WhatsApp impõe novas regras! Advogada Patrícia Peck esclarece dúvidas

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A Advogada especialista em Direito Digital e Proteção de Dados, sócia do PG Advogados, Patrícia Peck faz uma análise da mudança da Política do Whatsapp, que entra em vigor neste sábado, 15 de maio. Acompanhe a entrevista abaixo:

Por que a mudança da Política do WhatsApp está causando tanto alvoroço no mundo?

PATRÍCIA PECK: O WhatsApp exerce em muitos países posição dominante de mercado. Sendo assim, temos que analisar a situação não apenas sob a ótica da regulamentação de proteção de dados, mas também sob o aspecto do direito concorrencial e das proteções do consumidor. A partir do momento que há uma mudança das regras de maneira unilateral, não há tempo hábil para que seus clientes, sejam pessoas jurídicas ou físicas busquem alternativas. Logo, é uma situação que acaba exigindo a análise por parte das autoridades para evitar abusos. Além disso, as mudanças trazidas, mesmo que possam gerar benefícios, precisam de uma ampla campanha orientativa (educativa). Hoje há toda uma discussão sobre o modelo de “Data Ethics” da empresa. E no caso do WhatsApp e do Facebook, devido ao histórico acumulado de casos recentes, a desconfiança gerada pela falta de transparência e a aplicação de multas em muitos países provoca insegurança e incerteza.

O que acontece a partir de 15/05?

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PATRÍCIA PECK: Em princípio, quem não aceitar os novos termos da Política de Privacidade ficará com o aplicativo bloqueado. Não será possível enviar novas mensagens. Porém, devido à pressão dos usuários em vários países, como a Índia, houve declarações recentes do aplicativo de que aqueles que ainda não tiveram a chance de aceitar a atualização não terão suas contas apagadas ou perderão a funcionalidade imediatamente no dia 15 de maio. O WhatsApp afirmou, entretanto, que os usuários não poderão usar alguns recursos do aplicativo até aceitar a atualização, como exemplo não conseguirão acessar sua lista de bate-papo, por exemplo, mas ainda serão capazes de atender chamadas e videochamadas. Ao final de algumas semanas de tolerância, com a funcionalidade limitada, o WhatsApp informou que vai interromper o envio de chamadas e mensagens.

Neste mesmo período foi enviado um documento ao WhatsApp elaborado por autoridades brasileiras Senacon, Cade, MPF, ANPD recomendando que o WhatsApp não restrinja funcionalidades do aplicativo caso as pessoas não concordem com a nova política. As autoridades pediram também que o Facebook não utilize dados obtidos a partir da plataforma de mensagens enquanto não houver o posicionamento dos órgãos reguladores.

Qual o motivo da mudança?

PATRÍCIA PECK: As mudanças ocorrem pela transformação do WhatsApp em uma plataforma comercial. No dia 15/02 foi anunciada uma versão do aplicativo com recursos do carrinho de compras, com o qual o usuário pode selecionar diversos serviços e fazer um pedido por mensagem pelo WhatsApp, durante uma conversa com empresas. WhatsApp também está implementando meios de pagamento diretamente pela ferramenta.

Quem será mais afetado com as mudanças

PATRÍCIA PECK: Usuários que trocam mensagens com empresas (WhatsApp Business) que utilizam um provedor de serviço terceirizado para gerenciar a comunicação com os clientes pelo WhatsApp. O Facebook é um dos provedores de serviço terceirizados que as empresas podem contratar.

O que muda para o usuário e para a empresa que utiliza um provedor de serviço terceiro para gerenciar a comunicação com os clientes pelo WhatsApp?

PATRÍCIA PECK: Em geral, para o usuário que não se relaciona com contas comerciais não há muitas mudanças. No entanto, lendo atentamente a nova política de privacidade o novo texto indica a coleta de informações que não estavam presentes na versão anterior tais como carga da bateria, operadora de celular, força do sinal da operadora e identificadores do Facebook, Messenger e Instagram que permitem cruzar dados de um mesmo usuário nas três plataformas. A empresa afirma que todas as mensagens – de texto, áudio, vídeo e imagens – são criptografadas de ponta a ponta, o que significa que somente o remetente e destinatário podem ver a mensagem. E que não mantém registros sobre com quem os usuários estão conversando e que não compartilha listas de contatos com o Facebook.

