por Magdalena Martinez – Montevidéu (El País)
Usuários de maconha no Uruguai descobriram depois da legalização que fumar a cannabis artesanal do autocultivo é uma experiência muito mais “forte” do que o consumo da substância vendida no mercado negro. “Com duas tragadas já basta”, e concordam: os longos períodos fumando acabaram, a experiência agora é muito mais breve, com um sabor e aroma diferentes. A tal ponto que os setores que defenderam a descriminalização afirmam que a distribuição legal de 10 gramas por semana em farmácias poderia ser excessiva se não houver campanhas de informação.
Na ausência de registros em massa, o que de fato parece aumentar é a preferência pela maconha artesanal e o lento retrocesso da venda de maconha ilegal, o chamado prensado paraguaio, procedente do país vizinho, uma mistura de cannabis com outras substâncias indeterminadas que incluem produtos químicos.
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Pedro é um consumidor assíduo, tem vários pés de maconha em casa e não pretende regularizá-los: tem medo de deixar seu nome num registro. “Há algum tempo cultivo minha própria maconha e nem me passa pela cabeça comprar no mercado negro. Recentemente tive que fazê-lo porque estava no exterior, mas minha cabeça doía e tinha gosto de amoníaco na boca”, explica. Outro consumidor, Álvaro Delgado Vivas, decidiu fazer parte de um clube de cannabis que atualmente conta com 45 membros e cultiva cerca de 95 pés de maconha, tudo dentro da lei. “É forte, é muito mais psicoativa, mas deixa você com uma sensação melhor”, diz, fazendo referência às plantas do autocultivo. “Tenho 26 anos e há três deixei de consumir o prensado paraguaio. Às vezes vou ao estádio e há pessoas que continuam fumando, porque o cogollo [artesanal] custa mais. Na medida do possível, o cogollo é uma novidade, é outro mundo. Em Montevidéu ainda se consume maconha ilegal, porque vai demorar um pouco para a venda em farmácias”, diz.
Terrenos do Estado
O Governo anunciou que duas empresas vão começar a cultivar cannabis em terrenos de propriedade do Estado, e que a substância chegará às farmácias para venda ao público em meados de 2016. Diego Pieri, sociólogo e membro da organização Proderechos, confirma que o consumidor uruguaio transita cada vez mais entre o mercado legal e ilegal. “A maconha de qualidade não é acessível para 100% [das pessoas], ainda falta a implementação da venda em farmácias. Então muita gente alterna: fuma o paraguaio quando fica sem flores. Isso faz com que se perceba a diferença da experiência.”
Pieri afirma que o mercado negro estagnou enquanto a maconha artesanal está ganhando mais adeptos. Um estudo da Fundação Friedrich Ebert, do Uruguai, publicado em maio 2015, mostra que 39% dos usuários de maconha já escolhem as flores do cultivo artesanal.
Na Associação de Estudos da Cannabis (AECU), todos os dias chegam adultos à procura de produtos para aliviar suas dores e “que saem com suas mudas”, diz Laura Blanco, presidenta da organização. Também chegam estrangeiros. Por lei, apenas residentes podem consumir e cultivar maconha. Blanco também afirma que os 40 gramas mensais autorizadas por lei são excessivos e que o Governo deve fazer campanhas de prevenção e informação.
4,3 reais por grama
Os consumidores reconhecem que surgiu um “mercado cinza” que transita do autocultivo legal até alguns compradores. Assim, o grama da flor artesanal estaria sendo vendido por 80 pesos (cerca de 11 reais) nessa “zona cinzenta”.
Para efeito de comparação, o prensado paraguaio seria muito mais barato, cerca de 30 pesos (menos de 4,3 reais). E quando a maconha chegar às farmácias, o preço será de menos de 4,3 reais por grama, segundo as autoridades.