Vinicius Lummertz: “O Brasil tem um raciocínio arcaico”

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(Entrevista publicada originalmente no dia 13 de abril de 2022)

“Tirar o limite do turismo da página de viagens e colocá-lo na página de economia”. É assim que o Secretário de Estado de Turismo e Viagens de São Paulo, Vinicius Lummertz, quer ser lembrado. Com três anos à frente da pasta, ele já havia adiantado ao Diário que sua permanência no cargo é certa, pelo menos até o fim de 2022. Apostando em parcerias com a iniciativa privada, projeta melhorias para a Capital paulista e para o interior. Confira mais detalhes da entrevista concedida por Lummertz, ao jornalista Paulo Atzingen, editor do DIÁRIO, durante a WTM Latin America:

DIÁRIO – Você conseguiu imprimir o seu ritmo de homem público, de gestor, ou foi muito influenciado por João Dória? Você se sentiu à vontade à frente da secretaria?

VINICIUS: Sim, mais do que me sentir à vontade, me senti apoiado. O governador João Doria veio do turismo, foi presidente da Paulistur (Empresa Paulista de Turismo) e da Embratur (Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo), como eu fui. Tem uma questão pouco conhecida na maneira do João Dória governar que é: deixar os secretários criarem. Nas nossas reuniões de segunda-feira – foram 156 reuniões de conselho de secretários, de no mínimo quatro horas cada –, os secretários apresentam o que vão fazer e apresentam o acompanhamento do que estão fazendo. O que marca o João Doria é deixar trabalhar, mas ele cobra, como gestor que é. E coube ao Rodrigo [Garcia] durante aquele período como secretário de governo ajudar a viabilizar. E aos secretários, cooperar.

Estruturação

O que eu consegui fazer no estado de São Paulo tem muito a ver com a operação interna com o governo. Mas o primeiro passo foi estruturar realmente uma secretaria de turismo como tal, o que nós não tínhamos. Nós só tínhamos, na prática, um programa chamado Dadetur, que tinha em torno de R$ 220 milhões em obras espalhadas em 210 municípios. Hoje, ele passou para R$ 550 milhões. Nós estamos, neste ano ainda, pensando uma reforma, uma melhoria desse programa para incluir novos objetos. Não só obras, mas incluir mais possibilidades para esses recursos. O que nós fizemos foi estruturar uma secretaria trazendo gente da Embratur, do Ministério do Turismo, da Prefeitura de São Paulo, do mercado. Nós temos hoje uma secretaria montada à semelhança de um ministério, e bem melhor do que o Ministério do Turismo em termos de funcionamento. São Paulo conseguiu isso no nosso período.

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Parcerias e projetos

Nós não temos uma Embratur. Por isso nós temos uma parceria com o Convention & Visitors Bureau do estado de São Paulo. Nós focamos nosso trabalho no São Paulo para Todos, que foi o programa inicial que nós lançamos, e, paralelamente, nós construímos o Plano 20 30, um plano completo que foi amparado pela USP, via FIA USP e pela Invest também, com sua construção consultando todo o estado. De início, nós já largamos em janeiro de 2019, com a diminuição do imposto do combustível para as companhias aéreas de 25 pra 12%. Só abrimos uma negociação para que as áreas investissem maciçamente em mídia através do Convention Bureau e ampliassem em 700 voos por semana e 16 lugares do interior passariam a ter voos, que não tinham, e outros ampliariam. E esses compromissos foram assinados, mas veio a pandemia e agora eles voltaram. Nós vamos receber milhões de investimentos nos aeroportos. O turismo tem que cooperar lateralmente. Então participamos das concessões dos parques naturais. Nós temos a concessão do Parque Imigrantes pela secretaria. E nós vamos construir um projeto chamado T Land, terra do turismo… essa é a novidade este ano. Será três, quatro vezes maior que o [Parque do] Ibirapuera, com muitas atrações, e vai ser um distrito turístico. O último ato do governador João Doria foi ao do distrito turístico do Serra Azul, que é uma lei criada no estado para tratamento diferenciado, com cogestão entre estado e município, com plano de investimento de R$ 2 milhões apenas da iniciativa privada. É uma secretaria completa hoje. Em Mogi das Cruzes, bateu recorde de matriculas das eletivas de turismo que nós lançamos no ano passado. 130 mil alunos estudam turismo no estado. É a preferida dos alunos e isso vai ter impacto lá na frente. São muitas mudanças, atração de investimentos e inteligência para desenvolver as estratégias setoriais.

Vinicius Lummertz, secretário de Turismo de São Paulo (Crédito: arqruivo DT)
DIÁRIO – Você vai deixar um legado? E esse legado é a garantia de haver prosseguimento nesses projetos, mesmo se houver uma mudança de governo?

