Tornou-se vital aos gestores do setor personalizar experiências, como se cada consumidor fosse único
por Fábio Steinberg*
Que as pessoas têm comportamentos, necessidades e preferências diferentes, ninguém discute. Mas isto se torna particularmente verdadeiro em viagens e turismo. Por isto, tornou-se vital aos gestores do setor personalizar experiências, como se cada consumidor fosse único. No mundo real isto ainda não acontece. A segmentação de públicos hoje adotada ainda prioriza o tamanho do bolso do viajante.
Tomem-se as companhias aéreas. As ações são direcionadas quase que só para atender de forma distinta a primeira classe, e depois a business e finalmente a econômica. Não importa se o passageiro é um grosseirão desqualificado e incapaz de conviver socialmente, desde que tenha a capacidade de pagar para se acomodar na privilegiada frente do avião.
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Com raras exceções, esta ditadura econômica permeia também a hotelaria, bares e restaurantes, agências de viagens, sites especializados em avaliações, e demais prestadores de serviço. Sob o rótulo genérico de “turismo de luxo” esconde-se a discriminação ao viajante. Separa-se assim os que têm bala na agulha para sustentar a sofisticação e ostentação de que terá que enfrentar o regime do “pão e água”.
No Brasil não é diferente. Aqui também impera a mesma distorção de valores que no final afeta o desempenho de todo o setor. Veja o que acontece com os restaurantes. O marketing adotado por eles estimula a proliferação de blogs de ocasião, aqueles tocados por oportunistas que nada entendem de gastronomia. Mas que falam por conveniência bem do estabelecimento – justa ou injustamente – em troca de um prato de comida. No final, quem paga a conta é o consumidor, que pode comer gato por lebre. Forma-se assim um efeito-salsicha: tanto nelas como nas resenhas patrocinadas ninguém tem certeza sobre a origem do conteúdo.
Todo nós fazemos parte de alguma tribo. Na prática isto é subestimado pela indústria de turismo, dada a ausência crônica da segmentação por tipo de público. Difícil engolir que o melhor restaurante da cidade de São Paulo, segundo o TripAdvisor, seja um vegano / vegetariano. Com todo o respeito aos méritos do local, não dá para considerar que dos quase 36 mil estabelecimentos catalogados no site, a escolha prioritária recaia sobre um nicho alimentar. E isto em uma cidade de 12 milhões de pessoas que em sua vasta come carne.
Todo nós fazemos parte de alguma tribo. Na prática isto é subestimado pela indústria de turismo, dada a ausência crônica da segmentação por tipo de público
A experiência já diz para não misturar no mesmo saco laranjas, bananas, tomates e abacaxis. No entanto, gente muito diferente entre si parece que é jogado num mesmo liquidificador de opiniões. Depois da triturados e homogeneizados, viram um único consumidor médio irreal, que no fundo não representa ninguém.
O recente estudo “Entendendo o Viajante do Futuro”, encomendado pelo Amadeus à Future Foundation conclui que para prestar um serviço superior e sob medida é preciso cada vez conhecer o perfil do cliente. O trabalho projetou seis tribos, e sinaliza como elas deveriam ser tratadas por cada segmento nos próximos anos.
A primeira tribo é dos que viajam para cumprir uma obrigação, que pode ser pessoal, religiosa, negócios, entre outras. O foco principal da jornada é conseguir chegar sem percalços a um lugar, e no tempo certo.
Já o segundo grupo quer simplicidade na escolha, com transparência das condições oferecidas, sem exigir dele maiores pesquisas.
O terceiro é dos viajantes éticos, guiados pela preocupação ecológica e ideais políticos, com a meta de que seus gastos em turismo contribuam para o desenvolvimento econômico e social do destino.
O quarto é dos caçadores de benefícios pessoais, que associam a viagem a ganhos individuais em conforto, luxo, bem-estar, saúde ou autodesenvolvimento.
A quinta tribo é de puristas culturais. Querem aproveitar a viagem para uma imersão total em universos desconhecidos e experimentar novas formas de vida, diferentes das que adota.
Finalmente o sexto tipo de viajante pretende que o trajeto agregue capital social. Ou seja, usam e abusam da mídia digital para informar sobre experiências pessoais, de olho no crescimento de sua audiência online.
O estudo da Amadeus evidentemente não esgota o tema, mas contribui para repensar a abordagem atual dos por hotéis, agências, companhia aérea, e demais integrantes do turismo. Nem sempre os novos grupos estão identificados pelas suas condições socioeconômicas ou geográficas. O esforço vale a pena. A segmentação por “confrarias” de identidades não só proporciona ao viajante uma experiência mais valiosa, como gera rendas adicionais para os integrantes desta indústria.