentado uma tendência a valorizar mais as experiências autênticas e os serviços personalizados do que a marca do amenity ou do champanhe. Virou menos ostentação e mais vivência; menos ter e mais ser. Muitas empresas do trade já perceberam a importância da sustentabilidade e essa bandeira deve ser de todos, inclusive dos jornalistas. Acredito que quem produzir conteúdo diferenciado, criativo, de qualidade e em concordância com essas novas aspirações dos viajantes se destacará em meio ao atual mar de selfies e stories que pouco acrescentam. No mais, os avanços tecnológicos nos ajudarão a produzir fotos de melhor qualidade e vídeos 360 graus que darão a sensação de viajar sem sair do sofá.

Capa de uma das edições que Heloísa ganhou o Prêmio Europa de Comunicação, concedido pela Comissão Europeia de Turismo (ETC)

DIÁRIO – Qual mensagem você deixaria para o profissional que deseja escolher o ofício de escrever sobre destinos?
Fuja do lugar comum, dos clichês e do “mais do mesmo”. Há muitos escritores de viagens atualmente, especialmente na internet, mas nem todos oferecem informação de qualidade, bem apurada. Quem souber mesclar impressões pessoais com uma linguagem atraente e serviço de qualidade se destacará. Também vale buscar um diferencial, que pode ser desde a adoção de uma linguagem própria até a escolha de um perfil específico de viajante para se comunicar exclusivamente com aquele determinado nicho. Já quem prefere apenas exibir fotos nas redes sociais tenderá a perder visibilidade com o passar do tempo, pois as imagens cansam e, se não houver conteúdo que as sustente, os seguidores acabam indo embora. Além disso, lembre-se sempre de que a credibilidade é o maior patrimônio de um jornalista; um patrimônio que leva certo tempo para construir e que pode se perder num piscar de olhos. Por isso, tenha sempre em mente que o seu patrão não é o dono do veículo de comunicação, tampouco o anunciante ou quem convidou para a viagem, e sim o leitor. É para ele que você deve escrever, pensando nos interesses dele. O dinheiro é consequência, mas nunca deve ser a causa do seu texto.

DIÁRIO: O que você falaria aos donos de veículos de turismo?

Se você for dono do seu negócio, seja sempre verdadeiro com o seu público e estabeleça regras de relacionamento transparentes com os seus “patrocinadores”, a fim de que todos identifiquem com clareza os limites e as diferenças entre um conteúdo editorial, um publieditorial e um anúncio. Por fim, quando você já for um profissional veterano na área, lembre-se das suas primeiras viagens e treine o seu olhar para nunca perder o encantamento, mesmo que já tenha visitado determinado destino inúmeras vezes. É esse olhar de deslumbre que inspira os melhores textos.

Heloisa em Bariloche, na Argentina (Arquivo Pessoal)

DIÁRIO – Qual sua próxima reportagem? Já pensou no personagem principal?

É o Pedro. Apesar de tantas viagens, ser mãe é, sem dúvida, a maior das minhas aventuras… Tenho muita vontade de viajar com o Pedrinho (a lazer, claro!) para redescobrir os destinos pela ótica de uma criança. Fico imaginando o primeiro banho de mar, o primeiro parque temático, a primeira fazendinha, o primeiro passeio de jangada, de avião, de navio, e até a primeira ida a um cinema ou o primeiro bolo a quatro mãos. Com o Pedrinho, tudo ganha um novo verniz. O simples torna-se especial. E ver o mundo com os seus olhos resgata em mim o encantamento dos marinheiros (e jornalistas) de primeira viagem. É inspirador. Um amor que não se compara.

Pedrinho, seu personagem principal (Arquivo pessoal)

*Paulo Atzingen é jornalista

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