Empresas aptas vão apresentar as propostas para concorrência com o teto orçamentário de R$ 55 milhões.
Edição DIÁRIO com agências
Uma das mais representativas e importantes casas de espetáculos do país, o Teatro Nacional Claudio Santoro em Brasília, rompeu na última sexta-feira (14), com oito anos de palco vazio e luzes apagadas. O secretário de Cultura e Economia Criativa, Bartolomeu Rodrigues, assinou o projeto básico para obras de edificações que compõem o edital de licitação elaborado pela Novacap. Dessa forma, empresas aptas vão apresentar as propostas para concorrência com o teto orçamentário de R$ 55 milhões.
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“É com muita alegria que anunciamos ao Brasil o começo das reformas do Teatro Nacional a partir da Sala Martins Pena. Trata-se de um dos maiores símbolos do patrimônio nacional, obra tombada de Oscar Niemeyer, de valor artístico e cultural inestimável. Por determinação do governador Ibaneis Rocha, vamos mostrar a diferença de um governo de ação”, comemora Bartolomeu Rodrigues.
Assim que avalizou a documentação do edital, Bartolomeu Rodrigues fez questão de ir à Sala Martins Pena, objeto de extensivo trabalho que ocupou toda a sua pauta de trabalho desde que assumiu a pasta da Cultura em dezembro de 2019.
“Ouvimos todo tempo que o Teatro estava largado. O Teatro Nacional esteve largado. Mas não por este governo. Todos os dias, esse bem patrimonial foi motivo de esforço e de preocupação de uma equipe multidisciplinar e comprometida. Trabalhamos até chegarmos ao tempo em que não poderíamos esperar nem mais um minuto” observa.
Acompanhado da equipe técnica da Secec, Bartolomeu emocionou-se ao ter a reforma da Sala Martins Pena sair do campo do desejo para a concretude do canteiro de obras.
“É um sonho que estava frustrado em gestões anteriores e, nesta, conseguimos realizar. É histórico anunciar que as obras vão começar, e esse teatro vai voltar a fazer girar a economia criativa. Cada espetáculo que chega nesse palco contrata equipes técnicas diversas, traz o pipoqueiro para porta e ainda enche as mesas dos restaurantes após o fechar das cortinas”, celebra o secretário-executivo, Carlos Alberto Jr., entusiasta da reforma.
O impacto da obra se reflete também na economia do Distrito Federal. Com a reforma da Sala Martins Pena, estima-se a geração de 700 empregos diretos e 2100 indiretos movimentando também a economia do DF.
A REFORMA
Por ser um bem tombado individualmente, o Teatro Nacional requer uma reforma sob rígidas normas de restauro. A obra é um convênio entre a Secretaria de Cultura e Criativa (Secec) e a Novacap, que vão atuar em conjunto com funções estabelecidas no Projeto Básico.
Essa é a primeira etapa da reforma do Teatro Nacional Claudio Santoro a partir do projeto executivo de arquitetura elaborado pela empresa Acunha Solé Engenharia. A proposta enviada pela empresa concorrente deve apontar soluções técnicas para reforma das instalações prediais, sobretudo, elétrica e climatização; recuperação estrutural, restauração de pisos, revestimentos, esquadrias e de imobiliários, incluindo revestimento acústico, além de atualização tecnológica e de segurança das estruturas e dos mecanismos cênicos.
“Vamos devolver para a sociedade uma Sala Martins Pena moderna e em conformidade com o restauro do bem tombado”, destaca o secretário.
O CAMINHO DA REFORMA
Em janeiro de 2014, no rastro da tragédia da Boate Kiss, o Teatro Nacional foi fechado por recomendação do Corpo de Bombeiros e do Ministério Público, por não atender a normas de acessibilidade e segurança vigentes. Foram identificados 132 não conformidades. No mesmo ano, a então Secretaria de Cultura realizou licitação e posterior contratação do projeto executivo de reforma.
A complexidade arquitetônica do projeto e sua ousadia quanto aos recursos tecnológicos pretendidos resultaram em um orçamento total de mais de R$ 200 milhões. Nos anos seguintes, a crise econômica do país e, em especial, a constatação de uma delicada situação financeira do Distrito Federal tornaram inviável a realização da obra como um empreendimento único que demandaria a execução do valor integral previsto no projeto.
No governo Ibaneis Rocha, avaliou-se que a melhor alternativa seria a adequação do projeto executivo de forma a permitir a realização da obra em etapas, gradualmente, de acordo com a disponibilidade de recursos financeiros. Tal encaminhamento permitiria que, em uma primeira etapa, fosse reaberta a Sala Martins Pena, e em etapas posteriores as Salas Alberto Nepomuceno e Villa-Lobos e o Espaço Dercy Gonçalves.
