Nas Asas da Panair é como ficou conhecida a canção, de 1974, de Milton Nascimento e Fernando Brant, que tinha os títulos Saudade dos aviões da Panair e Conversando no bar, interpretada por Elis Regina.
“Cerveja que tomo hoje é//Apenas em memória dos tempos da Panair//A primeira Coca-cola foi//Me lembro bem agora, nas asas da Panair//A maior das maravilhas foi//Voando sobre o mundo nas asas da Panair”.
EDIÇÃO DO DIÁRIO com agências
Nas Asas da Panair é também o título da exposição que o Museu Histórico Nacional [MHN], no Rio de Janeiro, inaugura em 11 de julho, às 11h30, sob curadoria da historiadora Mariza Soares.
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A mostra apresenta itens da coleção criada em 2017 como resultado de uma parceira entre a empresa Panair do Brasil e a Família Panair, uma associação que reúne antigos funcionários da companhia. Ao longo de um ano foram coletados quase 700 peças, entre objetos e material de divulgação impresso.
Em 10 de fevereiro de 1965, a Panair do Brasil teve suspensas todas as suas concessões de voo, por um despacho do Presidente da República Marechal Castello Branco. A alegação, provadamente inverídica, foi a de que a situação financeira da empresa era irrecuperável. Sem poder operar, a companhia dispensou os funcionários, mas a saúde financeira da companhia permitiu que todos fossem indenizados.
No ano seguinte, ainda sob o choque do desmonte da empresa, foi criada a Família Panair. Desde 1966, o grupo se encontra uma vez por ano para preservar a memória da companhia e a amizade entre eles.
A ideia de criar uma coleção com itens que cada um guardava dos tempos dos voos surgiu, em 2016, na celebração dos 50 anos da Família Panair.
Quase todos contribuíram com folhetos, medalhas comemorativas, uniformes, adereços, louça, maletas de mão, brindes, fotografias, fitas e CDs com entrevistas, outros tipos de documentos e pequenos luxos, como protetor de caneta tinteiro, guardanapo de linho e talher de prata dos “tempos da Panair”. Alguns objetos foram adquiridos nos leilões de liquidação da empresa.
Crônica de Drummond
A propósito dos leilões, Carlos Drummond de Andrade escreveu uma crônica, publicada no Jornal do Brasil em outubro de 1969:
[…] E ninguém ali sentia nada de especial diante do corpo derrotado na Panair, de seus intestinos à mostra. Quase todos teriam usado suas linhas, comido seus jantares, lido seus jornais brasileiros em Paris, mas a hora era de liquidação, e não de saudades. […]
Desde sua concepção inicial, foi prevista a doação da coleção ao Museu Histórico Nacional. Durante dois anos, Rodolfo da Rocha Miranda, diretor-presidente da Panair do Brasil, coordenou a coleta da memorabilia, que foi, concomitantemente, organizada por historiadores e museólogos.
Todos os colaboradores tiveram os itens doados cadastrados e fotografados. A Panair do Brasil financiou a construção da coleção e esta exposição como uma homenagem a seus funcionários, familiares e todos os que, ao longo dos últimos cinquenta anos, contribuíram para manter viva a memória da empresa e daqueles que contribuíram com ela.
Exposição
A historiadora Mariza Soares explica sua curadoria: “Para esta mostra foram selecionados os itens que atestam a modernidade da empresa e seu alto padrão de funcionamento, então conhecido como ‘padrão Panair’. Mas mais que isso a coleção atesta a determinação da Família Panair de preencher o vazio que o fechamento da empresa deixou em suas vidas”.
“Os doadores, antigos funcionários e seus familiares, o fizeram na certeza de que ao ceder suas relíquias pessoais a uma instituição como o Museu Histórico Nacional abrem mão delas para criar uma coleção coletiva que irá sobreviver a todos e prolongar a memória da empresa e de seus funcionários”, argumenta Mariza Soares.
