As criptomoedas e seus reflexos no ordenamento jurídico brasileiro

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*por Eduardo Ferraz Guerra, Advogado e Sócio Fundador do Escritório Guerra Batista Advogados.

*Felipe Naim El Assy, Advogado Associado do Escritório Guerra Batista Advogados.

 

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Diante do advento da internet na atual sociedade pós-moderna, e com o aumento da velocidade na circulação das informações de diversas naturezas, muitos hábitos e práticas sociais acabaram modificando-se em prol de uma maior facilidade nas relações tanto pessoais como comerciais e profissionais.

 

A relação da sociedade com o dinheiro não é diferente, isto pelo fato perceptível das diversas modificações que este item sofreu ao longo da história, saindo do esquema convencional do escambo, passando posteriormente para as moedas cunhadas de forma manual, depois para as cédulas e moedas produzidas de forma mecânica, e hoje com as moedas digitais conhecidas também como “criptomoedas”.

 

Desta forma, para que seja possível compreender esta nova modalidade de circulação de riqueza, é necessário elucidar alguns pontos, tais como sistemas envolvidos e forma de transferência e produção desta moeda.

 

Primeiramente, para melhor elucidação deste novo tema, cumpre esclarecer que todas as operações envolvendo a circulação de criptomoedas são registradas na plataforma Blockchain, sendo esta a rede que contém todos os registros de transações, e que possui duas características principais, pode ser auditada por qualquer pessoa e é praticamente inviolável.

Neste sentido, a dúvida mais latente é como são criadas estas moedas, ou como é realizada a materialização da moeda e as transações desta

 

Neste sentido, a dúvida mais latente é como são criadas estas moedas, ou como é realizada a materialização da moeda e as transações desta. Este processo é chamado de Mineração, ou seja, é a realização do registro da moeda no blockchain pelo operador denominado como Minerador, este responsável por garantir a autenticidade das informações e também atualizar as respectivas informações.

 

Ademais, para a realização de envio e recebimento destas moedas digitais, é necessário o “Wallet”, ou seja, uma carteira digital para criptomoedas, inclusive diante do fato da receptividade de comerciantes e prestadores de serviço a este novo modelo de pagamento, situação de adaptação esta já vivenciada pelas operadoras de cartão de crédito.

 

Portanto, diante desta cadeia sistêmica que confere a possibilidade de existência e transferências envolvendo estas moedas não físicas, faz-se totalmente necessária a regulamentação destas operações, tendo em vista que estas acabam por influenciar e trazer reflexos nas relações jurídicas dos cidadãos, tanto em matéria cível e tributária, como também penal.

 

Assim, no que tange à normatização brasileira do sistema de utilização das criptomoedas, é possível verificar que a Lei nº 12.965 de 2014, mais conhecida como Lei do Marco Civil da Internet, busca materializar o princípio constitucional da livre iniciativa no uso da internet, o que de fato confere a liberdade e legalidade deste novo instituto.

 

Neste sentido, busca-se também constituir como princípio a liberdade dos modelos de negócio promovidos na internet. Deste modo, se identifica a possibilidade legal da instituição dos negócios envolvendo o uso das criptomoedas, e assim vislumbrando-se a previsão e reconhecimento do Poder Legislativo quanto aos negócios desenvolvidos sob o crivo tecnológico do sistema informático da internet.

 

Ademais, as implicações relativas à matéria tributária envolvendo as moedas digitais começaram a ser considerados pela Receita Federal, que em seu recente posicionamento em relação ao Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), orienta o contribuinte a realizar a declaração dos respectivos valores de aquisição, realizando esta através da ficha de “bens e direitos”, categorizado como “outros bens”.

 

Desta forma, a Administração Tributária Brasileira vem compreendendo também que os ganhos obtidos com a alienação de moedas virtuais, sendo o montante total mensal superior a R$ 35 mil reais, este deve ser tributado a título de ganho de capital, calculando-se o tributo devido sob uma alíquota de 15%.

 

Diante destes novos entendimentos, a Receita Federal do Brasil acabou publicar a Instrução Normativa nº 1.888/2.019, que institui e disciplina a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações realizadas com criptoativos. Deste modo, busca-se estabelecer o modo e quem deve prestar estas informações, o portal eletrônico a ser utilizado, além da cominação de multas por prestações extemporâneas.

 

Essas novas obrigações, no entanto, acabam por ser de extrema importância, pois além dos reflexos tributários, a normatização acaba por corroborar para a fiscalização das operações para a identificação de possíveis ilícitos que possam ser cometidos com o uso das moedas digitais, perante a falta de bases jurídicas e fiscalizatórias sólidas.

 

Neste sentido, observa-se que o Projeto de Lei nº 2.303/2.015 busca a inclusão das moedas virtuais na definição de “arranjos de pagamento” sob a supervisão do Banco Central, além de acrescentar as operações de criptomoedas no rol das transações que devem ser informadas ao COAF ou órgão administrativo fiscalizador/regulador para o combate ao crime de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores.

 

No mais, para que seja possível elucidar a falta de diretrizes regulatórias e de fiscalização das moedas digitais envolvendo sua transferência e utilização inclusive no mercado financeiro, a Comissão De Valores Mobiliários (CVM) expediu em janeiro de 2018 o Ofício Circular nº 1/2018/CVM/SIN, em que se interpreta que as criptomoedas não podem ser qualificadas como ativos financeiros, sendo considerado que sua aquisição direta pelos fundos de investimento devidamente regulados, não é permitida.

A Comissão De Valores Mobiliários (CVM) expediu em janeiro de 2018 o Ofício Circular nº 1/2018/CVM/SIN, em que se interpreta que as criptomoedas não podem ser qualificadas como ativos financeiros

 

Assim, perante todas as informações elencadas no presente texto, é possível identificar de maneira cristalina as novas necessidades e as consequentes lacunas legislativas existentes no século XXI, e também as dificuldades nítidas em regulamentar este novo instituto tecnológico envolvido em novas relações e negócios jurídicos, que passam a ter uma complexibilidade maior do que as que os juristas estão acostumados.

 

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