Por Paulo Atzingen*
Clientes dão golpe com cheque sem fundos em hotel de luxo e não perdem a pose, hóspede nega ter retirado toalhas do quarto, mas elas são encontradas em sua mala, esposa visita hotel e quase encontra marido hospedado com a amante. Essas e inúmeras outras situações, algumas cômicas outras trágicas – que ocorrem todo dia nos hotéis do Brasil são descritas com estilo e técnica narrativa por William F. Rodrigues, em seu livro Cases em Hotel – como superar os obstáculos no dia a dia de um hotel – Editora Senac.
Ao invés de se enveredar por caminhos maçantes, característicos de livros técnicos de hotelaria e administração de um negócio, apresentando fatos sem se aproximar deles – portanto, artificiais – William, em seu livro, foi capaz de reproduzir diálogos entre hóspedes bandidos e recepcionistas atenciosos, funcionários desatentos e clientes com segundas intenções, executivos acima de qualquer suspeita e diretores de hotéis experientes, sem, no entanto, transformar seu livro em um relato insosso de administrador ou de gestor que teima em acreditar que qualquer um pode ser escritor e hoteleiro ao mesmo tempo. William sabe ser os dois sem prejudicar nenhum.
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Neste livro, William demonstra não só uma incrível capacidade em apresentar as situações inusitadas de um hotel, mas esmiúça os contratempos, os incidentes, os golpes, os equívocos, apresentando ângulos diferentes do fato retratado – quase como um romance de Gabriel Garcia Marques. Ele apresenta atitudes que poderiam ser tomadas pelo gerente ou por funcionários para evitar ou contornar alguns erros previsíveis, outros nem tanto.
Vejam este caso, da página 61:
“…Um cliente, que deveria chegar ao hotel em uma sexta-feira (quando começava sua reserva), vem somente no dia seguinte, sábado pela manhã. Como não há menção ao depósito efetuado, o no show não pode ser cobrado pelo dia anterior. A recepção, por sua vez, faz o check-in do hóspede sem qualquer alusão ao depósito. Sem nada saber, o hóspede efetua o check-out no domingo pela manhã.
Pra sua surpresa, é cobrada a diária de sábado para domingo. Embora afirme ter efetuado há mais de dez dias o depósito referente a duas diárias, o recepcionista não tem nada que confirme isso e obriga o hóspede a pagar suas despesas de hospedagem.
Na segunda-feira seguinte, o cliente entra em contato com o hotel para fazer uma reclamação sobre o fato. Realizados os levantamentos de modo correto, o depósito é, então, localizado. Além do pedido formal de desculpas, o hotel tem de devolver o valor total do depósito, referente a duas diárias”…
Essa onipresença descritiva e narrativa só é capaz de fazer quem conhece muito do riscado. E a estrutura do livro não se prende a incidentes ali do front, da recepção, reservas ou governança. William sobe as escadas da estrutura organizacional de um empreendimento hoteleiro e relata cases de Manutenção, Recursos Humanos, Marketing e Vendas…
Neste livro, o autor denota fazer o que ama. Parece que ele mergulha na piscina organizacional de um hotel, bronzeia-se com os relatórios de entrega de matéria-prima, e toma uma caipirinha diante do check-list de um jantar corporativo.
Saído do forno em março deste ano, o livro da Editora Senac Rio de Janeiro é uma joia que todo hoteleiro, profissional de turismo ou estudante da área deveria ler. Pela leveza e clareza da linguagem, pela pluralidade dos assuntos e por sua sacada educativa é um presente para quem quer ficar rico … de conteúdo.
* Paulo Atzingen é jornalista e fundador do DIÁRIO DO TURISMO