O conjunto da mostra ilustra o conceito curatorial de modernidade e alta qualidade com cerca de 300 artigos: vestuário da tripulação – uniforme e adereços, serviço de bordo – louça [porcelana Rosenthal], faqueiro de prata [Eberle e Fracalanza], brindes – chaveiro, cinzeiro, baralho, caneta, estojos de toalete, de costura e de correspondência, fotos pessoais e documentais garimpadas na Biblioteca Nacional e no Arquivo Nacional, e matérias de jornal, principalmente da época do fechamento da Panair. Há uma vasta seleção de peças gráficas promocionais de roteiros nacionais e internacionais, folhinhas, menus de bordo, encarte para passagens e outros materiais de folheteria.
Sobre a Panair
Há exatos 90 anos, em 1929, surgia no Brasil uma subsidiária da americana Nyrba [Nova York–Rio-Buenos Aires] que, no ano seguinte, incorporada pela Pan American, passou a se chamar Panair. Foi a principal companhia aérea do país. Em 1961, com a entrada dos empresários Celso da Rocha Miranda [1917-1986] e Mario Wallace Simonsen [1909-1965] a Panair teve seu longo processo de nacionalização concluído. O carioca Rocha Miranda tinha a maior corretora de seguros da América do Sul; o paulista Simonsen era o maior exportador de café do país, dono da TV Excelsior e de mais dezenas de empresas.
Era a Panair que, nos anos 1930 atendia a Amazônia, promovendo a integração da região com o resto do país. Com seus hidroaviões, levava carga e remédios e transportava doentes.
A Panair do Brasil se tornou a segunda maior companhia aérea do mundo. Foi a primeira estrangeira e pousar no aeroporto de Heathrow em Londres, quando a pista ainda era de terra. Voava para capitais da América do Sul, Europa e Beirute, Cairo, Istambul, Dacar, entre outras.
A excelência de atendimento nos voos e em terra mundo afora e do design de suas peças gráficas, da louça de bordo, dos uniformes e brindes rendeu-lhe a expressão “padrão Panair” para designar qualquer coisa que fosse de alta qualidade fora do âmbito da aviação, tal como se usou décadas depois o Padrão Globo de qualidade”.
Canção do Milton Nascimento
A canção de Milton Nascimento e Fernando Brant tinha o título “Saudade dos aviões da Panair”. A empresa fora fechada pelo governo militar e, por precaução, os autores criaram um segundo título “Conversando no bar”.
Em 2005, o jornalista paulista Daniel Leb Sasaki, então com 23 anos, publicou o livro “Pouso forçado”, relançado em 2015 em edição muito ampliada, depois da Lei de Acesso à Informação e da Comissão Nacional da Verdade, que propiciaram ao autor acesso a material inédito. A primeira edição foi indicada ao Prêmio Jabuti.
O cineasta Marco Altberg lançou, em 2007, o documentário “Nas Asas da Panair- uma história de glamour e conspiração”, que narra a história da companhia através de depoimentos de ex-funcionários, dos familiares do seu presidente, Paulo de Oliveira Sampaio, dos acionistas Rocha Miranda e Simonsen e ex-passageiros como Eduardo Suplicy, Norma Benguell, Milton Nascimento e Fernando Brant.
Foi em um voo da Panair que, conta Brant, ele tomou a primeira coca-cola da sua vida e o menino Milton, segundo ele próprio, era convidado a visitar a cabine de comando quando viajava com os pais.
As imagens de arquivo incluem um segmento do filme “Um só Pecado [La Peau Douce]”, de 1964, de François Truffaut, em que o editor interpretado por Jean Desailly viaja pela Panair.
MHN e a Coleção Panair
Esta coleção é a primeira sobre uma empresa que o Museu Histórico Nacional incorpora. A inovação decorre principalmente do fato de ela ser constituída por doação e participação de ex-funcionários da empresa e familiares em colaboração com a equipe do MHN.
“A companhia de aviação Panair é o símbolo de uma época do Brasil quando a viagem de avião representava um ideal de vida moderna. O contato direto com as peças da coleção aproxima todos da história de modo sensível”, fundamenta o diretor do MHN Paulo Knauss.
Serviço
Exposição “Nas Asas da Panair”
Período 11 de julho a 29 de setembro de 2019
Museu Histórico Nacional – Praça Marechal Âncora S/N
Centro Rio de Janeiro, RJ
Visitação terça a sexta, 10h às 17h30; sábado, domingo e feriado, 13h às 17h
Ingressos R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia). Entrada gratuita aos domingos
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Informações (21) 3299 0324 (recepção)