Entidades alertam para inadequação de medida, aprovada na virada do ano no âmbito da Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo (CDR), do Senado Federal.
A tentativa – que tem a oposição do setor hoteleiro – é a de instituir que a diária de hospedagem seja equivalente à utilização da unidade habitacional e dos serviços incluídos, por um mínimo no tempo de permanência de 22 horas – e não o tradicional período de 24 horas
por REDAÇÃO DO DIÁRIO – (POR Cecília Fazzini – especial para o DT)
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Trata-se de substitutivo a projeto de lei e prevê, se evoluir no Legislativo, alteração nos critérios de cobrança das diárias nos meios de hospedagem no País. Setor pede aplicação do que estabelece a Lei Geral do Turismo.
Considerada fora do contexto da prática já consolidada na hotelaria e sob crítica de dirigentes de entidades representativas do trade do setor, a matéria é objeto de polêmica.
O ponto nevrálgico é o texto substitutivo ao Projeto de Lei nº 2.645/2019, de autoria do senador Ciro Nogueira (PP/PI). A tentativa – que tem a oposição do trade hoteleiro – é a de instituir que a diária de hospedagem seja equivalente à utilização da unidade habitacional e dos serviços incluídos, por um mínimo no tempo de permanência de 22 horas – e não o tradicional período de 24 horas – sob pena de redução proporcional no preço cobrado.
Manoel Linhares, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis – ABIH Nacional, confia que a proposta não prospere nas demais comissões, nem no plenário do Senado. No momento, segundo ele, o que se aguarda são definições do relator e a posição oficial do Ministério do Turismo sobre o assunto.
O dirigente alega que a matéria “atenta contra a Lei Geral do Turismo (LGT) e a prática relacionada aos horários de diárias que são realidade no mundo todo”. E ainda mais contundente, ele destaca ser prerrogativa de qualquer estabelecimento comercial determinar seus horários de funcionamento e que na hotelaria não é diferente. Linhares considera positivo flexibilizar as regras de contrato de hospedagem, de forma a ser mais maleável para tipos de empreendimentos diversos, como hotéis, resorts, pousadas. “Mas não acreditamos que criar regras fixas, que impeçam a gestão comercial do empreendimento, auxilie na melhor prestação de serviços”, rechaça.
A redação original da Lei Geral do Turismo reza, em seu Artigo 23, parágrafo 4º. o seguinte: “Entende-se por diária o preço de hospedagem correspondente à utilização da unidade habitacional e dos serviços incluídos, no período de 24 (vinte e quatro) horas, compreendido nos horários fixados para a entrada e saídas de hóspedes”.
Conter a insegurança jurídica
No entender do presidente da ABIH Nacional é salutar pensar, sim, em soluções que desburocratizem a administração de hotéis, pousadas e resorts, mas alerta: “que não criem insegurança jurídica para os empreendimentos que investem no turismo brasileiro”.
“Não acreditamos que criar regras fixas, que impeçam a gestão comercial do empreendimento, auxilie na melhor prestação de serviços”, Manoel Linhares, presidente da ABIH Nacional
Sobre as interpretações que cercam a cobrança das diárias na hospedagem, Linhares cita que para o Ministério do Turismo, os horários de check-in e check-out seguem a política de cada estabelecimento, sendo sua responsabilidade informar aos hóspedes sob as definições de horário e período de permanência, assim como o cumprimento dessas regras. Já o Regulamento Geral dos Meios de Hospedagem, aprovado pela Embratur, orienta que cada empreendimento deve definir o horário de vencimento da diária, conforme sua conveniência ou de acordo com os costumes locais ou, até mesmo, seguindo acordo feito direto com os clientes.
Medida contraria engrenagem do mercado
A apreciação de tema técnico na esfera do legislativo, sem a devida consulta ao segmento, é desaprovada por Orlando de Souza, presidente executivo do Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil – FOHB. Ele também acentua que qualquer atividade econômica tem formato próprio de operar, que implica em engrenagem organizacional convencionada pelo respectivo mercado. “A hotelaria já encaminhou sugestão de como deve funcionar a questão das diárias, tema contemplado na LGT, que é de 2008”, salienta ele, ao reiterar ser a Lei a baliza a ser seguida.