VINICIUS: Nós esperamos que sim. O turismo brasileiro, ao lado do agrobusiness, são as duas grandes vantagens competitivas do Brasil perante o mundo. São onde nós nos posicionamos com número um. Você olhava o agrobusiness 40 anos atrás, e nós éramos importadores de comida. Hoje nós somos um dos maiores exportadores, porque foi feito um programa pra isso, houve uma internacionalização na cadeia de produção. Houve crédito, houve capacitação, houve inteligência pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e a integração das cadeias produtivas. Com o turismo, nós abrimos o capital das aéreas lá no final do governo [Michel] Temer. Nós abaixamos impostos muito altos dos combustíveis das companhias aéreas. Hoje nós zeramos todos os impostos numa medida provisória nos últimos dias do governo Temer colocando a zero o custo de importação para equipamentos de parques temáticos. Eram coisas que impediam o Brasil de se desenvolver no setor, mas ainda temos o que fazer. Por que um hotel também tem que pagar o mesmo imposto do que uma pessoa física se a TV, o ar condicionado, o frigobar deveriam ser bens de capital? Isso renovaria e mobilizaria a cadeia. O Brasil tem um raciocínio arcaico.

Classe média

Falta ao Brasil a formação de uma classe média nesse País. Com todo respeito às noções liberais, às vezes processadas pelo atual governo do presidente [Jair] Bolsonaro, não está claro que ele tem o compromisso de criar uma classe média no Brasil. Nem do [ex-presidente] Lula, quando o Lula fala de o pobre comer uma picanha no sábado com uma cerveja. Isso não é classe média. Classe média é o sonho americano, é o sonho paulista, o sonho catarinense, cearense de desenvolvimento e afluência social. É quando um filho vê o sacrifício do seu pai e ele sabe que o filho vai ter mais do que ele. Esse é o sonho da classe média europeia e esse é o sonho, pasme, o comunismo chinês o comunismo chinês. A palavra do [presidente chinês] Xi Jinping é criar uma classe média, entendendo classe média, não como o Lula entende, mas entendendo a classe média como quem tem acesso a bens públicos de qualidade, a bens privados de consumo a preço justo. Isso o Brasil não tem. No Brasil é juro alto, preço alto, imposto alto e pouco acesso a bens culturais. A classe média tem que ter acesso à cultura. Não apenas a consumo. Eu não queria citar o Donald Trump, mas eu vou citar. Ele disse uma coisa violenta sobre o Brasil, mas que é verdadeira. O consumidor brasileiro é o mais trouxa do planeta. Nós temos que mudar o modelo de consumo para ter uma classe média.

DIÁRIO – Eu percebo que você com essas suas ideias geopolíticas, econômicas, filosóficas inclusive, sobre a questão da economia brasileira, parece que a pasta do turismo é pouco para sua estatura de executivo. Vinícius, você não tem intenção de seguir uma carreira política, ou ir para o exterior… como ficou sua candidatura ao governo de Santa Catarina?

VINICIUS: A minha formação foi no exterior, eu fiz a minha graduação na Universidade de Americana de Paris. Depois eu fiz vários cursos de capacitação executiva, de pós-graduação nos Estados Unidos e também na Europa. Eu tive muita oportunidade de capacitação. Eu pertenci a uma grande escola que é o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), eu implementei o Sebrae de Santa Catarina e fui um dos criadores do Sebrae nacional, que é uma boa escola também. Eu tenho convites inclusive para ir para o exterior, mas para trabalhar. Eu tenho convites de conselhos de empresas. E, ao mesmo tempo, eu me propus a me candidatar a governador do Estado de Santa Catarina, mas o partido (PSDB) decidiu não ter candidato a governador. Então a partir de uma discussão partidária decidiram a uma postura de adesão a uma ala não definida. Não aceitei isso, respeito, mas não aceitei se desincompatibilizar daqui para ir para lá. E aqui em São Paulo, o Rodrigo Garcia me convidou para candidatura de deputado estadual ou federal. A minha decisão foi permanecer e terminar este trabalho que eu estou fazendo. Eu acho que eu tenho que concluir isso até o final do ano. O Plano 20 30 nós estamos executando tem que ter a sua conclusão. E essa dedicação vai ser em tempo integral. Claro, ao lado do meu esforço para a eleição de João Doria, que foi o melhor governador da história de São Paulo.

Balanço

Se você me pedisse para resumir o que eu fiz ou o que eu faço: é tirar o limite do turismo da página de viagens e colocá-lo na página de economia. O Brasil não é um país de 6 ou 7 milhões de turistas internacionais. É um país de 220 milhões de viagens. É um dos maiores mercados de companhias aéreas do planeta. São 11 milhões de turistas em São Paulo por ano. Imagine isso com o Centro de São Paulo arrumado. Esses 11 milhões poderiam ser 22, 33 milhões.

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