De tempos em tempos o DIÁRIO defende e destaca o trabalho dos guias de turismo por sua importância pedagógica – não meramente comercial – em um destino. Sem eles, ou elas, a superficialidade que se encara uma cidade ou atrativo acamparia de vez nas mentes e nos corações diante de tantas telinhas e distrações.
por Paulo Atzingen*
Os guias de turismo nos acorda como um galo na manhã, nos alerta como um sinal amarelo do semáforo e pinçam, com a técnica de um cirurgião, o coração de uma história, de um fato, que ficou soterrado pelos anos. Dentre os profissionais que integram a rede que compõem a viagem em seu sentido mais amplo, o guia de turismo tem o papel do professor de história e geografia, tem o papel do mestre em linguística e comunicação, tem o protagonismo de mestre de cerimônia de sua cidade, intérprete, porta-voz, tradutor. Fazem às vezes o papel de socorristas, motoristas, enfermeiros e até de babás.
Uma guia de turismo em Salvador
Como a totalidade das capitais brasileiras em sua fase pós-pandêmica, os centros turísticos possuem toda uma gama de trabalhadores, vendedores, que querem de alguma força negociar seus produtos. O assédio comercial tem sido um problema em centros turísticos onde o emprego formal é escasso e Salvador é um exemplo disso. São vendedores de artesanato das mais diversas modalidades: pulseirinhas com missangas, amuletos, crucifixos, entalhes em madeira, camisetas pintadas, bordadas, miniaturas de berimbau, pinturas em tecido, paisagem em areia dentro do pote de vidro e a própria imagem é comerccializada (nada mais justo), como as baianas vestidas a caráter e os lutadores de capoeira.
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Mais amor, por favor
Estávamos prestes a descer do ônibus, no Pelourinho, joia máxima da arquitetura colonial barroca brasileira e muito preservado quando a guia de turismo Ana Paula, da Luck Receptivo, condutora do grupo, nos dá as últimas informações sobre segurança e sobre os atrativos, informações de praxe de todo trabalho de guiamento. No entanto, antes de finalizar seus alertas, ela acrescenta:
“Eu queria pedir mais atenção de vocês, ao serem abordados por esses vendedores ambulantes. Eles existem, fazem parte da cultura e da paisagem soteropolitana. São pessoas sofridas que lutam dia-a-dia para levar o pão para casa. Não é obrigado comprar nada deles. Mas deem-lhes atenção. Eles são lutadores e precisam de ao menos desse olhar. Basta um sorriso”…
Essa guia conseguiu em uma frase (ou duas) sintetizar o abismo existente entre as classes sociais, as profissões e entre os homens (e mulheres). Com a classe peculiar daquelas pessoas que estudam e trabalham com a comunicação, Ana Paula com essa atitude – mesmo sem ter em mente esse objetivo – calou por algum tempo a insolência e a empáfia de boa parte de pessoas que se autodeclaram superiores por acharem que possuem cultura, status social, QI acima da média, ou imaginam que são melhores porque são de lugares mais ‘desenvolvidos’, ou por terem dinheiro.
Ana Paula com essa atitude – mesmo sem ter em mente esse objetivo – calou por algum tempo a insolência e a empáfia de boa parte de pessoas que se julgam melhores que as outras…
Sensível até o último fio de cabelo, mulher, nordestina, a guia Ana Paula tem uma relação direta e diária com esse ecossistema chamado Salvador, suas pessoas em seus dramas pessoais, infortúnios e tristezas. Deve sentir na pele todas essas idiossincrasias sociais permeando seu povo e sua gente.
Ana falou ao DIÁRIO
“Faz parte do conhecimento dos profissionais que atuam como guias de turismo conhecer também as problemáticas da cidade e de um povo que também vive das caridades como nos ensinou a Santa Dulce dos Pobres. Busco, com isso, cultivar diariamente a caridade em meu coração e usar os ensinamentos da Santa, praticar o amor ao próximo e assim busco ajudar ações sociais”.
Olhar diferenciado
Ela, como guia de turismo credenciada, promove o encontro, levando os turistas ao atrativo, ao entretenimento, ao mergulho no lugar. Esse meio de campo ocupado por Ana Paula entre os visitantes e fornecedores de serviços e produtos, e principalmente sua mensagem e exemplo sugere ao mundo e seu moinho de poder econômico um olhar diferenciado. Olhar as pessoas independente de quem elas sejam, com menos ódio e indiferença, mas commais amor e mais solidariedade.
O DIÁRIO parabeniza, mais uma vez, todos os guias de turismo do Brasil, representado aqui por Ana Paula, da Luck Receptivo.
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Paulinha é uma ótima profissional, é sensível a parte social da cidade, pensa e inclui todos envolvidos no turismo, diretamente ou indiretamente.
Parabéns! Excelente reportagem!