A ilha emergirá reino

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A faixa de areia neste lado da ilha terá uns quinhentos e vinte e seis metros de comprimento. A largura será impossível precisar porque o mar irá e voltará indefinidamente obedecendo a pulsação do planeta.

por Paulo Atzingen (Texto originalmente publicado na página Atzingen.com.br)


À esta faixa de areia se erguerá várias fileiras de coqueiros e suas cabeleiras verdes e seus corpos esbeltos dançarão ao sabor de um vento aloprado que virá do alto, da frente e de todos os lados.

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No primeiro dia a ilha parecerá nascida das futuras histórias fantásticas de ficção que ouviremos dos nossos pais quando esses ainda possuírem memória. Tempo em que as pessoas não andarão corcundas olhando para o próprio mundo digital.

Quando os navegadores chegarem no segundo dia e antes mesmo de colocarem suas botas aqui, darão um mergulho nessa água transparente para só depois, irem descobrir o resto do Novo Mundo.

As lanchas que chegarão à ilha no terceiro dia virão apinhadas de índios modernos equipados com telefones que tiram fotos. Eles absorverão tudo o que lhes remeta ao passado: ar puro em movimento, cores brancas da areia, cores verdes dos coqueiros e o extravagante azul turquesa do mar, e com um detalhe: “de graça”.

Arrancarão da água a sensação tátil do banho e do sal a preservação da carne sob o sol do trópico.

Quando as lanchas dos índios modernos tocarem a areia reconectarão o fluxo da história que terá início quando os reis de Espanha e Portugal sentirem inveja um do outro, ou ciúme, ou ódio, não sei ao certo.

O que sei é que no quarto dia ao caminharem pela praia esses índios modernos catarão estrelas do mar e corais.  As estrelas terão o formato das bolas de hélio que estão sendo espalhadas no céu de noite. Essas estrelas da areia projetarão o design universal em uma transmissão via satélite imperceptível, inexplicável, quântica.

São menores porque são criaturas espelhadas no design original, mas refletem a grandeza com suas cinco mil pontas.

Já os corais têm forma espiralada que catapulta os índios modernos à inevitável rotação do planeta, que, por sua vez, regulará o fluxo e o tempo das marés. Ao colocarem o ouvido nesses corais escutarão o mar longínquo lá longe, no início dos milênios.

Quando os índios mais civilizados descerem à ilha, no quinto dia, trarão consigo uma carga de civilização neutra, nem boa, nem ruim, nem rica, nem pobre – uma civilização que se existisse, – como existirá – ou deixasse de existir – como não deixará – pouco impactaria na emersão da ilha. As toneladas de lixo inorgânico que os índios mais civilizados deixarão por onde passarem serão transformados em pó com a fotossíntese do tempo. Tanto faz se eles sujarem, tanto faz se eles pecarem, tanto faz se eles subornarem, roubarem ou matarem, a ilha emergirá. 

Mesmo que os índios mais que civilizados construam casas, pontes, aeroportos, fábricas, linhas de trem, rodovias, prédios, shoppings, hidrelétricas, usinas atômicas e naves espaciais, mesmo que dentre os índios mais civilizados, no sexto dia, venham os índios ultra-civilizados da civilização da grande ilha do norte, a ilha emergirá.

A ilha emergirá no sétimo dia e junto com ela uma barreira de corais, uma fileira de coqueiros e um mundo novo todo para ser refeito e pessoas novas todas prontas para serem refeitas emergirão. 

A ilha emergirá.

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