No final de 2019, a Secec captou, junto ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD) do Ministério da Justiça e Segurança Pública, R$ 33 milhões, que seriam destinados à reforma da Sala Martins Pena. Foi assinado o convênio com a Novacap para elaboração do processo licitatório de obras.
Formou-se um Grupo de Trabalho, com um mutirão de técnicos e engenheiros e a presença dos gestores da Cultura e da Novacap. No entanto, a falta de documentos e as inconsistências técnicas no projeto originário desenharam um verdadeiro périplo para entregar o projeto básico para a Caixa liberar o recurso.
Foram mais de 400 plantas refeitas, e a equipe atendeu a mais de 2.000 pedidos de ajustes. Com o tempo exíguo e a urgência da reforma, o GDF resolveu desistir, em dezembro do ano passado, do Fundo por meio de distrato e resolver aportar diretamente o recurso para o restauro.
INAUGURADA POR CACILDA
Em abril de 1961, a companhia Teatro Cacilda Becker, dissidente do TBC (Teatro Brasileiro de Comédia), aterrissou na novíssima capital da República com a missão de inaugurar simbolicamente o Teatro Nacional, mais precisamente o espaço que, depois, viria ser a Sala Martins Pena (inaugurada oficialmente em 1966). Traziam três peças no repertório.
Quando chegaram, um susto. O teatro não tinha nem as poltronas, estava com os tapumes em volta. Não havia vidros, nada. Cacilda perguntou como aquele espaço seria inaugurado.
“De repente, vieram 50 homens com vassouras, um formigueiro, que trabalhou dia e noite”, contou a maior atriz brasileira daquela época.
Em 21 de abril de 1961, primeiro aniversário da capital, Cacilda Becker e Walmor Chagas apresentaram “Em Moeda Corrente”, espetáculo de Abílio Pereira de Almeida sobre o tema corrupção, em meio a ruídos externos da construção do Teatro Nacional.
Estudantes e operários encheram o espaço para ver aquela que era a principal atriz dos palcos na época. A biógrafa da atriz, Maria Thereza Vargas, conta que Cacilda fez questão de convidar todos os operários da obra. Ela estava feliz neste dia,
“Havia infiltração de ruídos e a acústica estava péssima, mas Cacilda e o elenco seguraram. De repente, faltou energia e o público não saiu do lugar”, lembra-se Thereza.
Faltou luz no meio da peça e a narrativa seguiu à luz de velas. O público estava encantado com esse negócio de teatro. A luz não demorou a voltar e a peça foi retomada segundo as manifestações de exclamações e risos. Uma das cenas mais ovacionadas era a que a personagem de Cacilda se ajoelhava aos pés do marido (vivido por Walmor) e clamava para que ele aceitasse a propina.
“Nesta hora, a plateia ria e chorava ao mesmo tempo. Era grotesco e lírico”, escreveu o crítico Décio de Almeida Prado.
Na cidade, com elenco formado ainda por Fredi Kleemann, Kleber Macedo e Alzira Cunha, Cacilda também apresentou “Pega-fogo”, um dos maiores sucessos da atriz, e “Protocolo”. Daqui, foram para turnê em Goiânia.
A voz de Cacilda foi a primeira a ecoar na Sala Martins Pena. Depois, a sala caminhou para abrigar espetáculos nacionais e estrangeiros, ganhando, com o tempo, a vocação de ser uma casa das artes gestadas no Distrito Federal. Enquanto a gigante Sala Villa-Lobos abrigava grande produções, a Martins Pena tornou-se um palco mais candango para música, dança, ópera e teatro.
A SALA MARTINS PENA
Inaugurada oficialmente em 1966, possui capacidade de 407 lugares, palco de 235 m², com 12 m de abertura e 15 de profundidade, 1 elevador e 15 camarins. No foyer, conta com painel de azulejos de Athos Bulcão e é bastante utilizada para exposições. Possui um busto de Ludwig Van Beethoven, doado pela Embaixada da Alemanha. Destina-se a saraus, performances, lançamentos de livros, coquetéis e exposições, com área de 412 m².
Um dos destaques da Sala Martins Pena é a obra “Painel Acústico”, de Athos Bulcão, localizada na parede direita (visão do palco). A obra é formada por 23 conjuntos de quatro peças de madeira envernizada, fixadas no topo da parede, dispostos em alturas variáveis. A obra tem uma variação contínua de altos e baixos relevos e é de 1978. O estudo de cores dos estofados, carpete e cortinas é assinado pelo artista.
PC