por Fábio Steinberg*
Vamos admitir: o modelo de turismo no Brasil nas mãos do Estado deu errado. O Ministério do Turismo, Embratur, e suas demais réplicas caricatas nas esferas estadual e municipal, se fossem empresas privadas, já teriam falido. Em contraste com a estagnação nacional, esta indústria no resto do mundo esbanja dinamismo. Com isto, contribui tanto para a receita dos destinos turísticos, como para o seu próprio desenvolvimento social.
Como mísseis desgovernados sem comunicação com a base, formou-se no país uma rede pública de incompetências. Elas funcionam como verdadeiras usinas de desperdício. Igualadas a xepas de fim de feira, são usadas como troco miúdo nas moedas de troca de negociações políticas.
Dominadas pela incompetência e descompromisso com a coisa pública, ou se livraram, ou sufocaram os talentos que teimam em fazer parte de suas organizações.
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Dominadas pela incompetência e descompromisso com a coisa pública, ou se livraram, ou sufocaram os talentos que teimam em fazer parte de suas organizações. Não se nota nestes organismos qualquer sinal de gestão inteligente. Sem donos, carecem de compromisso com resultados.
A decisão de criar há treze anos atrás um Ministério do Turismo, em moldes que só existem no Brasil, nasceu de um erro de avaliação. A intenção original era dar ao setor um tratamento prioritário. Aquele seria o foro ideal para alavancar políticas públicas capazes de fomentar o turismo, ampliar o diálogo com o trade, e estabelecer um centro de inteligência fornido de dados e informações estratégicas para apoiar um planejamento seguro aos segmentos envolvidos.
Ninguém imaginava que este setor público se tornaria presa fácil de políticos, na maioria oportunistas, em busca de iniciativas de impacto e imediatistas. Esta abordagem é incompatível com a natureza do turismo, que exige investimentos em infraestrutura e visão de longo prazo.
O resultado é o que se vê. Mulas sem cabeça, dão origem a obras iniciadas mas não terminadas, pois perdem importância na primeira troca de guarda entre mandatários. Exemplos não faltam. Para que servem e onde vão parar formulários preenchidos pelos hóspedes no check-in? Falando nisso, cadê o programa de classificação hoteleira que já nasceu inútil, mas que antes de sumir do mapa consumiu tempo e recursos preciosos? E o porto que iam construir no Maranhão? E o Conselho Nacional de Turismo, que até hoje não disse a que veio? E os programas de viagens para aposentados? O que foi feito para atender as cidades turísticas prioritárias?
A burocracia do Ministério do Turismo ganhou vida própria, e traz mais estragos que benefícios. Um recente exemplo foi o que ocorreu com a instituição de ensino HOTEC. Referência em seu campo, desde 2002 tem autorização federal para realizar um curso superior em gestão de turismo, e a partir de 2007, dar ao graduado também um certificado de guia de excursões. Até que, ao desenterrar uma portaria de 2014 que regulamentou a profissão de guia, os ex-alunos da HOTEC começaram a receber e-mails para que devolvessem imediatamente suas carteirinhas de guias. Em um momento que o país luta para alavancar a indústria, não é deste tipo de decisão que o Brasil precisa. Ao contrário, é hora de estimular a formação de guias – até com a inclusão de recursos digitais, como o e-learning.
O Ministério do Turismo é inspiração maléfica para a proliferação de filhotes disfuncionais à sua semelhança, em Estados e municípios. Seria muito melhor estes governos apoiarem empresários locais a criar e manter DMOs (organizações de marketing de destinos, também conhecidos como CVBs – Convention & Visitors Bureau). Até porque este é o modelo que dá certo no mundo inteiro. Esta fórmula faz o turismo contribuir com até 9% do PIB. No Brasil, terra das não-estatísticas, chuta-se à vontade, e os índices estimados variam, dependendo de quem fala, entre 1,5% a 3,5%.
Um episódio que ilustra a gravidade da situação, e que poderia fazer parte do anedotário nacional, ocorreu em junho deste ano. A Academia Brasileira de Eventos e Turismo enviou uma carta à Presidência da República na qual pleiteava a extinção do Ministério de Turismo. Nela, lembrava não só a necessidade de reduzir gastos públicos, mas a falência da relação custo / benefício do modelo atual. Indicava ainda que os países evoluídos em turismo, como França, Inglaterra, Japão, Alemanha e Canadá, dispunham de organismos oficiais voltados ao turismo sob o comando de pastas econômicas. E terminava com o óbvio: exigir dos dirigentes experiência em turismo.
É o primeiro caso oficial no mundo da indicação de uma raposa para tomar conta do galinheiro.
Pois bem: a carta foi enviada ao Palácio do Planalto. O burocrata que a recebeu mal leu o teor e a reenviou sem pestanejar para apreciação do próprio Ministério do Turismo! É o primeiro caso oficial no mundo da indicação de uma raposa para tomar conta do galinheiro.