Edison Passafaro, professor de normas de acessibilidade: “Falta inteligência a alguns hoteleiros”

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Redação do DIÁRIO

“Falta de inteligência e sensibilidade , desrespeito às normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) e a quebra de paradigmas e preconceitos com a Paralimpíadas, que começa na próxima semana no Rio de Janeiro. Essas foram algumas das abordagens feitas por Edison Passafaro, palestrante e professor de normas de acessibilidade da ABNT.   Nesta entrevista, o profissional explicou de maneira ampla as dificuldades que os engenheiros, arquitetos e homens públicos e empresas possuem em pensar em prol das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. “Os hotéis são uma vergonha. E isso nasce na formação de profissionais e passa com certeza pela ganância pelo lucro”, afirma ao DIÁRIO Passafaro é gestor de projetos do escritório de arquitetura Design Universal Arquitetura Acessível e Sustentável. Confira a entrevista:

DIÁRIO – Durante o Fórum da Revista Hotéis, você fez uma exposição muito sóbria sobre os valores que os hoteleiros dão a questões relacionadas à acessibilidade. Você, inclusive, chamou-os de burros não dando a atenção necessária ao tema. Pode explicar por quê?

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EDISON PASSAFARO – Eles são burros por dois motivo principais. Chamemos de “pouco inteligentes” para ficar mais elegante. Primeiro porque deixam de ganhar dinheiro por ver a questão da acessibilidade como custo. Aliás, eles veem tudo como custo. O brasileiro não consegue enxergar as coisas como investimento, mas como custo. Deixa de agregar um grande nicho de mercado. Segundo porque ficam sujeitos, a qualquer momento, a uma ação jurídica que vai obrigá-los a fazer o que eles poderiam fazer com uma programação mais tranquila e, além disso, estão sujeitos a sanções, obrigação de fazer, pagar multas, ter alvará de funcionamento caçado, alguma ação por discriminação. Ficam sujeitos e expostos juridicamente. Eles poderiam aproveitar o “limão”, para fazer uma excelente limonada, mas, para isso, precisam buscar orientação adequada.

O brasileiro não consegue enxergar as coisas como investimento, mas como custo. Deixa de agregar um grande nicho de mercado

DIÁRIO – Que orientações seriam essas?

EDISON PASSAFARO – Eles, de verdade, precisam procurar profissionais de engenharia e arquitetura realmente especializados na questão da acessibilidade. Por isso eu levei o programa à ABIH. Justamente para a ABIH ser um polo de distribuição dessa orientação. Na maioria das vezes, o profissional de engenharia e arquitetura também não se encontra preparado para oferecer uma consultoria correta na questão da acessibilidade. Ele também tem uma carga de desconhecimento e preconceitos e acaba oferecendo aos empresários soluções esdrúxulas, pouco atrativas e que acabam desestimulando o empresário a promover acessibilidade como se deve, de acordo com a legislação.

DIÁRIO – ABIH Nacional ou de São Paulo?

EDISON PASSAFARO – Começamos pela ABIH-SP, fizemos uma parceria com a ABIH Nacional, então, o empresário que entrar em contato com ambas as entidades, terá os caminhos orientados. A ABIH Nacional não reverberou isso como as outras ABIHs. A ABIH Nacional tem uma parceria assinada com o Programa de Acessibilidade e Inclusão Social na Hotelaria e Turismo, um projeto meu e que hoje faz parte do calendário de gestão da ABIH. Inclusive, criei um selo de acessibilidade em parceria com a ABNT, onde dou aula e faço auditoria justamente para certificar os empreendimentos que se encontram de acordo com as demandas legais e técnicas. É um selo oficial em parceria com a ABIH e ABNT. Não houve nenhuma adesão, nenhum interesse da parte do empresariado.

paralimpiadas

DIÁRIO – Você falou que a hotelaria brasileira está sendo moldada a partir do biotipo do homem britânico que mede 1m82. Você acredita que a hotelaria moderna no Brasil não evoluiu nos últimos tempos?

EDISON PASSAFARO – No quesito conceito, no conceito de desenho universal, que é o que pede a legislação, que é justamente projetar para todas as pessoas, eu diria que a parte de engenharia e arquitetura não evoluiu nada. O que evoluiu, a trancos e barrancos, e por imposição e força de lei e fiscalização, foi a adoção de algumas unidades, chamadas adaptadas, que, principalmente as grandes redes, começaram a fazer. Mas, na maioria das vezes, em não conformidade com as normas da ABNT.

O que percebemos é que o empresário faz por obrigação, de forma compulsória, não atende o que deveria fazer e não atende as conformidades propostas pela ABNT.

DIÁRIO – Você falou sobre uma rede que tem seguido as normas técnicas e é referência. Qual rede é essa?

EDISON PASSAFARO – São dois hotéis fazenda, um deles se chama Parque dos Sonhos, o outro Canto dos sonhos. De fato, decidiram investir nessa questão, adotaram o conceito de desenho universal. Hoje todo o empreendimento é acessível para todo mundo. Não existe diferenciação entre apartamentos acessíveis e não acessíveis. A taxa de ocupação desses empreendimento, segundo dados do próprio proprietário, passa de 90% na média do ano. Ele ganha muito dinheiro com isso, além da projeção internacional, prêmios, reconhecimentos. Virou referência. Ele, o José Fernandes, costuma dizer, em suas palestras, que ganha dinheiro com acessibilidade.

É importante utilizarmos a terminologia que é oficializada pela ONU. Estamos falando do segmento das pessoas com deficiência. Esse é o termo correto: pessoas com deficiência

DIÁRIO – Estamos próximos às Paralimpíadas. Você acha que este evento pode ajudar na diminuição do preconceito do brasileiro com pessoas com mobilidade reduzida?

EDISON PASSAFARO – É importante utilizarmos a terminologia que é oficializada pela ONU. Estamos falando do segmento das pessoas com deficiência. Esse é o termo correto: pessoas com deficiência. Pessoas com mobilidade reduzida, são os outros segmentos que não possuem deficiência, mas têm comprometimento de locomoção ou comunicação. Podem ser idosos, gestantes, obesos, mas não se enquadram no segmento de pessoas com deficiência.

Sem dúvidas, a Paralimpíada, até pela exposição midiática que ela começou a ter, vai desmistificar e quebrar paradigmas e preconceitos, sem dúvidas. O que me preocupa é o quanto isso se transformará, na prática, nas questões de gestões públicas e privadas para transformar os ambientes de forma acessível no seu cotidiano. O brasileiro tem essa característica de enaltecer as pessoas  com deficiência no sentido da superação de limites, mas na hora de colocar 100 reais para fazer uma rampa, ele não faz. Tenho amigos donos de restaurante que não adaptaram, até hoje, seus restaurantes. O brasileiro é bom para fazer festa, ser simpático. Você percebe nos ambientes que realmente não há preocupação, ou pouco se preocupam. Isso tem que partir do profissional que é responsável pelo projeto, o profissional de engenharia e arquitetura que assina uma responsabilidade técnica do projeto; esse CPF deve ser responsabilizado pela questão dessa mudança de cultura na cidade.

 

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