Eduardo Mielke: “Secretarias de Turismo não têm verba e seus secretários não têm prestígio”

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REDAÇÃO DO DIÁRIO

Os últimos fatos políticos ocorridos no Brasil, como operação Lava-Jato e Operação Zelotes que vêm fazendo uma espécie de faxina nas estruturas administrativas do poder político em nível federal e estadual devem – como já estão – repercutir em instâncias menores como nos municípios. O que esta moralização das relações entre o poder público e iniciativa privada pode influenciar nas cabeças dos gestores municipais? Quais os benefícios que os municípios podem ter – em especial no desenvolvimento do setor turístico municipal – com essa lipoaspiração ética pluripartidária que foi deflagrada pelo Ministério Público, Polícia Federal e pela própria manifestação do povo brasileiro nas ruas? O DIÁRIO entrevistou Eduardo Jorge Costa Mielke, especialista em Políticas de Turismo para o Desenvolvimento Responsável de Gestão Turística. Doutor em Turismo, Eduardo semanalmente escreve sobre Políticas de Desenvolvimento Turístico, Gestão Turística Inteligente,  Desenvolvimento de Projetos Turísticos de Base Comunitária – Direto e ou Indireto entre outras abordagens. Abaixo, a entrevista concedida ao jornalista Paulo Atzingen, editor do DT.

DIÁRIO – Mielke, com a experiência que tem junto ao poder público municipal, qual a análise que o senhor faz do impacto (ou influência) que a lipoaspiração do Ministério Público, da Polícia Federal e do Supremo fizeram e estão fazendo no mau uso do dinheiro público?

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EDUARO MIELKE – Os impactos econômicos ainda demorarão um bom tempo para serem sentidos, pois são Macroeconômicos. Já os políticos-institucionais são diários. A batalha pelo poder no Planalto Central está em pleno curso e a testemunharemos até o pleito de 2018, no mínimo. E no meio disso tudo, o principal impacto é que o resultado da política Lula-Dilma, que centralizou em BSB o centro de tudo, faz com que qualquer neblina vinda de lá ofusque o horizonte da continuidade da articulação da União com os Estados e, consequentemente, com os Municípios. E boa parte dos investimentos que fomentam a economia como um todo, bem como as empresas do setor produtivo/serviços que dependem de um ambiente mais calmo sofrem.

DIÁRIO – O senhor acredita que pode ocorrer um efeito dominó junto aos poderes municipais e surgir novos líderes dispostos a pensar o turismo e a coisa pública de forma mais supra-partidária, extra-partidária, mais inteligente?

EDUARO MIELKE – Espero que sim. A Espanha está vivendo este processo. Mas para que isto aconteça aqui, discussões nesta direção já deveriam ser percebidas nas ruas e redes sociais. Aparentemente, as pessoas ainda estão debatendo dentro de uma abordagem e posicionamento entre “nós e eles”. E não algo como “porque não outros”? Advogo muito no “nem eles nem aqueles”, mas sim numa política pública do Estado Eficiente que atenda o cidadão de forma eficaz. Use a tecnologia disponível em prol das pessoas e que a gente sinta o mínimo de dignidade ao pagar nosso impostos. Neste âmbito, veremos se as campanhas para prefeito e vereança, que começarão agora no segundo semestre, abordarão estas questões como Plano de Governo. É importante ressaltar que a eficiência do Estado está sendo pauta de análise nos países desenvolvidos e espero que a Globalização, pelo menos neste aspecto, traga benefícios.

DIÁRIO – o presidente Interino, Michel Temer em seu primeiro pronunciamento falou em Pacto Federativo. Esse pacto tem a ver com uma melhor equidade na arrecadação. Sabemos que do total arrecadado de impostos em uma Cidade, 68% ficam com a União, 24% com os Estados e 18% para os municípios. Isso logicamente afeta o desenvolvimento do Turismo?

EDUARO MIELKE – Diretamente e de forma fulminante. O turismo acontece mesmo é no município. É lá que o impacto acontece, que o turista reclama, tem sua experiência, usa os serviços turísticos, que o emprego e renda são gerados e é onde que a maioria dos impostos são gerados. Não tem sentido mais esta divisão que nada ajuda e só atrapalha, sendo que o Fundo de Participação dos Estados e Municípios é paradoxalmente bem fundo e escuro, porém raso. A concentração dos recursos na União impede que processos de desenvolvimento através da inovação ocorram, ao mesmo tempo que instiga a disputa por recursos através de meios quase que partidários em detrimento ao técnico. A valorização dos municípios urge e o turismo só prospera neste país se o Pacto Federativo for revisto neste sentido. Se o PMDB terá força para debater o assunto e avançar, veremos. Não obstante, pelo menos alguém falou no assunto e sendo um Presidente, mesmo que Interino, é uma luz.

DIÁRIO – Por que a grande maioria dos secretários de turismo das cidades pouco peso têm no núcleo de poder das prefeituras?

EDUARO MIELKE – Porque a pasta que encabeçam detém, em média no Brasil, 0,6% do Orçamento Anual da Prefeitura. Com a estrutura municipal inchada e em constante pressão, ficam para o fim da fila em importância e prestígio.

DIÁRIO – Hoje os municípios e seus dirigentes sabem distinguir os limites e responsabilidades do poder público, da iniciativa privada e do terceiro setor?

EDUARO MIELKE – Muito poucos. Isto porque, são ínfimos aqueles que têm a sabedoria em saber fazer gestão participativa e cooperada do turismo. Ainda vivemos na era do Estado Provedor, sendo dele a responsabilidade do sucesso ou fracasso. Se por um lado, a vaidade do poder público é enorme, e portanto centralizadora, de outro, empresários e entidades dispõem de poucos meios institucionais para se envolver de fato. “Porque se engajar se nada decido?” Este é o pensamento daqueles que não são governo. E como resultado, faz com o que o poder público siga nutrindo um círculo vicioso da providência, executando ações que são essencialmente de mercado, o que é um erro crucial. Governo não vende, mas sim articula, fomenta e media.

DIÁRIO – Qual o peso que um Conselho Municipal de Turismo pode ter na definição da dotação orçamentária de um município?

EDUARO MIELKE – Total. O COMTUR forte atua tanto na formação de leis com a do próprio fundo, bem como na institucionalização do processo de formatação do Plano Plurianual (PPA), que faz parte do Orçamento Anual da Prefeitura. E vai além disso, passa ser o instrumento de articulação dentro do município possibilitando aproveitar e potencializar o “poder de fogo” de seus membros. Mas para isso, deve estar fundamentalmente estruturado, a partir de um Marco Legal com o tripé: Lei do COMTUR + Regimento Interno + Lei do FUMTUR. Só assim, o COMTUR poderá contribuir otimizando a cooperação tão vital ao desenvolvimento, construindo uma verdadeira engrenagem tripartite que sinalizará ao mercado que a palavra continuidade fará sentido e parte de um planejamento mais responsável.

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