Turismo, vítima da política

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O artigo deveria se tornar texto de cabeceira de todos os participantes do turismo brasileiro, entre hotéis, agências de viagens, companhias aéreas, cruzeiros e demais prestadores de serviço

por Fábio Steinberg*

Muita fumaça e nenhum fogo. Este poderia ser o título do artigo acadêmico Turismo à Margem da Política – O Caso do Brasil, escrito por Mariana Aldrigui. Nele, há uma corajosa avaliação da lamentável atuação do Ministério do Turismo e seus pífios resultados desde sua criação.

O artigo deveria se tornar texto de cabeceira de todos os participantes do turismo brasileiro, entre hotéis, agências de viagens, companhias aéreas, cruzeiros e demais prestadores de serviço. Munida de dados e estatísticas, a autora lembra que em menos de seus 15 anos a pasta já recebeu dez titulares. Diga-se de passagem, todos políticos sem qualquer familiaridade com o tema, e que pouco realizaram pelo segmento. O pior é que isto ocorreu em um período em que o Brasil sediou a Copa do Mundo e as Olimpíadas, os dois maiores eventos esportivos do planeta.

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Aldrigui tem os requisitos para fazer a análise. Professora e pesquisadora em Turismo na Universidade de São Paulo, é uma das principais (e poucas) autoridades brasileiras no assunto.  O seu trabalho ganhou um capítulo no livro “Tourism and Political Change” (Turismo e Mudança Política), publicado na Inglaterra, coordenado pelo professor emérito de turismo Richard Butler.

Ela coloca o dedo na ferida ao afirmar que “o governo brasileiro demonstra compreender parcialmente o significado real do turismo na economia, e não se vale da atividade como uma das estratégias de desenvolvimento”. Para ela, falta uma política capaz de incorporar as características da atividade à gestão pública.  

A história dá razão à tese, quando a autora descreve a trajetória errática do turismo oficial no país. Tudo começa em 1966 com a criação da Embratur. Com a ambiciosa missão de desenvolver o setor e promover o país como destino internacional, já nasce com vício de concepção, ao se subordinar simultaneamente a diferentes Ministérios.  

Em 1992, antecipando um festival de ensaios e erros que se seguiria, o setor se incorpora ao título do Ministério da Indústria, Comércio e Turismo. Seis anos e seis nomeados depois, passa a se vincular ao Esporte e Turismo. Quatro anos e quatro ministros depois, torna-se Ministério do Turismo.

Na prática, registra o estudo, ao invés de se tornar um vetor de desenvolvimento econômico e social, o órgão se transformou uma das pastas para negociação política. A sua existência se resume a uma triste sucessão de titulares com uma gama que em geral varia entre incompetentes, inapetentes e inabilitados para o cargo. A professora aponta também a má utilização de recursos oficiais, como por exemplo mais dinheiro dedicado a pórticos que a portos, aeroportos e sinalização turística.     

“As ações tomadas pelo Ministério surtiram pouco ou nenhum efeito de médio prazo”, afirma Aldrigui, respaldada por impiedosas estatísticas. Enquanto de 2003 a 2014 o continente sul americano viu seu número de turistas mais que duplicar de 13,7 milhões para 28,9 milhões, o Brasil amargou de ínfimos 4,2 milhões para 6,4 milhões.    

Qual a razão deste fiasco crônico? Atribuir todas as mazelas somente à incompetência estatal seria uma explicação simplista. Uma soma de fatores conspira contra o turismo nacional. Falta de recursos. Um empresariado desunido e que se preocupa mais com o próprio umbigo, sob lideranças que priorizam a autopromoção. Ausência de infraestrutura em aeroportos, portos, estradas. Falta de leis que estimulem a vinda de turistas. O absurdo custo Brasil. A concorrência de destinos internacionais mais competentes. Estes e outros itens podem ajudar a entender. Mas o verdadeiro cerne parece ser a predileção por táticas de curto prazo, sem respaldo de um plano estratégico integrado e duradouro.   

A conclusão é que o setor anda aos trancos e barrancos, e independe das ações do Ministério. Neste sentido, o trabalho de Mariana Aldigri não deve ser visto com pessimismo, mas como um caminho a trilhar por quem atua no setor. Diante da falência do modelo oficial, o parágrafo final pode ser lido como um convite à ação pelo empresariado: 

“O eventual sucesso do turismo brasileiro se deve, quase que unicamente, ao empenho conjunto de representantes da iniciativa privada que garantem a prestação de serviços aos turistas que se aventuram no país, e se encantam com a hospitalidade do povo brasileiro, essa sim, nosso maior asset”.

*Fábio Steinberg é jornalista

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