Vice-presidente de Comunicação, Relações Institucionais, Diversidade e Responsabilidade Social da Accor na América do Sul, Antonietta conversou com o DIÁRIO DO TURISMO sobre os desafios da hotelaria para avançar na agenda sustentável e as estratégias da Accor para reduzir os resíduos
POR ZAQUEU RODRIGUES*
Antonietta Varlese fala sobre sustentabilidade na hotelaria sem arrancar os pés do chão. As suas abordagens são diretas e francas. “Temos que fazer o máximo possível para avançar nessa agenda sustentável, mas precisamos levar em consideração as nossas disponibilidades”.
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Já no início, Antonietta lembra que a pandemia de coronavírus não desacelerou a agenda sustentável da rede Accor. “Nosso projeto se mantém bastante fortalecido”, avisa.
O desenvolvimento sustentável da hotelaria, prossegue ela, requer a ampliação de políticas públicas de fomento. “Às vezes a gente se sente amarrado. Queremos ser mais sustentáveis, mas não tem fornecedores, não tem produtos. Quando tem produtos, custam cinco vezes mais”.
Ela considera a cadeia bastante poluente e diz não ver soluções no horizonte vindas dos governos. A agenda do governo com foco em sustentabilidade, analisa ela, ainda é atrasada se comparada a de outros países. “A coleta sanitária ainda é muito primária”, cita.
Antonietta pontua que muitas ações para tornar a operação mais sustentável passam pelo setor financeiro, hoje em profunda crise. “É um investimento mais caro no início, mas que será compensado posteriormente no ganho de eficiência e no benefício à sociedade. Hoje, mil reais que se queira economizar com sustentabilidade pode gerar uma perda cinco vezes maior, inclusive de reputação”, lamenta.
Hortas educativas
Antonietta afirma que é preciso ampliar a perspectiva sobre a sustentabilidade na hotelaria e trabalhar essa agenda em diferentes frentes e linguagens com investidores, colaboradores, hóspedes e comunidade do entorno.
Na Accor, um dos braços para ampliar esse panorama são as hortas urbanas nos hotéis. “Os alimentos das hortas dos hotéis não suprem as necessidades das cozinhas, mas é uma iniciativa muito importante para fundamentar a cultura sustentável e orgânica”, considera a executiva.
Além de oferecer alimentos frescos para que os colaboradores possam levar para casa, as hortas costumam inspirar ações com propostas lúdicas como oficinas de compostagem, dicas para manter uma horta, aulas de criação de menus que evitem o desperdício, cardápios veganos…
As hortas estão presentes em mais de 100 hotéis da Accor na América do Sul. “O nosso negócio é lidar com pessoas. A gente acompanha as transformações da sociedade para trazê-las para dentro do hotel”, enfatiza Antonietta.
Gestão de alimentos
A gestão de alimentos é prioridade da Accor. De acordo com Antonietta, é um dos grandes desafios da hotelaria. “A gestão dos alimentos é bastante sensível, pois, se errar, falta comida”, sintetiza. “A gente tem um grande desperdício de alimentos. Precisamos olhar todo o ciclo, a cadeia toda, para reparar isso. Normalmente se olha apenas para o desperdício”.
Estabelecer metas é um ponto importante para direcionar as ações e dar continuidade na agenda sustentável. Antonietta afirma que, no caso dos alimentos, a meta da Accor é reduzir em 30% o desperdício até 2025. “No Brasil, o desperdício de comida é um contrassenso. Da mesma forma que a gente tem o desperdício a gente tem a fome”.
Livre de plástico
A meta da Accor é eliminar o uso de plástico de uso unitário em todos os seus hotéis até 2022. O hotel da Accor Sofitel Bogotá, na Colômbia, já vive essa realidade.
Antonietta explica que o sucesso do hotel colombiano dependeu de muitos fatores locais, como a disponibilidade de fornecedores. “Ele encontrou um espaço e alterou processos internos, treinou os colaboradores. É um hotel de luxo, que permite uma abrangência maior no uso de produtos sofisticados e alternativos”.
Uma mudança dessa magnitude envolve toda a cadeia, explica Antonietta. “É uma mudança comportamental, e isso também depende muito dos colaboradores”, afirma a executiva.
No caso do Sofitel Bogotá, ela destaca que o hotel desafiou os fornecedores a desenvolverem soluções sustentáveis para a operação do hotel. “A Accor realiza esse papel de criar produtos junto com os fornecedores”, destaca.
A eliminação do plástico de uso único é complexa, avalia Antonietta. “A gente esbarra também na questão cultural. A água em garra de plástico, por exemplo, é o item que a gente mais vende, pois os brasileiros já estão acostumados assim. A gente não quer vender mais água em plástico, mas não há alternativas”.
No Brasil, os hotéis Ibis, Mercure e Novotel substituíram os amenities por dispensers. A medida representou uma redução de 95 toneladas de plástico por ano. “Na América do Sul, começamos a trocar em todos os hotéis. Todas as nossas marcas terão dispensers”.
Na pandemia, prossegue ela, foi preciso trabalhar em conjunto com outros setores, como os de compras e de alimentos e bebidas, para não aumentar o uso de plástico nos hotéis. “Em muitas cidades houve decretos implementando itens de plástico nas entregas de alimentação via delivery”, justificada ela, lembrando que o plástico é o material mais oferecido no mercado.
O plástico também é o maior poluente das praias brasileiras. O PNUMA (programa das Nações Unidos para o Meio Ambiente) estima que 325 mil toneladas de plástico são despejadas no oceano todo ano no Brasil. O material, que demora 400 anos para se decompor, representa 70% dos resíduos que poluentes das praias brasileiras.
A escassez de fornecedores e produtos, a ausência de políticas públicas de fomento e fiscalização e os altos custos dos produtos costumam transformar a sustentabilidade num item de luxo, aponta Antonietta.
Mercado Livre de energia
Em meio a uma crise energética – mais uma – vivenciada pelo país, é essencial para o setor buscar fontes limpas de energia. A energia elétrica representa o maior custo da operação hoteleira. Antonietta afirma que “a Accor está investindo na compra de mercado livre de energia”.
Hoje, mais de 20 hotéis Accor no Brasil já operam com energia limpa, como a solar e eólica. “Com essas mudanças a rede reduziu mais de 5 mil toneladas de emissão de CO²”, comemora Antonietta, destacando que redução a emissão de CO² também é uma prioridade para a rede.
Novos lugares
Em novembro passado, durante a pandemia, Antonietta começou a descobrir novos caminhos no interior do estado por meio de uma nova perspectiva. “Assim como todos, estou viajando de carro por destinos locais, fazendo trilhas de Off Road. Sou jipeira e estou conhecendo novos lugares”, revela ela. Para a hotelaria, o momento é semelhante: é hora de abrir novos caminhos, ampliar a perspectiva e se conectar com a natureza.