Programas de treinamento e seleções-relâmpago são algumas das maneiras com que a Lufthansa recruta e prepara seu pessoal de solo e do ar
Por Solange Galante
O Grupo Lufthansa anunciou seus últimos resultados financeiros do primeiro semestre de 2017 e comemorou, entre outras marcas, o aumento da receita total em 12,7% sobre o mesmo período de 2016, passando para 17 bilhões de euros de janeiro a junho deste ano. O indicador financeiro EBIT, ajustado, quase dobrou em relação aos dois anos, atingindo mais de 1 bilhão de euros, dando ao Grupo Lufthansa o melhor primeiro semestre da história em termos de resultados.
Um dos pilares mais importantes dos bons resultados do grupo alemão é seu staff. Recentemente, fui recebida com exclusividade em Frankfurt, no Lufthansa Aviation Center, o centro administrativo da companhia aérea, por Martina Ahnert, chefe de recrutamento e treinamento do Grupo, para conhecer detalhes da estratégia de empregabilidade da empresa.
“Somos um empregador importante na Alemanha mas, em alguns setores, sofremos concorrência também. Por exemplo, engenheiros para a Lufthansa Technik e profissionais do setor logístico para a Lufthansa Cargo podem também ser atraídos para o setor automobilístico. Por isso, em primeiro lugar, é necessário ser um empregador com atrativo, ou seja, ter uma presença no mercado de trabalho, de tal forma que sejamos percebidos como uma companhia que ofereça estímulos para futuros funcionários. E procuramos escolher os melhores em cada profissão para nosso mercado interno.”
Dentro do total de mais de 124 mil funcionários no Grupo, 20 mil deles são comissários e comissárias de bordo, portanto, essa é a área que mais contrata pessoal para a Lufthansa. A quantidade de pilotos é de cerca de 5.300. Mas, em relação a treinamento corporativo, a Lufthansa Technik, subsidiária de manutenção, reparos e overhaul, é a maior empregadora para diversas profissões e em 2016, contratou sozinha 400 trainees.
“Temos uma variedade imensa de profissões aqui, são 32 programas de treinamento, desde engenheiros e pessoal de vendas até motoristas, nutricionistas e chefes de cozinha da LSG Sky Chefs, nossa subsidiária de catering.” explica Martina.
Aprendizes
Malte Mezger, 20 anos de idade, nascido em Leverkusen, no oeste da Alemanha, é trainee na Lufthansa Technik em Frankfurt. O curso técnico de mecânico se desenvolve em aulas práticas e teóricas, com duração de três anos e meio, com uma prova na metade do curso a partir da qual o aluno opta entre trabalhar com aeronaves de curto (Airbus A320, por exemplo) ou longo alcance (como Airbus A380, A330, A340 e Boeing 747-8) ou se prefere realizar atividades na própria Lufthansa, Lufthansa Cargo ou outras empresas do grupo. A remuneração começa com 850 euros no primeiro ano e, depois, o trainee recebe mais 50 euros por ano.
Cada turma de aprendiz é acompanhada por um mestre. Na turma de Mezger são 45 alunos (apenas três mulheres) divididos entre as áreas de eletrônica e mecânica propriamente dita. “Há um sistema de avaliação durante esses três anos. Depois, há uma contratação automática, que acontece para os melhores alunos, após avaliações dos chefes e dos colegas. Junta-se todos esses pontos e, no final, chega-se a um ranking, onde os primeiros 50% alunos conseguem contrato com a Lufthansa e os outros 50% conseguem contrato com as empresas terceirizadas que trabalham aqui também”, explica Malte. Trabalhar com a própria Lufthansa tem, entre outras vantagens, a oportunidade de voar e o salário é maior.
O entusiasmo de Malte Mezger não diminuiu nem mesmo com o arranhão no braço que, questionado a respeito, ele explicou que “ganhou” quando estava trocando o freio de um A320. Pelo contrário, ele já se encantou com a atividade anos antes quando, ainda na escola, participou de um curto estágio na companhia para conhecer mais de perto a profissão de mecânico. Ficou impressionado com o tamanho da empresa e a movimentação intensa no pátio de aeronaves.
