No coração de Salvador, entre a praça Castro Alves e o Farol da Barra, o Wish Hotel da Bahia me encantou por sua originalidade estampada em obras de artistas que por ali passaram nas últimas sete décadas.
por Paulo Atzingen, de Salvador*
Como o Copacabana Palace, no Rio, ou o Hotel Jaraguá, em São Paulo, o Wish Hotel da Bahia não é apenas um endereço sofisticado e preferido por artistas e celebridades quando vão a Salvador, mas um verdadeiro patrimônio cultural. A partir de sua inauguração em 1952, este hotel se tornou o epicentro da sociedade baiana, reunindo figuras ilustres, artistas de Hollywood, eventos históricos e um acervo de valor inestimável.
Na minha passagem por lá, não esbarrei em nenhuma celebridade, mas soube que toda a equipe técnica e músicos que acompanham a turnê Caetano e Bethânia estavam hospedados ali.
Fomos recebidos pelo gerente geral Henrique Pena e pelo historiador e curador Rafael Dantas, que nos guiaram por um passeio exclusivo pelos salões e obras de arte do hotel, resgatando a rica trajetória desse marco arquitetônico.
O Hotel da Bahia e seu papel na construção do turismo baiano
“A história do turismo na Bahia passa diretamente pelo Hotel da Bahia”, conta Henrique Pena. “Nos anos 40, Salvador já buscava se inserir no cenário turístico nacional. Foi um período de valorização das tradições culturais, e o hotel nasceu desse movimento,” me explica Henrique.
A ideia do hotel partiu de Octávio Mangabeira, então governador do estado, um homem à frente de seu tempo, intelectual, poeta e grande orador. Ele concebeu o Hotel da Bahia como um símbolo de modernidade, agregando apoio de grandes banqueiros e famílias influentes de Salvador, donas de cassinos e hotéis pelo Brasil.
Inauguração do Wish Hotel da Bahia
Sua inauguração em 24 de maio de 1952 foi um evento histórico. “O aeroporto de Salvador ficou congestionado por dois dias devido à quantidade de voos trazendo convidados”, relata Rafael Dantas. “O próprio presidente não conseguiu comparecer, e o vice, Café Filho, representou o governo federal.”
Desde então, o hotel foi palco de eventos e recebeu personalidades como o príncipe de Gales, Michael Jackson, Pelé, Juscelino Kubitschek e Fernanda Montenegro e uma infinidade de outros artistas, políticos, cientistas e gente proeminente. Embora muito discreto, há um quadro com os autógrafos de alguns deles.
Assim como o Copacabana Palace é para o Rio de Janeiro, o Wish Hotel da Bahia é um símbolo da hotelaria e da sofisticação baiana.
Essa importância histórica do Wish Hotel da Bahia namora com um acervo artístico impressionante, cuidadosamente preservado.
Obras como o Painel Cenas e Fatos da Vida Brasileira (1982), de Carybé , instalado no lobby; o Painel Portugueses, Africanos e Indígenas, no 2º andar, de Pierre Verger, quadros de Di Cavalcanti na Suíte Presidencial dão ao hotel um toque sofisticado, autêntico.
Rafael Dantas, curador das obras, nos apresentou algumas das principais peças que decoram o hotel.
Mosaico “Síntese da Baía Antiga” por Júlio Espinosa
No primeiro andar, encontramos um mosaico monumental de Júlio Espinosa, intitulado Síntese da Baía Antiga. “Essa figura feminina representa a alma e a proteção de Salvador”, explica Rafael Dantas. “Seu corpo translúcido revela a cidade ao fundo, com os casarios da Cidade Baixa e Alta, a Catedral Basílica e a Igreja de São Francisco de Assis.”
“As torres e igrejas, com olhos e bocas, simbolizam uma Salvador viva, em constante diálogo com seus habitantes”, afirma Dantas.
Painel de Gennaro de Carvalho
O grande destaque do hotel é o painel Festas Regionais, de Gennaro de Carvalho, localizado no restaurante. “Este é o maior painel circular do Brasil e um dos mais ousados de sua época”, ressalta Rafael Dantas.
A obra retrata festas tradicionais baianas, como a Lavagem do Bonfim, Bom Jesus dos Navegantes, Roda de Samba e até a controvertida Rinha de Galo, que era tradição na época.
“Curiosamente, anos depois, Gennaro conheceu sua esposa, Nair de Carvalho, e percebeu que uma das figuras femininas do painel era idêntica a ela, mesmo sem tê-la conhecido antes. A arte imitou a vida”, conta Rafael Dantas.
O painel, tombado pelo Estado da Bahia, passará por um restauro em março deste ano, garantindo sua preservação para as próximas gerações.
Modernidade sem perder a essência
Embora tenha passado por renovações ao longo dos anos, o Wish Hotel da Bahia mantém viva sua identidade histórica e artística. A piscina, por exemplo, foi uma adição moderna, mas os jardins projetados por Burle Marx na área externa serão restaurados em sua forma original.
“Aqui, cada detalhe conta uma história”, resume Rafael Dantas. “Não estamos apenas em um hotel, mas em um espaço que reflete a alma da Bahia.”
Seja pela sofisticação da hospedagem ou pela riqueza de seu acervo, o Wish Hotel da Bahia segue como um dos grandes tesouros de Salvador, onde passado e presente se encontram em um ecossistema que junta gente famosa, desconhecida e feliz com tudo o que esse hotel oferece.
Café com o Historiador
Desde 2021 o Wish Hotel da Bahia realiza o “Café com o Historiador”, projeto que consiste em um tour pelo hotel, seguido de café da tarde. O passeio é guiado por Rafael Dantas.
Após o passeio, os visitantes poderão aproveitar um café da tarde especial no restaurante. Criado para grupos de 3 a 8 pessoas, quem quiser participar da experiência deve fazer agendamento diretamente na recepção, ou pelos telefones (71) 3021-6700 e (11) 99557-3166. O ingresso custa R$ 180.
