TEM ALGUM TEMPO que não ando pelo centro de Campina à noite. Logo eu, apaixonado por seu casario sob a iluminação noturna. A última vez de que me recordo, foi de dar uma passada no espetinho do Júnior no Calçadão da Cardoso Vieira, onde o frio da noite e a brisa que subia a Rua Venâncio Neiva não deixava o braseiro morrer. Sentado em um banco, ouvia a conversa de um casal de funcionários de uma farmácia que tinha fechado há pouco. Do outro lado, um pedinte atraído pelo cheiro assado do churrasco, contava com a benevolência de algum cliente para dar uma livrada na fome e, quem sabe, tomar uma dose de aguardente para “esquentar as orelhas”. Isso foi no fim de novembro.
Agora em fevereiro, fui convidado pelo amigo Z’Édmilson para bater um papo com Ari lanches e alguns de seus frequentadores, sem olvidar a passagem para saudar os habituados do Café Aurora, isso na Praça da Bandeira, onde Ari vende lanches nas noites desde 1994. Antes disso, aproveitando o fim de expediente, aproveitei para dar uma passada no escritório do amigo Thélio Farias para dar-lhe um abraço e saber quais eram as últimas de nossa querida Academia de Letras de Campina Grande.
A noite estava fria. A lua nova dava ares mais sombrios e o comércio adormecia. Dos ambientes boêmios, há uns dez anos em que vem fechando gradativamente ou se mudando das áreas mais centrais. Digo dez anos porque é mais ou menos a época em que a lei seca foi estabelecida; e nunca mais fiquei no Chopp do Alemão até 2 ou 3 da manhã.
O restaurante Malibú foi um dos últimos a fechar, esse mais por conta da crise gerada com a peste da covid do que com outra coisa. E o que dizer da varanda do Vila Antiga na Treze de Maio? Sem as noites, só de dia. Fiz questão de andar mais por outras ruas e me espantei com o deserto que encontrava. Nenhuma cortesã na Rua João Pessoa nem na João Suassuna! Como pode? Pensei nesse lugar despovoado.
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Para além dos bares, a ausência de aulas em janeiro poderia ser um motivo, mas cheguei à conclusão ser um conjunto maior de fatores e, depois de deixar meu amigo Edmilson em sua residência no bairro das Nações, resolvi voltar para meu Bodocongó pegando a avenida Manoel Tavares, um corredor gastronômico com restaurantes dos mais destacados e tradicionais da cidade como por exemplo Recanto do Picuí, Tábua de Carne e a Cantina de Seu Manoel (da carne de sol). Além do mais, uma série de restaurantes mais novos e lanchonetes tem atraído a juventude. O movimento era intenso.
Cá com meus botões, será que Campina já está tomando o rumo de muitas capitais brasileiras, abandonando seu centro antigo e buscando novos ares para viver sua modernidade? Vemos bairros periféricos cada vez mais movimentados com verdadeiros largos gastronômicos como av. Juscelino Kubistchek (do Cruzeiro ao Velame), Odon Bezerra (Liberdade e Tambor), Campos Sales (Zé Pinheiro), Vigário Calixto (Catolé), algumas ruas no bairro das Malvinas, Bodocongó, Santa Rosa, Cruzeiro, conjunto Aluísio Campos, Portal Campina, cada uma respeitando a realidade financeira dos habitantes daquelas cercanias.
Essa possibilidade realmente existe. Vi João Pessoa correr rumando a Tambaú e Cabo Branco. Já no Rio de Janeiro, da mesma maneira, pude ver a boemia transpondo os arcos da Lapa indo se arranchar em Copacabana e Ipanema. Recife, São Luiz, Salvador da mesma maneira, seus casarões foram abandonados para se construir uma história longe dali. Feliz é saber que em algumas delas haja um movimento contrário, só que essa requalificação não tem sido bem feita, é preciso dar vida aos casarões históricos e isso não se dá com uma demanda de cal, mas sim criando atividades, envolvendo a comunidade e atraindo empresas, grupos culturais, movimento, vida.
Estranhando esse vazio noturno, ainda no escritório de Thélio, conversamos brevemente sobre a queda de liquidez atual em Campina Grande muito por conta da empresa de criptomoedas aqui instalada deixando um rombo financeiro enorme, prejuízo que foi bem democrático, pois atingiu quem investiu milhões, mas também aquele pequeno comerciante ou autônomo que empenhou ali seus cinco ou dez mil reais. Essa situação foi responsável pelo fechamento de vários empreendimentos e a ausência de qualquer investimento. Toda essa situação tem modificado sensivelmente a economia da cidade e os reflexos são inúmeros.
Uma rua como a João Pessoa, empório comercial da cidade, estar com alguns prédios fechados, é algo muito forte e preocupante. Mas Campina sempre soube se reinventar. O acréscimo na quantidade de voos é significativo, já soube que a rede hoteleira está com mais de 70% fechada com operadoras para as festas de São João. E aí? É “sentar em cima” da nossa maior festa e estruturar o nosso turismo; patrimônio e atrações já temos.
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Publicado originalmente no Jornal A União em 2 de março de 2024, texto gentilmente concedido ao DIÁRIO para publicação.
*Thomas Bruno Oliveira é Historiador, Jornalista e Escritor. Mestre em História, Cronista do Jornal A União, Colunista da Revista de Turismo; integra vários Institutos Históricos, a Academia de Letras de Campina Grande.