Cativar o elenco
Um visita ao site www.be-lufthansa.com apresenta aos interessados uma diversidade de programas, cursos e visitas vocacionais muito atraente. A chefe de recrutamento Martina Ahnert observa que, se antes a empresa olhava apenas o currículo enviado, hoje, a personalidade e a criatividade do candidato são muito importantes também. Mas, além de atrair trainees, a empresa procura selecionar futuros funcionários por diversas plataformas, inclusive nas mídias sociais como Facebook e Instagram, muito utilizadas pelos jovens hoje em dia, além da participação da empresa em feiras ocupacionais. No caso dos comissários e comissárias de bordo há ainda um conceito novo de recrutamento, o “Casting”, para o qual o convite é feito inclusive por outdoors e folhetos, sendo geralmente realizado fora das bases principais da empresa, que são Frankfurt e Munique.
Em outro prédio do gigantesco complexo da Lufthansa em Frankfurt, fui recebida por Klaus Jacobsen, diretor responsável por gerenciar o elenco de comissários do Grupo Lufthansa por meio do Lufthansa Casting. Ele explicou que a ideia de selecionar candidatos para esses cargos surgiu quando, no ano passado, a demanda por comissários foi muito alta e a companhia aérea percebeu que não conseguiria contratar muitos funcionários em pouco tempo através do sistema padrão, onde a pessoa envia o currículo e depois vem fazer uma entrevista. “Então, surgiu a ideia do Casting, realizado em cidades de interior da Alemanha, cidades importantes, mas menores e fora das grandes bases da empresa. As pessoas podiam se apresentar sem preencher antes a ficha online, podiam simplesmente aparecer no local no dia determinado e passar pela seleção lá mesmo.”
O convite, Klaus explica, foi feito por meio de um marketing agressivo, até mesmo pendurando anúncios em postes de luz das cidades onde já ocorreu, como Heidelberg, Mainz e Augsburg. O clima é mais descontraído e aeromoças que já trabalham na empresa participam conversando com os candidatos.
Perguntado se a demanda por comissários cresceu devido à incorporação de mais aeronaves à frota, especialmente os gigantescos Airbus A380, Klaus Jacobsen revelou que o motivo, na verdade, foi outro. “O atendimento ao cliente passou a ser mais individualizado, o que requeria mais comissários a bordo.”
A cada Casting, geralmente realizado em um hotel ou universidade local, centenas de candidatos, especialmente mulheres, comparecem. A quantidade de atendimentos é limitada, então todos procuram chegar cedo, mesmo quem não preenche todos os requisitos para ser um comissário ou comissária de bordo, relacionados no site da Lufthansa, incluindo alturas mínima e máxima e acuidade visual, não deixam de comparecer. Mas, Klaus explica, um dos itens que mais reprova os candidatos é não falar fluentemente o idioma inglês – o alemão, naturalmente, é o primeiro item obrigatório.
Autenticidade dos candidatos
Alguns candidatos também têm ainda uma ideia muito errada da profissão, uma visão romântica demais. “Em relação ao recrutamento padrão, o que mudou é que os candidatos chegam de forma espontânea, sendo assim, eles têm menos tempo para se preparar previamente, e isso é uma vantagem para a gente, pois, por um lado, a pessoa é mais transparente, verdadeira, e, por outro lado, é bom também para o candidato ou candidata porque não consegue desenvolver uma ideia errada de muitos anos. Ele ou ela é mais autêntico na hora de se candidatar.”
Conversação em inglês, jogos e testes psicológicos e até encarar situações que podem ocorrer a 10 mil metros de altura fazem parte daquelas horas de seleção. Klaus Jacobsen, após vários castings, já coleciona histórias interessantes que presenciou. “Uma vez, um rapaz que tinha acabado de completar o segundo grau, aos vinte anos, justamente no dia anterior, foi ao Casting acompanhado pela mãe e os dois conseguiram passar. “Em outro caso, a mãe apenas acompanhava a filha, levou-a de carro até o hotel, mas resolveu participar também da seleção. No final, a filha não conseguiu ser aprovada, mas a mãe dela, sim!”
No ano passado, três mil candidatos participaram de Castings e exatamente um terço foi aprovado. Incluindo aquelas duas mães, que realmente passaram a trabalhar para a Lufthansa e estão lá até hoje.
(Felipe Lima)