Já para usuário que interage com contas comerciais que utilizam os mencionados recursos terá mais impactos:

a) Criptografia ponta a ponta: As conversas com empresas que utilizam um provedor de serviço terceiro (inclusive o Facebook) para gerenciar as conversas deixarão de ser criptografadas. As conversas entre usuários comuns permanecerão protegidas com a criptografia ponta a ponta.

b) Compartilhamento de dados: Para que as automatizações nas conversas entre empresas e usuários pelo WhatsApp funcione, esses provedores de serviço terceiros precisam receber as informações, as quais não podem estar criptografadas. O Facebook informa que, para os casos em que atuar como provedor de serviço, não utilizará estas informações para finalidades de marketing ou qualquer outra que não seja o processamento necessário para oferecer os serviços de gerenciamento das conversas. O usuário não precisa ter uma conta no Facebook para que suas informações sejam compartilhadas e armazenadas por eles.

Logo, a nova política de privacidade, deixa de garantir a proteção da criptografia em conversas com contas comerciais. Quando analisamos na ótica de um lojista onde um atendente fale com um usuário sobre uma compra os dados pessoais trocados podem não ser tão sensíveis como se for o caso de um laboratório, hospital ou ainda uma clínica médica, cujos dados pessoais compartilhados são de saúde, ainda mais com o aumento da prática de telemedicina/teleatendimento devido à pandemia. Hoje é comum estas interações por contas comerciais e inclusive com uso de bots. O mesmo com relacionamento com Bancos Digitais, entre outros. Aí o nível de risco é maior, bem como de não estar em conformidade tanto com regulamentação de proteção de dados como também regulamentações setorizadas. E isso não afeta apenas o WhatsApp como também a empresa contratante do serviço de conta comercial em termos de compliance.

Quais informações serão compartilhadas com os provedores de serviço terceirizado, incluindo o Facebook?

PATRÍCIA PECK: O WhatsApp não informa com exatidão quais são todos os dados que compartilha com os provedores de serviço terceirizado, mas apresenta uma lista de todas as categorias de dados que armazena de seus usuários:

a) Dados fornecidos diretamente pelo usuário: número do telefone celular, nome perfil escolhido, mensagens trocadas e criptografadas, contatos da agenda dados de status, dados de transação e pagamentos;

b) Dados que coleta automaticamente: dados de uso e registro como tempo e frequência, modelo do dispositivo, rede móvel endereço IP, e identificadores exclusivos para produtos das Empresas Facebook associados ao dispositivo ou conta, dados de localização, cookies, dentre outros).

Os dados podem ser compartilhados pelo WhatsApp para outras empresas e para finalidades não relacionadas aos provedores de serviço terceirizados para gerenciamento de conversas (tal como o Facebook)?

Peck: Sim, e isso já acontecia antes de ser anunciada a nova Política de Privacidade: Compartilhar os dados com Operadores (seus fornecedores de serviços). O WhatsApp informa que pode transmitir os dados dos usuários para os Operadores (seus fornecedores), que realizam a atividade de tratamento dos dados pessoais conforme às suas orientações.

Dentre os Operadores do WhatsApp estão as Empresas do Facebook, que são contratadas para operar, executar, aprimorar, entender, personalizar, dar suporte e anunciar seus serviços. Para realizar tais atividades os dados podem ser armazenados pelas empresas, inclusive o Facebook.

Essas empresas podem também fornecer dados dos usuários para o WhatsApp sob determinadas circunstâncias, por exemplo, as lojas de aplicativos podem enviar relatórios para ajudar o WhatsApp a diagnosticar e corrigir problemas no serviço.

Mudanças de acordo com a legislação?

PATRÍCIA PECK: A forma como os usuários são abordados pelo aplicativo para que aceitem os termos (com checbox pré marcados), e a redação confusa da própria Política de Privacidade, aliado aos problemas reputacionais da sua controladora (Facebook), pode levantar a bandeira vermelha do atendimento ao Princípio da Transparência da LGPD e dos requisitos para um consentimento válido, vez que muitos usuários não o concederam livremente, tampouco tinham sido devidamente informados sobre os impactos.

Caberá ao WhatsApp e ao Facebook demonstrar a conformidade com à LGPD, em especial artigos 6, 7, 10, 11, 14, 18, 42, 44, 46, 47, 48, 49.

Sabemos que não existe almoço grátis, e que as aplicações de internet podem apresentar claramente os motivos pelos quais o tratamento de dados é requisito para o fornecimento do produto/serviço, artigo 9, § 3º da LGPD com artigo 18 inciso VIII. Mas condicionar o uso do serviço ao compartilhamento com terceiros e com o consentimento completo (irrestrito) retirando os atributos de que precisa ser manifestado de forma livre (não compulsória) para finalidades que são comerciais, já poderia ser entendido como prática abusiva, considerando exercício de posição dominante de mercado. Novamente, considerando uma grande preocupação com o contexto de transparência e de segurança que vivemos atualmente e com maior responsabilização trazida pelas novas leis.


Patricia Peck, PhD. Advogada especialista em Direito Digital e Proteção de Dados, sócia PG Advogados.

 

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