Hoje é a primeira de uma série de crônicas que compartilharei aqui no DIÁRIO DO TURISMO. Estou feliz com o desafio e espero que você goste das histórias que tenho para contar. Ah, anote, as crônicas serão quinzenais e, se nada mudar, sempre às quartas. Na estreia, uma apresentação e prévia do que vem por aí:
— Vamos fugir/ pra outro lugar, baby! / vamos fugir / pra onde haja um tobogã / onde a gente escorregue…
— Você conhece essa música? — perguntou visivelmente surpresa a minha secretária; é que a versão recém lançada pelo Skank, recorrente nas rádios de São Paulo em novembro de 2004, era uma novidade para ela. Já eu cantava, baixinho, só para os meus botões, a versão do Gil, gravada 20 anos antes. Lembro que tomei um susto com a pergunta, era como se ela tivesse me apanhado fazendo algo muito errado.
São recordações de uma outra vida que tive. Provavelmente naquele dia, sem o saber, idealizava a vida que tenho hoje. Naquela época, nos idos anos 2000, eu estava executivo de multinacional, numa carreira de relativo sucesso, mas insatisfeito. Inconsciente ainda, sonhava, em voz alta o suficiente para a secretária ouvir, com qualquer outro lugar ao sol / outro lugar ao sul / céu azul, céu azul… E assim caminhava distraído do meu escritório para um qualquer compromisso desagradável em alguma penosa manhã de trabalho.
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Desde então muita água passou embaixo da ponte. Permaneci mais uns anos naquela empresa, empreendi, mas a vida foi me encaminhando (ou eu a ela) para uma mudança radical: vir viver sem fronteiras em Lisboa.
A capital portuguesa é um caldo de culturas e novidades. São mais de três mil anos de história.
A capital portuguesa é um caldo de culturas e novidades. São mais de três mil anos de história. Primeiro os celtas invadiram a região onde viviam tribos ibéricas, depois os fenícios dominarem o estuário do Tejo onde fundaram a Alis Ubbo, a “Porto Seguro”, que marca a fundação da cidade, lá pelo ano 1200 a.C; mas os gregos tomaram-na e perderam-na para os cartagineses, que foram dizimados pelos romanos que, mais adiante, foram expulsos pelos povos germânicos, que então deixaram os mouros ocupá-la até que, em 1147 d.C, liderados por Dom Afonso Henriques de Borgonha, os cruzados tomaram a fortaleza muçulmana que foi anexada ao recém fundado Reino de Portugal. Sem esquecer os judeus que, exilados de Jerusalém na segunda diáspora, aqui chegaram no Séc. V e viveram em liberdade até o finalzinho do Séc. XV, cada uma dessas civilizações deixou em Lisboa a sua marca.
Os “descobrimentos portugueses” também contribuíram para transformar a já então capital do reino na cidade cosmopolita que é: os navegadores trouxeram excentricidades da África, Ásia e América e vieram gentes daquelas terras. Do período colonial até hoje, Portugal é visto como terra de esperança por cabo-verdianos, brasileiros, guineenses, angolanos, moçambicanos, goeses, macaenses, chineses, albaneses, romenos, moldavos, nepaleses, indianos e – muito recentemente – por sírios fugidos da guerra. Todos esses imigrantes contribuem para dar mais cor, sabor, cheiro, som, suingue e criatividade a Lisboa; maior polo de atração de estrangeiros no país.
Não bastassem todas essas influências já entranhadas na cultura da cidade, Lisboa está na moda: para os chineses é romântica; para franceses, ingleses e italianos é boêmia; para os espanhóis é final de semana prolongado; para brasileiros é sonho de consumo e para os empreendedores em tecnologia e inovação, que chegam de toda a parte, é oportunidade. Para toda a gente é uma cidade jeitosa, segura e muito viva.
Acho que consideramos outras hipóteses antes de escolher Lisboa, mas que cidade no mundo somaria tantos pontos a favor? Buscávamos simplicidade, segurança, beleza, arte, céu azul e mar; nada disso falta por aqui. Não podia ser um lugar caro; para padrões europeus não é. “Minha pátria é a língua portuguesa”, escreveu Fernando Pessoa. Lógico que a língua materna pesou. Está a três horas de voo das principais capitais europeias. E, por fim, os laços familiares e afetuosos que tenho com Portugal foram fundamentais para a escolha.
Em 2016, a Iêda, minha esposa (você vai conhecê-la em breve), e eu, deixamos o cotidiano estressado de São Paulo, com todas as obrigações do trabalho, para mudar de vida.
Em 2016, a Iêda, minha esposa (você vai conhecê-la em breve), e eu, deixamos o cotidiano estressado de São Paulo, com todas as obrigações do trabalho, para mudar de vida. Nosso processo de transferência começou em 2014. Aos poucos, naquele ano e ao longo de 2015, tratamos de nos desvencilhar das atividades que nos prendiam em São Paulo e viemos. Até o momento sem arrependimentos. Lisboa é nosso porto seguro e, como no tempo de Dom Manuel I, ponto de partida para explorar outros cantos do mundo. É sobre esse cotidiano e as viagens que fazemos a partir de Lisboa que escrevo. Se você chegou até aqui, espero que volte para ler as histórias que vêm por aí.
Sobre o articulista:
Osvaldo Alvarenga, tem 54 anos, reside em Lisboa e escreve para os blogs: Flerte, sobre lugares e pessoas e Se conselho fosse bom…, sobre vida corporativa e carreira. Atuou por 25 anos no mercado de informações para marketing e risco de crédito, tendo sido presidente, diretor comercial e diretor de operações da Equifax do Brasil. Foi empresário, sócio das empresas mapaBRASIL, Braspop Corretora e Motirô e co-realizador do DMC Latam – Data Management Conference. Foi diretor da DAMA do Brasil e do Instituto Brasileiro de Database Marketing – IDBM e conselheiro da Associação Brasileira de Marketing Direto – ABEMD, dos Doutores da Alegria e, na Fecomercio SP, membro do Conselho de Criatividade e Inovação.