Mar Mediterrâneo: um breve relato de um turismo de terror

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Mais de 100 pessoas morreram em três naufrágios nos últimos dias enquanto seis navios são impedidos de salvar vidas. As informações são da Organização Não Governamental Médicos Sem Fronteiras


Os últimos dias produziram alguns dos episódios mais mortais no Mar Mediterrâneo Central até agora em 2020, com mais de 100 pessoas morrendo no mar em três naufrágios ocorridos em um intervalo de menos de 72 horas. Seis navios de resgate, incluindo um operado por MSF, permanecem bloqueados no porto por autoridades italianas e europeias, enquanto equipes de MSF na Líbia ajudaram três mulheres sobreviventes resgatadas por pescadores nesta quinta-feira (12), depois que um barco de madeira virou e deixou outras 20 pessoas mortas ou desaparecidas na água.

“Chega de lamentações vazias em resposta à carnificina que está ocorrendo”, disse Hassiba Hadj Sahraoui, assessora de assuntos humanitários de MSF. “A responsabilidade por essas mortes recai diretamente sobre os estados-membros da União Europeia, como o resultado concreto e inevitável de suas políticas assassinas de não assistência e do bloqueio ativo de navios de resgate de ONGs.”

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“Para os governos europeus ou a Comissão Européia, dizer que estão tristes com essa terrível perda de vidas é hipócrita, na melhor das hipóteses,” afirmou Hadj Sahraoui. “Eles precisam parar com o discurso duplo e admitir sua responsabilidade: naufrágios como esse são o resultado direto de sua abordagem para a migração.”

Quase 700 pessoas morreram na tentativa de escapar da Líbia pelo Mediterrâneo Central em 2020, e pelo menos 267 dessas mortes foram relatadas desde que o Sea-Watch 4 foi detido pelas autoridades italianas no porto de Palermo, na Itália, em 19 de setembro. A embarcação é operada conjuntamente pela Sea Watch e por MSF. Com seis navios de ONGs impedidos de retomar as operações de salvamento, com a desculpa de supostas preocupações com a segurança da navegação, o navio de resgate Open Arms é atualmente o único navio civil capaz de operar.

Em vez de cumprir suas obrigações internacionais e marítimas de ajudar os que estão em perigo no mar, os Estados europeus optaram por dizimar ainda mais a capacidade de busca e resgate. Eles fingem acolher ou reconhecer o valor do trabalho vital das ONGs, enquanto orquestram ou endossam sua criminalização.

As interceptações pela Guarda Costeira da Líbia aumentaram nas últimas semanas, com quase mil pessoas retornando à força para a Líbia entre 3 e 9 de novembro. Isso é indicativo do alto número de pessoas que tentaram escapar do país nas últimas semanas.

“As condições desumanas dentro dos centros de detenção na Líbia foram denunciadas repetidamente”, disse William Hennequin, gerente do programa de MSF para a Líbia. “Mas a detenção arbitrária é apenas uma pequena parte do ciclo mortal de violência em que milhares de pessoas vulneráveis estão atualmente presas. Os líderes dos estados que promovem e apoiam essas interceptações e devoluções devem ver o resultado de suas políticas por si mesmos.”

“Na semana passada, um menino da Eritreia de 15 anos foi morto a tiros depois que homens armados invadiram um abrigo em Trípoli”, afirmou Hennequin. “Assassinatos, sequestros, violência extrema – incluindo tortura para extorquir dinheiro dos prisioneiros e seus parentes – continuam sendo ameaças cotidianas que continuarão empurrando pessoas vulneráveis a cruzar o mar para escapar desse abuso na ausência de outras formas mais seguras de fazê-lo.”

Na quarta-feira, a Frontex, a Agência Europeia da Guarda Costeira e de Fronteiras, declarou que estava “empenhada em salvar vidas no mar, em estreita cooperação com todos os intervenientes operacionais”. No entanto, isso mascara a realidade de que eles têm evitado continuamente compartilhar informações relacionadas a barcos em perigo com navios de resgate de ONGs, enquanto enviam a Guarda Costeira da Líbia, para que os barcos possam ser presos e devolvidos à força para o país.

Os Estados europeus devem parar de culpar apenas a insensibilidade dos traficantes pelas mortes na região. Em vez disso, eles devem aceitar que a perda em massa de vidas nesses incidentes é o efeito colateral de suas próprias decisões políticas calculadas. O tráfico de seres humanos deve ser combatido, mas não às custas de suas vítimas que, em vez de receberem assistência e proteção que salvam vidas, são presas e empurradas de volta para um ciclo de abuso. Ou simplesmente deixadas para se afogar.

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