Ideias, atitudes e exemplos de Lohan, o garoto do projeto Âncora

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Publicado orinalmente dia 27 de julho

Por Paulo Atzingen*

Na última sexta-feira (24)  conhecemos Lohan, um garoto que frequenta há 10 anos o Projeto Âncora, em Cotia (Grande São Paulo). Lohan tem 12 anos e foi nosso guia na apresentação do projeto.

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Ele nos levou aos espaços de convivência e iniciação, mostrou o circo, o depósito de alimentos, a biblioteca, o laboratório, a sala do silêncio, a sala de música e o laboratório de TI, se é que podemos chamá-los assim. Nos contou, detalhadamente – e à sua maneira de jovem pré-adolescente – as diferentes etapas do projeto Âncora, criado pelo visionário catarinense Walter Steurer.

Lohan é inclassificável e inrotulável por nossos parâmetros lógicos de análise social. Filho de trabalhadores – ele nos revela com a sinceridade pura de crianças que seus pais têm uma marcenaria – Lohan atualmente frequenta aulas de arte circense: “Malabares e palhaço”, me corrige, especificando as artes.

Nos leva à arvore de pau-brasil onde as cinzas de Walter Steurer foram jogadas e sintetiza a obra do criador do projeto. “Era um homem de visão”. Sua insegurança de menino colocado para apresentar uma instituição de 20 anos a um grupo de adultos é intercalada por firmeza nas palavras e convicção no que acredita.

Na sala de tecnologia nos apresenta os notebooks, ultrabooks e PCs e suas regras de utilização:

Se eu pego um computador e não o devolvo no horário, perco pontos. Se levar três pontos dentro de uma semana, você perderá o direito de usar o computador por um tempo”, explica, projetando possibilidades, analisando circunstâncias e deixando claro que a disciplina e a pontualidade integram esta galáxia-pedagógica às margens da rodovia Raposo Tavares.

Lohan e Antonia foram os guias na visita do Skal ao projeto Âncorra
Lohan e Antonia foram os guias na visita do Skal ao projeto Âncorra

“Não sei”

No espaço Iniciação I – aqui a escola formal é virada do avesso e as terminologias acadêmicas caem por terra – Lohan tenta detalhar o processo de transição entre o iniciação 1 e o iniciação 2, mas não consegue. Alguém pergunta o que era mais importante na fase de iniciação e ele responde:

– “Não sei”!

Essa sinceridade em afirmar que não sabe revela o cerne da proposta pedagógica que o Projeto Ancora se forja. Os 200 alunos frequentadores do projeto não são produto da pedagogia de resultados, fruto desta fábrica de produção, consumo  e certeza a que estamos mergulhados.

A resposta de Lohan nos remete a um mundo menos encaixotável e previsível e por um hiato de tempo me reporto às aulas de construtivismo do educador pernambucano Paulo Freire.

O menino nos leva à arvore de pau-brasil onde as cinzas de Walter Steurer foram jogadas e sintetiza a obra do criador do projeto
O menino nos leva à arvore de pau-brasil onde as cinzas de Walter Steurer foram jogadas e sintetiza a obra do criador do projeto

“Música influencia o estudo”

No espaço dos instrumentos musicais, Lohan fez esta declaração:

Os estudos podem ser incentivados ouvindo certo tipo de música. Minha mãe estudava matemática escutando música clássica, acho que Beethoven.  Não é só determinado tipo de música que influencia os estudos, qualquer outra música influencia o raciocínio e o estudo”, diz para o espanto dos ouvintes.

É possível uma cidade inteira ter este tipo de proposta pedagógica?”, alguém arrisca a perguntar.

– “Pode funcionar, mas também pode dar problema. Uma ideia sempre pode ter um erro, que em alguma hora você pode descobrir. É aconselhável que, se você tiver uma ideia totalmente fechada, que mesmo observando todos os mínimos detalhes, observando nas entrelinhas, sempre pode ter um erro”, professa o menino oferecendo aqui um banquete dialético e de possibilidade de auto-crítica e de autoanalise.

Na biblioteca revela que gosta de livros que retratam o período medieval. “Gosto de histórias fora da realidade e histórias de aventura. Um que estava lendo recentemente é o Rangers: Ordem dos Arqueiros. Gosto de traduções e pratico meu inglês traduzindo expressões aleatórias em inglês”, revela. “Tenho também vontade em aprender russo, pois tenho um tutor que fala o idioma”, completa o menino.

Lohan é inclassificável e inrotulável por nossos parâmetros lógicos de análise social
Lohan é inclassificável e inrotulável por nossos parâmetros lógicos de análise social

 

Futuro

“O que você pretende fazer quando crescer?”, alguém,  do alto de sua lógica aristotélica, perguntou a Lohan.

Ainda não tenho certeza. Gosto de robótica. Vou programar um CNC (Computerized Numerical Control), junto com meu pai. Já aprendi na programação aplicar planos cartesianos e planos de lógica e matemática. Agradeço ao professor Fábio e ao professor Rafael, que desapareceu por algum tempo pois sua mulher está grávida”, afirma e leva os visitantes às gargalhadas pois os conteúdos de suas informações misturam inteligência e honestidade, sem o recalque forjado por uma cultura ou por um tempo. Sem o clichê das respostas-prontas.

A apresentação guiada do Projeto Ancora se tornou ainda mais profunda porque foi explicada por um coração de menino em puro processo de compreensão do mundo. Sem amarras culturais alienantes, sem vícios herdados do meio, sem a baliza do politicamente correto. Na sala, um adulto manifesta seu comportamento herdado do meio. Lohan, de imediato, o repreende:

– “por favor, não arraste a cadeira…”

Arrancados a fórceps desta  maneira automática de se relacionar com o mundo, com as coisas e com as pessoas, saímos do Projeto Ancora com uma suave fragrância nas roupas e nos cabelos. Um aroma de que ainda é  possível acreditar no país e nos homens.

Arrancados a fórceps desta  maneira automática de se relacionar com o mundo, com as coisas e com as pessoas, saímos do Projeto Ancora com uma suave fragrância nas roupas e nos cabelos
Arrancados a fórceps desta maneira automática de se relacionar com o mundo, com as coisas e com as pessoas, saímos do Projeto Ancora com uma suave fragrância nas roupas e nos cabelos

Projeto Ancora

* O jornalista Paulo Atzingen foi convidado pelo Skal a conhecer o Projeto Âncora

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2 COMENTÁRIOS

  1. Conheço o projeto e sei da sua seriedade e grandeza. O abordagem jornalística que foi feita faz a gente acreditar no Brasil e nas pessoas, como bem disse a reportagem. Parabéns

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