Parece mina de ouro, quanto mais se cava ao fundo e se brita a pedra bruta mais a riqueza aparece, no veio. Cada um tem sua história, cada um tem sua gênese arrancada do seio de uma terra onde explodem as pinhas das araucárias e cataclismam as cachoeiras.
Por Paulo Atzingen *
(Artigo publicado originalmente no dia 11 de junho de 2022)
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Amigas e amigos do Paraná: Passos, Canal, Borges, Rangel e Spada. Vocês têm em comum – e sintetizam – o tempero da terra dos criadores do barreado, do feijão tropeiro, da carne de onça, da vanguarda de um país que ainda está para ter seu banquete maior. Por respirarem a aurora dos pinhais e por terem na retina o espetáculo das cataratas encontram-se para mim acima das convenções e do subliminarmente imposto pelas raças, pelas estatutos e pelos gêneros. Por isso a (o)s chamo assim pelo nome de seus pais tal qual naquele tempo em que as pessoas se olhavam e se reconheciam por seus laços de afeto.
Passos, Canal, Borges, Rangel e Spada. Conheci-os na lavra da palavra, no jardim da infância das letras e, proletário do verbo, trouxe o dialeto da selva de pedra de Piratininga para se juntar ao alvorecer dos seus pinheiros. Analfabeto, trouxe meu riacho do Ipiranga para beber do seu Iguaçu. Trouxe a dureza das avenidas esfumaçadas e de rios mortos pelo esgoto para encontrar as praças abertas de Jaime Lerner, para abrir o peito e respirar a obra imortal da ambientalista Francisca Garfunkel.
Conheci-os na lavra da palavra, no jardim da infância das letras e, proletário do verbo, trouxe o dialeto da selva de pedra de Piratininga para se juntar ao alvorecer dos seus pinheiros.
Amigos do Paraná, esse jeito de falar o leite quente, cantando cada qual com seu modo de expressar o E, imprimem em mim a sua tinta, a sua voz e a sua marca paranaense, o seu estado de espírito, sem a pressa e a indiferença paulistana, o seu estado de alma com a calma mas com a força latente de um lago de Itaipu.
Borges vem de Ubiratã, Canal vem de Foz, Rangel de Ponta Grossa, Passos de Curitiba e Spada nasceu na Alvorada do Iguaçu.
Volto agora para São Paulo, a cidade que com todo o seu concreto, ainda amo. Levo comigo a identidade de cada um que me foi doada em ofertório como símbolo de algo que acostumamos chamar de amizade.
A amizade contida que não sei mais expressar em gestos ou atitudes. Posso atribuir a São Paulo minha insensibilidade em reconhecer a amizade no momento que ela acontece? Não sei. O que sei é que levo para a terra da garoa o cheiro da terra roxa de Ubiratã, a força do choque das águas que despencam nas Cataratas, a embriaguez da taça de pedra de Ponta Grossa, o ar lançado pelas araucárias de Curitiba e a cor de uma manhã em Alvorada do Iguaçu.
Aeroporto de Curitiba, 10 de junho de 2022
“Parece mina de ouro, quanto mais se cava ao fundo e se brita a pedra bruta mais a riqueza aparece, no veio. Cada um tem sua história, cada um tem sua gênese arrancada do seio de uma terra onde explodem as pinhas das araucárias e cataclismam as cachoeiras”.
Apreciei muito a cascata de aliterações desse ‘abre’… rsss. Ezra Pound chamaria esse arranjo de ‘melopéia’… Vivi alguns anos em Ourinhos e Assis – ambas cidades paulistas vizinhas do Norte Pioneiro do Paraná. Chão vermelho, que os oriundi chamavam de ‘terra rossa’… Curtam essa preciosidade de Dino Franco e Biá…. https://www.youtube.com/watch?v=IccpTwlQm1U
Comentei ontem, mas o texto evoporou… rsss. O ‘abre’ da crônica, que reproduzo abaixo, é uma autêntica cascata sonora… com aliterações trepidantes que foralecem a semântica. Erza Pound chamaria o procedimento de ‘melopeia’…
“Parece mina de ouro, quanto mais se cava ao fundo e se brita a pedra bruta mais a riqueza aparece, no veio. Cada um tem sua história, cada um tem sua gênese arrancada do seio de uma terra onde explodem as pinhas das araucárias e cataclismam as cachoeiras”.