Vacinação da população, sobrevivência de pequenas empresas, manutenção de empregos, ajuda do governo, resiliência e renovação serão temas centrais para o turismo
POR ZAQUEU RODRIGUES – Especial para o DIÁRIO
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PAULO ATZINGEN (edição)
De acordo com a Organização Mundial do Turismo (OMT), 2020 foi o pior ano da história do turismo internacional. A entidade avalia que o setor retrocedeu a níveis de 1990. De janeiro a outubro de 2020 o setor perdeu 900 milhões de viajantes em comparação com o mesmo período de 2019. A OMT avisa que a recuperação do setor, mesmo após a vacinação da população, encontrará um longo caminho pela frente.
De março a dezembro de 2020 o turismo brasileiro amargou um prejuízo de R$ 261,3 bilhões de reais. É o que estima a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Para Fábio Bentes, economista da CNC, o turismo brasileiro só deverá retomar os níveis de receitas pré-pandemia no segundo semestre de 2022.
As expectativas positivas para o começo de 2021 foram derretidas por uma nova escalada de contaminação do vírus no país. Neste mês o Brasil já ultrapassou a marca de 200 mil mortes causadas pela pandemia de coronavírus. Enquanto não começa a vacinar a população, as perdas do setor devem alcançar patamares ainda mais dramáticos, já que muitos estados começam a aumentar as restrições de deslocamentos.
Em meio a um cenário delineado por incertezas, o turismo brasileiro pode esperar o quê de 2021? A professora de turismo da USP e presidente do Conselho de Turismo da FecomercioSP, Mariana Aldrigui, afirma que a adesão maciça da população à vacina será determinante para a recuperação do setor. E projeta: “infelizmente, com a postura do governo federal e a inação que se viu ao longo de 2020, as perspectivas são muito pessimistas”.
Neste momento, prossegue Aldrigui, é fundamental “investir em mapeamento de produtos e serviços que possam atender à demanda [de viagens] de curta distância (até 300km), valorizando percursos em carro, próprio ou alugado”. Entre as prioridades estão a sobrevivência de pequenos e médios negócios e a geração de empregos para as pessoas que ficaram desamparadas pelo auxílio emergencial do governo federal.
Quedas e demissões
Os pequenos e médios negócios foram os mais impactados pela pandemia. Segundo a CNC, 49,9 mil empresas de turismo fecharam as portas no país de março a agosto de 2020. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) revelam que o setor demitiu 437,9 mil profissionais de março a novembro de 2020, o que representa uma queda de 12,5% na força de trabalho do setor.
A travessia desse período requer união de profissionais e entidades representativas da cadeia de turismo, aponta o presidente da Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa), Roberto Nedelciu. Ele sublinha que a pandemia arrancou a todos da zona de conforto e “colocou à prova a nossa capacidade de resiliência, foco, jogo de cintura e estratégias certeiras. Aprendemos que dependemos uns dos outros”.
Nedelciu avalia que a pandemia trouxe muitos aprendizados para o turismo. “Destaco a coalização de entidades em diversos projetos cujos objetivos se fundem no mesmo caminho: conquistar o melhor para a sustentabilidade e retomada do setor. Precisamos estar mais conectados do que nunca para vencer essa batalha contra a covid-19. O setor de turismo criou e instaurou uma série de protocolos de saúde e precisamos da adesão irrestrita dos viajantes”.
Nedelciu pontua que, em 2021, também será muito importante “a criatividade, a flexibilidade e o alto poder de customização das operadoras para a criação de novos produtos com o intuito de manter nas vitrines opções diferenciadas para todos os perfis de viajantes. As palavras-chave de 2021 são responsabilidade, conscientização, união e trabalho duro”, afirma o presidente da Braztoa”.
Muito trabalho em 2021
O fundador da CVC e da GJP Hotels & Resorts, Guilherme Paulus, se mostra otimista. “O setor de turismo já passou por grandes altos e baixos em diversos períodos, mas a capacidade do segmento em se reinventar é muito grande”. Ele diz que as empresas precisam cuidar neste momento de seus bens mais precisos: os clientes. “A vacina vem aí e teremos muito trabalho pela frente em 2021, com uma excelente temporada de vendas para todos”.
A empatia é um dos grandes aprendizados desse período, considera Paulus. “Sem dúvida uma das grandes lições que devem se perpetuar após esse período. O exemplo de doações das mais diversas áreas e em proporções também jamais vistas no nosso cotidiano mostra que é possível estarmos conectados de uma forma ainda mais completa”.
O turismo não é para amadores
Para a diretora-executiva da Brazilian Luxury Travel Association (BLTA), Simone Scorsato, o Brasil entrou em 2021 a alguns passos atrás na corrida pela retomada econômica do setor ao demorar a apresentar um plano de vacinação. A ausência de estratégias contra a expansão da covid-19 no país prejudicou o destino Brasil. “Temos que trabalhar muito a imagem do Brasil no mercado internacional”, ela avalia.
Scorsato afirma que o turismo aprendeu mais sobre resiliência e sustentabilidade durante o enfrentamento da pandemia. Segundo ela, os empreendimentos que atuavam de uma forma não sustentável, econômica e socialmente, foram os mais impactados. “O turismo não é para amadores. É uma atividade que demanda conhecimento, técnica, inovação”.
A implantação de uma política de saúde pública em território nacional, promovendo a vacinação para todos, é prioridade, considera Scorsato. “Em 2020 vivemos a pandemia de uma forma global. Em 2021 a gente vai ver um cenário onde alguns países já avançam no processo de imunização da sua população, e, consequentemente, o turismo vai começar a andar a passos mais largos em destinos que já tenham uma campanha de imunização e estratégias seguras para receber visitantes estrangeiro”.
Sobrevivência
Presidente da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação (FBHA), Alexandre Sampaio destaca que “sem vacinação, não há recuperação” para o turismo. “O recrudescimento da covid-19 fez as reservas de final de ano despencarem. Agora não vai haver recuperação, e sim sobrevivência”, constata ele, que considera essencial o governo federal estender a lei 14.020, que permitiu às empresas fazer acordo de redução de jornada de trabalho e de salários e de suspensão de contratos.
Alexandre afirma que, em 2021, será necessário muita negociação, diálogo, calma e maturidade. “Uma coisa eu já adianto. Os protocolos de biossegurança, como uso de máscara, álcool gel e distanciamento social, vão continuar. O processo de vacinação vai demorar muito, dado o tamanho do país. Diante disso, o que se apresenta é um quadro tênue e de débil recuperação. Não tem retomada. A intenção das pessoas de viajar e a demanda reprimida existem, mas há a preocupação com a saúde. A minha projeção para uma situação mais estável é no verão de 2022. Só então veremos uma luz no fim do túnel”.