O atendimento. Esse é o ponto que pode significar o céu ou o inferno para um estabelecimento, especialmente na atividade turística. As práticas para o bem receber os clientes em restaurantes, hotéis, cias aéreas, entre outros, envolvem estudo, tradição e inovação e são testados e avaliados constantemente nas respectivas operações. A opinião pública costuma ser exigente mas, muitas vezes, pode ser condescendente com algumas práticas questionáveis por algum tempo até surgir um fato novo que mudará isso e poderá colocar a hospitalidade de joelhos. E vamos a um exemplo desse tipo de situação.
Outback, uma rede de 139 restaurantes de enorme sucesso em 56 cidades e 18 Estados do Brasil. Com origem nos EUA tem como inspiração o filme Crocodilo Dundee e a temática do interior árido da Austrália, chamada de Outback. Há alguns dias, um vídeo de uma cliente viralizou uma questão até então comum e fora dos holofotes digitais: a indignação pelo atendimento de joelhos dos “outbackers” (garçons e garçonetes) diante da mesa dos clientes.
O vídeo trata da questão como uma prática de subserviência, humilhação e dor física causada aos funcionários por determinação da gestão da empresa, como relatou a própria atendente. Já a empresa, em sua rápida manifestação responde que está imediatamente orientando a todas suas unidades e quadros de atendimento que deixem de seguir tal prática que, ainda segundo a nota, se trata de: “A prática de o atendente olhar os clientes na altura dos olhos abaixando-se ou sentando-se junto deles a mesa sempre foi uma ação opcional que ficou muito conhecida no passado como uma frente de receptividade durante o atendimento”. Ou seja, se trataria de uma ação para ampliar a boa experiência dos clientes mas que não estaria preservando a dignidade ( e os joelhos) dos empregados.
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Diante da controvérsia, temos mais um caso que ilustra a importância da gestão de riscos e crises, especialmente, quando há atendimento ao público. No caso, há um enorme potencial de impacto para as pessoas, os negócios e a imagem da marca, ou seja, os valores básicos para a gestão de crises.
No caso, há um enorme potencial de impacto para as pessoas, os negócios e a imagem da marca, ou seja, os valores básicos para a gestão de crises.
E, diante disso, a principal questão é: essa alta sensibilidade só poderia ter sido notada agora e dessa forma? Seria mesmo necessário haver uma grande exposição de um vídeo viralizado para que o problema fosse descoberto, compreendido e tratado pela empresa?
A resposta é não.
Nos procedimentos mais básicos de gestão de riscos e crises existe a antecipação de pontos de atenção por parte de verificações simples e, principalmente, ao ouvir as pessoas da empresa. Como costumamos dizer, uma das grandes vulnerabilidades das empresas é a “deficiência auditiva”, ou seja, a pouca, ou nenhuma, capacidade de ouvir os seus.
Na primeira parte dos trabalhos de Gestão de Riscos e Crises, a análise de riscos, ouvir as pessoas que fazem a empresa deve ser prática padrão. E isso envolve, obrigatoriamente, em contar com o alto conhecimento existente nas cabeças dos profissionais da base operacional da empresa.
Em tempos de euforia com as ferramentas de IA, vale lembrar que além dos conhecimentos técnicos, internos e externos, relativos aos riscos e ameaças à uma operação, o conhecimento humano dos diferentes níveis e atividades traz uma oxigenação dos conceitos, renovando e atualizando conceitos, crenças e a realidade. Históricos e dados organizados são muito importantes para a análise e reposta a situações sensíveis, mas as pessoas ainda são a grande fonte de dados a ser observada para se antecipar às mudanças e a cenários amplos e complexos.
No caso do Outback, com a sua grande operação, certamente a informação preventiva para essa situação estava disponível, e algumas pessoas do time estavam prontas para entrega-la de forma voluntária e gratuita fornecendo o dado valioso que possibilitaria a antecipação ao problema que agora movimenta boa parte da energia e recursos da empresa.
Bastando para isso, ouvir.
Otávio Novo é advogado, profissional de Gestão de Riscos e Crises, atuando, desde o ano 2000, em empresas líderes nos setores de serviços, educação e hospitalidade. Durante 6 anos foi responsável pelo Departamento de Segurança e Riscos da Accor Hotels na América Latina. Atualmente é consultor, membro da comissão de Direito do Turismo e Hospitalidade da OAB/SP 17/18, professor e desenvolvedor de materiais acadêmicos e facilitador na formação de profissionais e na organização de empresas do setor do turismo e hospitalidade. Coautor do livro “Gestão de Qualidade e de crises em negócios do turismo” – Ed. Senac. É criador e responsável pelo projeto Novo8 – www.novo8.com.br
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