Salvador não está preparada para o aumento do fluxo de turistas

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José Queiroz*

O turismo receptivo de Salvador mantém uma contradição emblemática: reclama da falta de turistas na maior parte do ano, mas não se prepara para os momentos de pico. O que desagrada operadoras e turistas individuais e diminui o número de visitantes ano após ano. Entenda-se por turismo receptivo de Salvador o conjunto Estado/Prefeitura/Trade, que, a bem da verdade, trabalhou bastante em 2015 para recuperar a cidade e o fluxo, mas os equipamentos e a logística necessária não estão prontos para atender a muitos turistas. Não basta ser bonita, famosa e divulgada.

Os problemas começam pela mobilidade, do desembarque no aeroporto – capítulo a parte – ao estacionamento no Pelourinho. Baianos e turistas andam espremidos e lentamente em Salvador no que sobrou de pista depois das faixas de ônibus e ciclovias. E sob o chicote da Transalvador, que não aceita o diálogo, mesmo com quem trabalha nas ruas e precisa parar nos atrativos e equipamentos turísticos. A mobilidade do turismo é completamente ignorada quando se trata de promover eventos em praça pública, agora agravada pela proibição do trânsito em algumas vias, como no Farol da Barra, inclusive inviabilizando alguns passeios turísticos. Principalmente no Carnaval, quando é impossível passear pelos famosos atrativos da cidade.

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O Pelourinho gostaria de receber mais visitantes, baianos e turistas, mas estacionar é um dos maiores empecilhos! Nos momentos de pico do turismo, ou em grandes eventos, muitos visitantes alugam carros, e o Centro Histórico é o principal interesse. Porém, não há vagas ou segurança no acesso suficientes, não há material nos hotéis orientando como chegar e estacionar no lugar, a sinalização não é específica, e os espaços do Comércio, Santo Antônio e Baixa dos Sapateiros são subutilizados. O acesso principal, pela Rua Chile, é um dos mais vergonhosos dos atrativos do Brasil. Flanelinhas mal encarados e agressivos assustam e praticam extorsão escancarada, desestimulando qualquer cidadão de deixar seu carro ou voltar ali.

O caso do Terminal Turístico é crônico e emblemático, pois ali está o reflexo da falta de conexão entre os órgãos responsáveis pelo turismo da cidade

A temporada se aproxima e, justo agora, o Governo do estado começou uma obra entre o Mercado Modelo e o Terminal Turístico que, espera-se, seja concluída. Se não, o acesso a esses lugares será tão vergonhoso como na Rua Chile e Aeroporto, locais em que circulam milhares de turistas atentos e críticos que, entre outros canais, utilizam as redes sociais para enaltecer ou desaconselhar um destino. O caso do Terminal Turístico é crônico e emblemático, pois ali está o reflexo da falta de conexão entre os órgãos responsáveis pelo turismo da cidade. O mesmo vale para o Porto na temporada de cruzeiros, onde centenas de motoristas clandestinos e taxistas disputam no grito os clientes que, muitas vezes, preferem não sair.

Aliás, Salvador, cidade ensolarada, com mais de 50 quilômetros de praias, banhada em parte por uma das mais famosas baías do mundo, não leva a sério o turismo de praia ou náutico. Apesar da excelente reforma da Orla realizada pela prefeitura, o turista não terá onde desfrutar das praias da cidade nos fins de semana, pois Flamengo e Stela Mares ficam congestionadas, e Piatã não oferece segurança. A solução seria quiosques, duchas e a Guarda Municipal na Barra e em Jaguaribe. Ilha dos Frades ganhou Bandeira Azul – atenção Prefeito, o atracadouro de Frades não ficou pronto e isto está causando problemas! – mas o passeio de escuna precisa de apoio institucional para atualizar-se, e Itaparica ainda pode dar muito prazer aos turistas. Atenção com Itaparica, srs. gestores!

Há muitas outras coisas a fazer, como novos hotéis, mas os antigos e os restaurantes deveriam oferecer recepcionistas e cardápios para o grande e importante fluxo sul americano, de língua espanhola, captados e mal atendidos em Salvador e em outros atrativos da Bahia. É preciso fiscalizar os serviços que são oferecidos nos hotéis a este público. As agencias de receptivo também precisam atualizar seus roteiros, oferecer aquilo que o turista procura, como a Casa do Rio Vermelho, do Jorge Amado, turismo religioso – Candomblé, Irmã Dulce, Mansão do Caminho, etc. – a cidade de Cachoeira, os museus, etc. Mas, o lugar que precisa de intervenção urgente, de um mutirão para reorganizá-lo, de profissionais de fato, é o aeroporto de Salvador!

O caótico aeroporto da cidade, em fase de transição do público para o privado – desculpa para ninguém se entender sobre nada – precisa viabilizar urgente o embarque dos usuários em veículos, do contrário, esta deverá ser a pior temporada da história do equipamento, pois a pista de embarque está reduzidíssima em função da obra que se arrasta há anos. Ocorre que a Infraero vendeu muito espaço para as cooperativas de taxis Comtas e Cometas, que tomam metade do espaço disponível para isto, e agora colocou a Polícia Militar e a Transalvador para garantir a exclusividade delas, multando carros até no interior do estacionamento! Com a desculpa de combater clandestinos, estes órgãos expulsam ou multam qualquer um que se estender um pouco mais no embarque de passageiros e abordam motoristas ‘suspeitos’ no saguão de desembarque, enquanto os taxis dessas cooperativas infernizam a vida de quem circula por ali, baianos e turistas, que queiram taxis ou não.

Carros e motoristas de turismo têm um espaço exíguo reservado, longe do desembarque, mesmo assim proibido para automóveis, que atendem pessoas ou casais individuais, um serviço que é vendido largamente pelas operadoras do país e estrangeiras. Independente disto, contraditoriamente, o aeroporto de Salvador tem lugar para taxis de cooperativas, taxis comuns e locadoras, só não tem lugar para profissionais de turismo atender turistas, caso estes queiram um guia de turismo ou um passeio na cidade durante uma escala. Esta proteção aos taxis no aeroporto, hotéis e resorts da região está prejudicando outros atrativos, centros religiosos e culturais, e os próprios investimentos privados e públicos. Taxistas tomaram o lugar dos profissionais de turismo sem a menor condição de atender às expectativas e necessidades estudadas e conhecidas do trade do receptivo.

Duas medidas recentes contribuíram para a boa imagem do receptivo da cidade: a regulamentação do exercício da profissão de guia de turismo e a regulamentação do transporte de turismo

Salvador perdeu muito do seu fluxo nos últimos anos, é a sexta colocada hoje no ranking do país, e operadoras estrangeiras deixaram de vender a cidade. Mas, seu nome ainda tem peso na indústria turística, e as últimas iniciativas da Prefeitura e do trade já começaram a repercutir no Brasil e no mundo. Duas medidas recentes contribuíram para a boa imagem do receptivo da cidade: a regulamentação do exercício da profissão de guia de turismo e a regulamentação do transporte de turismo. Porém, é preciso que todas as instâncias do turismo da Bahia se juntem com a mesma determinação para corrigir as falhas, recuperar o turismo e seus negócios, e gerar os empregos, as rendas e o crescimento cultural que a cidade e o povo precisam. Afinal, o turismo depende deles!

José Queiroz é soteropolitano e guia de turismo

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