O incessante aprendizado – por Mário Carlos Beni*

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A memória é a vida, sempre guardada em seu nome ela está em evolução permanente, aberta a dialética da lembrança e esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todas as utilizações e manifestações suscetível de longas latências e de súbitas revitalizações… Potencializadas, amplamente agora pela informática, pela energia Ram, arquivada nas nuvens!

A memória é um fenômeno sempre atual, uma ligação do vivido, do experimentado com o eterno presente. A memória se enraíza no cérebro, no espaço, no gesto, na imagem, no objeto.

Após cinco milênios de buscas é hora de deixar para trás a expectativa de que devemos achar explicações finais sobre o mundo, sejam elas científicas ou religiosas. Não há dúvida que nossa busca abriu novos domínios do conhecimento, revelando alguns dos segredos mais profundos da Natureza. Ao continuarmos nossa exploração do mundo natural, desenvolvendo novos instrumentos e teorias, aprenderemos sempre mais. Criamos, também obras magníficas nas artes, na literatura, e na música, tentando expressar toda a gama de nossas emoções, da mais profunda tristeza, à alegria mais sublime, nossas angústias e temores, nosso amor pela vida e medo da morte, e nossa necessidade de companhia e de compaixão.

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Nosso primeiro antepassado era tão fascinado quanto somos hoje pelo mistério da Criação. Nossos descendentes continuarão essa busca, tentando desvendar o sentido da existência. Somos, e seremos sempre criaturas criadoras. Mas nosso foco precisa mudar. A ciência nos mostrou que a razão, motivada pela paixão da descoberta, é o instrumento mais poderoso que temos para responder a nossas perguntas sobre o mundo natural. Dado que nossas primeiras explicações do mundo surgiram de imagens e narrativas míticas, não é surpreendente que a ciência carregue, nas suas raízes, a mesma expectativa mítica das explicações finais sobre o mundo, sobre nossa razão de ser.

A despeito de nossa necessidade de encontrar perfeição e simetria em tudo, o poder criativo da Natureza vem de assimetrias e de imperfeições que se manifestam desde o mundo das partículas subatômicas ao Universo como um todo

A despeito de nossa necessidade de encontrar perfeição e simetria em tudo, o poder criativo da Natureza vem de assimetrias e de imperfeições que se manifestam desde o mundo das partículas subatômicas ao Universo como um todo. Buscamos por simetrias perfeitas, criamos equações para descrevê-las, mas vemos que nossas soluções são aproximações de uma realidade complexa e imperfeita. E assim deveria ser. Assimetria gera desiquilíbrio, desiquilíbrio gera transformações, transformação gera realização, a emergência de estrutura. Algumas das simetrias mais básicas da física das partículas devem ser violadas para que a matéria exista. A vida seria impossível sem a assimetria molecular, a quiralidade das biomoléculas. O Universo por inteiro talvez tenha surgido de uma flutuação quântica que emergiu do multiverso, uma entidade atemporal onde incontáveis possíveis universos coexistam.

Envelhecemos aprendendo sempre!

Sólon com frequência repetia esse pensamento em sua velhice.

O tenhamos à nossa. A adversidade sem dúvida é uma grande mestra, mas cobra caro por suas lições e em geral o proveito que temos não vale o preço que custaram. Além disso, antes que tenhamos obtido todos esses haveres em lições tão tardias, a oportunidade de usá-las passa.

A juventude é o momento de estudar a sabedoria, a velhice é o momento de praticá-la. A experiência sempre instrui, temos que reconhecer, contudo é proveitosa apenas para que temos à nossa frente. No momento de morrer, haverá tempo de aprender como deveríamos ter vivido? São reflexões de Rousseau, as quais não concordo inteiramente. Como saber quando vamos morrer? Seu raciocínio nos leva a ordem natural da vida.

Na verdade, o conhecimento é um processo contínuo em nossa existência desde o nascimento até a morte. A sabedoria é uma conquista das reflexões contínuas de percepção para novas revelações. Estas, estão nas novas contribuições dos pesquisadores, razão porque é preciso acompanhá-las diariamente. Para esse exercício, permaneçamos, enquanto puder ativos, em sala de aula nos programas de mestrado e doutorado, que trabalham autores de ontem e de hoje, formando inovadoras correntes de pensamento e novas conquistas inter e transdisciplinares.

Assim retidos na estreita esfera de nossos antigos conhecimentos, reciclamo-nos em companhia de nossos alunos e orientados do passado e nossos colegas da atualidade, esforçando-nos como Sólon para envelhecer aprendendo todos os dias, tentando nos proteger do perigoso orgulho de querer transmitir o novo do que ainda não assimilamos. Contudo, se nos restam poucas aquisições a esperar das luzes úteis do saber, nos restam toda a vontade e disposição de percebe-las para aprender debater e criar novos modelos de aprendizagem. Esse será o momento de enriquecer e ornamentar nossa alma com bens que ela possa levar consigo quando, liberada de nosso corpo, tenha esgotado até aquele instante tudo que ainda precisava aprender para ensinar.

Ficaremos muito felizes com os progressos reiterados sobre nós mesmo a cada dia, aprendermos a sair da vida, não melhor, pois isso não é possível, porém um pouco mais virtuosos do que nela entramos.

O conjunto das ciências humanas deveria permitir-nos discernir o nosso destino social, o nosso destino histórico, o nosso destino econômico, o nosso destino imaginário, mítico ou religioso. Quanto a cultura humanista, à literatura, ao teatro, ao cinema dão-nos a ver os indivíduos nas suas singularidade e subjetividade, a sua inscrição social e histórica, as paixões, amores, ódios, ambições, ciúmes. Incitaram-nos à consciência das realidades humanas, particularmente nas relações afetivas de pessoa a pessoa, a inserção dentro de uma família, uma classe, uma sociedade, uma nação, uma História, em suma à consciência dos caracteres da condição humana. A poesia e as artes introduzem-nos nas dimensões estéticas da existência humana e na procura da qualidade poética da vida, a Filosofia inaugura a reflexão sobre todos os problemas fundamentais que o ser humano, que simultaneamente depende da Natureza e da cultura, que sofre a morte como qualquer animal, mas que é único ser vivo a acreditar numa vida depois da morte em cuja aventura histórica nos levou à era planetária. Assim, pode obedecer-se à finalidade do ensino que é ajudar o aluno a reconhecer-se na sua Humanidade, a situá-la no mundo e assumi-la. Tudo isto deve contribuir para a formação de uma consciência humanista e ética de pertença à humanidade, a qual deve ser completada pela consciência do caráter matricial da Terra quanto à vida e da vida quanto a humanidade.

Tudo isto deve contribuir para a formação de uma consciência humanista e ética de pertença à humanidade, a qual deve ser completada pela consciência do caráter matricial da Terra quanto à vida e da vida quanto a humanidade.

Com essa reflexão, reafirmando, nossa crença dual de cientista que acredita na experiência e na manifestação contínua dos fenômenos observáveis desde que o ato de verificação proceda isento de condicionamentos, e de alma crente e fervorosa no culto à Inteligência superior – Deus – e, vivendo o adentrar de um novo ano, somemos a estes instantes e privilegiados que usufruímos a alegria de podermos estar juntos como bons e restauradores amigos.

Feliz Natal e Próspero Ano  Novo!

*Mario Carlos Beni. Doutor em Ciências da Comunicação e Livre Docente em Turismo pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo

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