Souza rejeita a interpretação de parlamentares que consideram que as diárias devam ser contabilizadas em 24 horas, a partir da entrada do hóspede no hotel e, caso não permaneçam pelo período cheio, no dia seguinte ainda tem direito a desconto. Ele prossegue ao afirmar que medida dessa natureza, além de provocar grande desarranjo operacional ao empreendimento, seja ele independente ou ligado à rede, ainda contraria o que é clássico no exterior, com check-in, a partir das 14 horas e check-out, depois do meio dia.
“A hotelaria já encaminhou sugestão de como deve funcionar a questão das diárias, tema contemplado na LGT, que é de 2008”, Orlando de Souza, presidente executivo do FOHB.
A investida na esfera do Legislativo é inquietante, no entender de Souza, porque se “um absurdo desses passa, os negócios do ramo da hospedagem ficam suscetíveis a demandas judiciais, Lei do Consumidor e outras implicações”. Segundo ele, o retorno do recesso parlamentar acende o otimismo. “Esperamos que na volta aos trabalhos, o relatório do senador Flávio Bolsonaro seja colocado como prioridade e, consequentemente, que a atualização da LGT seja votada”.
Sem correspondência com a realidade
Em sintonia com o entendimento do FOHB sobre a matéria, a Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação (FBHA) igualmente confronta o que sinaliza o substitutivo ao projeto de lei. Para a entidade, a resolução não condiz com a realidade e nem com a modalidade turística do Brasil. “Não somos favoráveis a esse PL, e sim ao que existe hoje: a LGT que regulamenta que o hotel fixará a duração da diária de hospedagem mediante contrato direto com hóspede, de acordo com as sazonalidades e os costumes de cada localidade. Observando, logicamente, o fluxo turístico de cada município ou localidade, funciona desta maneira no mundo todo”, salienta Alexandre Sampaio, presidente da FBHA.
Para a entidade, o projeto de lei não condiz com o que é vivido no dia-a-dia da hotelaria, já que o tempo da diária também inclui limpeza e manutenção dos quartos, a fim de acomodar outro hóspede, e atender o interesse de todos os consumidores. “É necessário contabilizar as duas horas de limpeza e manutenção, o que no final, fecharia a diária de 24h”, finaliza.
O referido projeto legislativo seguiu à Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC), para fase mais conclusiva e aguarda a designação de relator. E, caso aprovada no Senado, a proposta legislativa seguirá para a Câmara dos Deputados.
“O projeto de lei não condiz com o que é vivido no dia-a-dia da hotelaria, já que o tempo da diária também inclui limpeza e manutenção dos quartos, a fim de acomodar outro hóspede e atender o interesse de todos os consumidores”, Alexandre Sampaio, presidente da FBHA.
PESQUISA DT
Por meio de sondagem informal, porém comprometida em apontar o modo de pensar dos participantes de um de seus quatro grupos de Whatsapp, criados para estimular a network e fomentar o debate sobre temas de relevância, o DIÁRIO colheu opiniões. As perguntas, que versaram sobre a investida do Legislativo de alterar os mecanismos de cobrança das diárias da hospedagem, foram respondidas por empresários e representantes do Turismo, profissionais da mídia especializada, público em geral e o resultado foi o seguinte:
Sobre o tempo de duração de uma diária de hotel*
87% consideram ideal o tempo de duração de 24 horas da diária
11% optou por 22 horas
2% classificou como viável se computar o tempo que resta, a partir do momento da chegada do hóspede
Sobre o início da diária*
72% assinala que o período começa a ser computado na hora exata da chegada do hóspede
21% define como meio dia o horário para o check in
8% aponta que o horário do início da diária seja às 8 horas
0,1% opta por estabelecer que a diária se inicie às 14 horas
0,1% não escolheu alternativa possível
Sobre a cobrança da diária*
68 % concorda que o pagamento ao hotel seja integral, independente da hora em que o hóspede efetue o check in
32% assinala que a cobrança seja proporcional ao tempo de permanência do hóspede no hotel
*dados computados e compilados nos quatro canais de whatsapp do DIÁRIO