Na avaliação de três especialistas consultados pela reportagem, o projeto de lei complementar que obriga empresas com patrimônio líquido acima de R$ 1 bilhão a emprestar até 10% de seus lucros para o governo pode piorar o ambiente de negócios no país. O PLP 34/2020 está em tramitação na Câmara dos Deputados. Segundo a proposta, o objetivo é utilizar os recursos para pagar despesas emergenciais para o combate à pandemia da covid-19.
Agência do Rádio com EDIÇÃO DO DIÁRIO
A especialista em finanças e em Investimento e Risco, Catharina Sacerdote, entende que, se for tomada uma fatia tão representativa do lucro das empresas, haverá uma quebra de confiança e queda no interesse em investir no país. Em longo prazo, isso pode atrasar a recuperação econômica no pós-crise.
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“Nas bolsas de valores, investidores estrangeiros costumam escolher empresas maiores, com mais caixa e que tenham apresentado lucro nos anos anteriores. Se vai haver uma ação justamente de retirada de recursos desses caixas, as empresas deixam de ser interessantes para ter o seu dinheiro investido através da bolsa. Assim, esses investidores, tanto de capital interno quanto de capital estrangeiro, acabam recuando”, esclarece.
Para o professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), Fernando Zilveti, o fato de o texto estipular quanto cada empresa deve pagar com base no lucro dos últimos 12 meses é um equívoco grave.
“O PLP 34 gera uma insegurança jurídica, sem dúvidas, porque se baseia no patrimônio líquido retroativamente. Esta base retroativa gera uma insegurança jurídica e consiste numa inconstitucionalidade flagrante, contra a qual as empresas devem se insurgir caso o projeto seja aprovado nesse formato”, explica.
“O que as empresas precisam é de um suporte financeiro, de crédito a longo prazo, um suporte grande para manter a atividade produtiva e que empregue mão de obra”, acrescenta Zilveti.
Calote à vista?
Além de causar riscos à sobrevivência financeira das empresas, o projeto ainda gera incerteza por conta do histórico negativo de medidas semelhantes a essa. Os últimos empréstimos compulsórios – criados em 1962 e 1986 – jamais foram devolvidos ao setor produtivo.
“Esse é um ponto bem crítico, porque o histórico de empréstimos compulsórios no Brasil não é favorável. As empresas já estão muito endividadas e ainda vão ter que se sujeitar a um empréstimo compulsório com o risco de não receber. E ela vai deixar de usar esse dinheiro com alguma outra coisa (investimentos), então a empresa precisaria fazer uma análise do custo de oportunidade”, alerta o mestre em Economia e sócio da consultoria G2W investimentos, Ciro Almeida.
O PLP 34/20 estabelece que os valores pagos ao governo sejam restituídos às empresas em até quatro anos, contados a partir do fim da situação de calamidade pública em função do coronavírus. Para passar a valer, o texto precisa ser aprovado pelos Plenários da Câmara e do Senado e ser sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro.